Cigarrinha prolifera no clima seco

Cigarrinha prolifera no clima seco

Perdas causadas pela praga são de difícil mensuração e assemelham-se às geradas pela estiagem

Camila Pessôa

Infecções geradas pelo inseto aumentam desde 2019 no Rio Grande do Sul e ganham força com as sucessivas estiagens dos últimos três anos

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A cigarrinha do milho, praga que prejudica o desenvolvimento dos cultivos do grão ao transmitir doenças do complexo dos enfezamentos, atingiu durante 2022, em todo o país, 11,9 milhões de hectares da cultura. Isso equivale a 68% da área cultivada com milho safrinha e a mais que o dobro da área atingida em 2021, de 5,7 milhões de hectares, de acordo com levantamento divulgado pelo Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para a Defesa Vegetal (Sindiveg). Típica de áreas centrais e ao norte do país, a praga está presente em maior escala no Rio Grande Sul desde 2019 e tem sido favorecida pela estiagem, com um aumento populacional já observado este ano, em relação a 2022,
embora seja difícil quantificar as perdas causadas exclusivamente pela cigarrinha nesta safra, em função dos prejuízos decorrentes também da estiagem. “Pela nossa rede de monitoramento constatamos que em alguns locais estamos com maior pressão que no ano passado, visto a condição climática ser favorável a praga”, diz o entomologista da Rede Técnica Cooperativa (RTC) Glauber Renato Stürmer. 

Uma dessas regiões é a de Frederico Westphalen, em que a praga foi encontrada em todas as áreas abrangidas pelo escritório da Emater/RS-Ascar no local, informa o gerente regional, Luciano Schwerz. “Fica evidente que o complexo de patógenos está presente, é uma situação que pode concorrer com a produtividade piorando as situações de estiagem e é muito importante ressaltar aos produtores que adotem as medidas preconizadas de mitigação da cigarrinha”, diz o diretor do Departamento de Defesa Vegetal (DDV) da Secretaria da Agricultura. Pecuária, Desenvolvimento Sustentável e Irrigação (Seapi), Ricardo Felicetti. Entre as medidas estão conhecer a tolerância do híbrido a ser semeado; fazer um manejo com intervalos curtos, protegendo de estágios críticos da planta; e integração de controle de ferramentas químicas e biológicas. 

Felicetti explica que o problema é agravado quando há o plantio sucessivo do milho. “O ciclo da cigarrinha vai permanecendo durante a lavoura, e ela cresce mais ao longo do tempo, com o milho já em final de ciclo, só que o enfezamento em si, que é causado pela cigarrinha, ocorre já no início da infecção. Portanto, é muito importante o produtor adaptar medidas de rotação da área”, acrescenta. Segundo ele, muitos produtores são prejudicados por não detectarem a presença do enfezamento, uma vez que ele aparece em um estágio mais tardio de desenvolvimento do cultivo. “Aqui no Sul do país, do Paraná para baixo, geralmente, ela ocorre em situações de clima seco e acaba trazendo essas surpresas na produtividade e perdas aos produtores”, afirma. 

Luciano Schwerz explica que a estiagem favorece a cigarrinha porque durante o clima seco ela consegue fazer mais voos, o que facilita sua alimentação e proliferação. Além disso, sem acúmulo de água entre as folhas da planta, o inseto encontra abrigo mais facilmente, inclusive para proteger-se da ação de defensivos. Também não há inseticidas com efeito residual contra ela. “A cigarrinha que nascer daqui a dois ou três dias não vai encontrar produto fazendo efeito. Então, ela já nasce e começa a se alimentar, renovando esse ciclo. O grande ponto que temos que ter atenção é à frequência das aplicações de inseticida”, indica.

O técnico da Emater lembra que a cigarrinha é uma praga que tem uma dinâmica populacional diferente daquela que é o comum no Estado. “Outros insetos, após a aplicação de inseticida, demoram em torno de 20 dias para ter uma nova onda, mas com cigarrinha é mais rápido. Então, por isso, muitos produtores e empresas acabam adotando a calendarização das aplicações”, completa Schwerz, destacando que, em alguns casos, os produtores precisam fazer até seis aplicações de inseticida, mesmo sem garantia de eficiência. 

Potencial destruidor

Ciclo de reprodução da cigarrinha é rápido, o que dificulta o manejo. Foto: Charles Oliveira / Embrapa / Divulgação / CP

A cigarrinha do milho mede entre 3,5 centímetros e 4,7 centímetros. Com facilidade em se multiplicar em zonas quentes, a praga infestou, apenas no ano passado, uma área de quase 12 milhões de hectares no Brasil, 68% a mais que em 2021.

O inseto é vetor das doenças conhecidas como enfezamento pálido e enfezamento vermelho, que podem causar perdas acentuadas na produtividade do milho, a ponto, inclusive, de destruir lavouras. Sua presença é identificada por folhas esbranquiçadas em toda a sua extensão, pela redução na altura das plantas, por folhas avermelhadas e através do crescimento de espigas improdutivas. Muitas vezes, nem a combinação de inseticidas é eficiente para exterminá-lo.


Correio do Povo
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