Um ano depois: atos antidemocráticos em Brasília deixam impactos políticos

Um ano depois: atos antidemocráticos em Brasília deixam impactos políticos

Especialistas analisam consequências das invasões aos prédios dos Três Poderes no dia 8 de janeiro de 2023 para a democracia e a política nacional

Felipe Nabinger

Edifício sede do STF após os atos de vandalismo do dia 8 de janeiro de 2023

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Passado um ano dos atos antidemocráticos que atingiram Brasília, o tema ainda levanta polêmicas e guerra de narrativas entre os espectros da esquerda e da direita. Cientistas políticos não vêm mudanças práticas no sistema democrático, apontando o evento como um valor simbólico com efeitos no âmbito político.

Nesta segunda-feira, um evento ocorre no Congresso Nacional, reunindo o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e os presidentes dos demais Poderes, em um ato denominado “Democracia Inabalada”.

Alberto Carlos Almeida, especialista em pesquisas de opinião e marketing político, sociólogo e escritor, entende o dia 8 de janeiro como “um símbolo”, criticado pela esquerda e defendido por um setor extremado da direita, mas sem mudança prática para a democracia. Ele compara, neste aspecto, com a invasão do Capitólio, nos Estados Unidos.

“Vejo muito mais a democracia como resultado de instituições e comportamentos de atores a longo prazo. Aquilo foi um dia na história do país”, avalia Almeida.

Para a cientista social e política e diretora do Instituto Pesquisas de Opinião (IPO), Elis Radmann, também não houve mudança formal na democracia brasileira, mas os atos antidemocráticos do dia 8 de janeiro ampliaram “a indignação coletiva dos grupos radicalizados”, com a mesma base argumentativa em ambos os extremos, com foco no autoritarismo.

“A esquerda chama o movimento de ‘intentona bolsonarista’, e a direita reclama de perseguição política e politização da Justiça.”

Esvaziamento na oposição

Quanto ao aspecto da gestão política, o evento em Brasília trouxe um “esvaziamento em uma oposição mais radical”, no entendimento do professor do Programa de Pós-graduação (PPG) em Ciência Política da Ufrgs, Rodrigo Stumpf González.

“A reação imediata foi unir os Poderes e criar um apoio mútuo entre Congresso e Executivo. Ao mesmo tempo, as tentativas de setores ligados a Jair Bolsonaro de justificar as ocupações como mero excesso de uma manifestação democrática foram esvaziados pelo processamento rápido e condenações no STF (Supremo Tribunal Federal).”

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González vê o desmantelamento dos acampamentos em frente aos quartéis como parte de um ato golpista e o fracasso do PL, partido de Bolsonaro, em atrelar responsabilidade pelos atos no governo, como movimentos que ajudaram alas mais pragmáticas do Centrão a negociar com Lula, obtendo até mesmo cargos, como aqueles indicados por Arthur Lira (PP), presidente da Câmara.

Para o cientista político, o ato relembrando os ataques desta segunda-feira é uma oportunidade para Lula se apresentar como “pacificador”, utilizando resultados econômicos e a negociação com o Congresso para dizer que ele “nunca foi um risco para a democracia, mas seu defensor.

Impactos nas eleições

Os movimentos políticos do ano passado, provocados pelos atos do dia 8 de janeiro, somados à inelegibilidade do ex-presidente Bolsonaro por abuso de poder, são compreendidos por Elis Radmann como fatores que influenciaram no amadurecimento da “ampliação da autoconsciência das pessoas comuns sobre seus valores sociais e morais”, podendo causar impactos nas eleições municipais de 2024.

A cientista política aponta que a maior parte da população brasileira, especialmente no Rio Grande do Sul, se classifica como conservadora ou tradicional, tendendo a acirrar suas crenças e convicções em uma lógica de centro-direita.

“Significa dizer que todos os debates polêmicos que serão realizados pelo Supremo durante o ano de 2024, como legalização do aborto e legalização do porte de drogas para uso pessoal, causarão muito estresse na sociedade, podendo se refletir nas eleições municipais.”

Para o cientista político Rodrigo Stumpf González, o rumo dos processos que tramitam no Supremo Tribunal Federal sobre os participantes dos atos golpistas também podem provocar impactos na percepção do papel do Judiciário.

“A questão que perdura ainda é se serão punidos os peixes pequenos, usados como aríete contra as instituições, ou os idealizadores e possíveis beneficiários do caos também serão condenados. Com muito menos que isto o Supremo condenou José Dirceu (ministro da Casa Civil no primeiro governo Lula) como responsável pelo mensalão”, questiona o professor González.


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