"Muita coisa pode acontecer", diz advogado de Bolsonaro e ex-ministro do TSE

"Muita coisa pode acontecer", diz advogado de Bolsonaro e ex-ministro do TSE

Em Porto Alegre, Tarcisio Vieira falou sobre a inelegibilidade do ex-presidente, atuação do Judiciário e liberdade de expressão

Felipe Nabinger

Tarcisio Vieira de Carvalho Neto participou do Summit Eleições, na capital gaúcha

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“Muita coisa pode acontecer até o final do ano que vem", afirmou o  ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Tarcisio Vieira de Carvalho Neto, que atua como advogado de defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas ações que o tornaram inelegível por oito anos. Em Porto Alegre, para palestrar em um evento sobre indústria eleitoral, ele destacou que contra as decisões judiciais, "se recorre".  “A ideia de recorrer é de um lado não se conformar com uma decisão que, tecnicamente falando, nos parece injusta, e de outro viabilizar essa reversão", complementou. Em especial sobre o possível futuro político de Bolsonaro, disse que "existem algumas possibilidades que podem ser extraídas da própria legislação como candidaturas por liminar, ação rescisória".

Umas das ações diz respeito à reunião de Bolsonaro com um grupo de embaixadores, em 18 de julho de 2022, no Palácio da Alvorada, na qual o ex-presidente questionou, sem provas, a segurança das urnas eletrônicas. Tarcísio diz que mesmo as pessoas que confiam no sistema podem entender que existe espaço para debates públicos e aprimoramentos. “Particularmente sempre defendi, desde a época em que era ministro, que não via defeitos graves no sistema eletrônico de votação. Aliás, se tivesse visto, tinha o dever de agir. Isso não significa que esse sistema não possa ser aprimorado.”

Para o advogado, nenhum tema deveria ser “banido” do debate público e, discutido, aumentaria o espectro de pessoas que confiam no sistema. Ele celebra que a Justiça Eleitoral brasileira sempre tenha se beneficiado da tecnologia, sendo pioneira em informatização de cadastro de eleitores, urna eletrônica, biometria e combate às fake news, por exemplo.

Protagonismo dos tribunais

Quanto ao protagonismo assumido pelos tribunais, Tarcisio vê como um “fenômeno recente e irreversível”. “Ele não é focado na Justiça Eleitoral. Há outros órgãos republicanos angariando um protagonismo maior na cena política”, analisa, entendendo o movimento como natural.

Segundo ele, as Cortes que trabalham com controle da legalidade antes faziam exames mais superficiais, entrando hoje no mérito de despesas e condutas, por exemplo.

“Hoje, muito mais do que inibir esse protagonismo, seria importante limitar o controle de quem maneja um poder dessa natureza”, afirma. Para ele, o Congresso Nacional está atento a esses movimentos do Poder Judiciário, para fazer o contrapeso no momento devido.

Além de eventuais mudanças na lei, o ex-ministro entende haver uma acuidade maior nas sabatinas do Senado a membros de tribunais superiores, além de prever impeachment diante de comportamento de crime de responsabilidade. “Eram temas, em passado recente, apenas teóricos.”

Liberdade de expressão

Tarcisio defende o combate “à aplicação desmesurada de qualquer princípio, entre eles o da liberdade de expressão” no âmbito da Justiça Eleitoral. “Se examinamos alguns atritos nos tribunais, observamos a evocação do mesmo princípio dos litigantes. Tem gente sendo presa porque abusou da liberdade de expressão e usando na sua defesa o princípio da liberdade de expressão.” Há necessidade, em sua visão, de serem colocados limites às balizas administrativas.

O ex-ministro do TSE não enfatiza, no entanto, que questões relativas à liberdade de expressão não estão necessariamente ligadas ao que convencionou-se chamar de ativismo judiciário. “Se a nossa Constituição é, desde sua medula óssea, uma Constituição de status social, as cortes judiciais precisam concretizar esses direitos sociais previstos normativamente. Isso não é ser ativista. É ser juiz constitucional”.

Tutela excessiva

Quanto ao combate à desinformação, tema recorrente nas últimas eleições no país, Tarcísio entende ser prejudicial a “tutela excessiva da inteligência do eleitor”, vista por ele como inútil e invasiva. O ex-ministro vê o modelo de mediação da Justiça Eleitoral brasileira próximo do adotado na Europa, divergindo do modelo norte-americano com um conceito de “liberdade de expressão mais ampliada”.

O próprio regramento por meio de resoluções emitidas pelo TSE é um ponto que suscita debate na visão dele. “Pontualmente eu não me atreveria a apontar algum excesso, mas existem debates sobre isso. A própria postura de regulamentar o combate a fake news por resolução, independente do conteúdo, já é criticada por parte da doutrina, pois flertaria com uma censura.”

O ex-ministro encerrou a segunda etapa do Summit Eleições, ocorrida em Porto Alegre, na quinta e sexta-feira. O evento é promovido pelo Centro de Inovação Eleitoral, Político e Governamental (Ciel), com apoio da Rede Essent Jus, da Baila Politics e do Instituto Gaúcho de Direito Eleitoral (Igade), e, até maio do ano que vem, passará por diversas cidades brasileiras. 


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