Preços baixos da lã desafiam ovinocultores

Preços baixos da lã desafiam ovinocultores

Programa de certificação é aposta para reverter cenário desfavorável frente às exigências de qualidade dos importadores

Patrícia Feiten

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Com atraso devido ao excesso de chuvas, a temporada de esquila começa a mobilizar os criadores de ovinos no Rio Grande do Sul marcada pela preocupação com a baixa demanda pela lã e a queda de preços do produto, exportado na forma bruta principalmente para o Uruguai. Na tentativa de reverter o cenário desfavorável, a Associação Brasileira de Criadores de Ovinos (Arco) busca ampliar a adesão dos ovinocultores ao seu programa de certificação da lã, que dissemina práticas para melhorar a qualidade da matéria-prima, e consequentemente, aumentar suas chances de aprovação pelos clientes do país vizinho.

Focado em ovinos das raças laneiras Corriedale, Ideal e Merino Australiano, o programa teve início em 2019 e, na primeira safra, resultou na produção de 18 mil quilos de lã certificada, segundo a vice-presidente da Arco e coordenadora da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva da Ovinocultura, Elisabeth Lemos. Para o ciclo atual, ela projeta uma colheita superior a 300 mil quilos. O resultado, porém, é tímido se considerado o tamanho do rebanho ovino gaúcho, que soma 3,3 milhões de animais. “A gente estima que 60% sejam de raças laneiras, (o que equivale a) uma produção de 9 milhões de quilos de lã. Nós termos só 300 mil quilos certificados é muito pouco”, avalia Elisabeth.

Uma das normas difundidas pelo programa é o uso da técnica tally-hi, na qual a tosquia é realizada sem a necessidade de amarrar o animal, diferentemente da esquila tradicional, feita com tesoura. Além de facilitar a retirada de marcas de tinta e outros contaminantes do velo, o método evita desconforto às ovelhas. “Isso contribui para a visão de bem-estar animal e atrai compradores, principalmente os europeus. Uma das barreiras é que ainda são muito poucas as comparsas de esquila habilitadas para isso (no Estado)”, explica Elisabeth, destacando que o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar-RS) vem promovendo cursos de capacitação para certificar esquiladores na técnica.

Segundo Elisabeth, a inserção no programa possibilita aos criadores a obtenção de preços melhores na exportação da lã. No caso das lãs finas, as mais valorizadas pelos importadores, o quilo do produto de Merino Australiano é estimado hoje em torno de R$ 8. “No ano passado, o criador que fez a certificação e exportou para o Uruguai recebeu R$ 40. O mercado se tornou tão exigente que as pessoas que não se adaptarem vão ter muitas dificuldades para vender sua lã”, enfatiza a vice-presidente da Arco.

O presidente da Cooperativa de Lãs Mauá, de Jaguarão, Edison Lunes Ferreira, diz que os criadores enfrentam dificuldades de comercialização desde o início da pandemia de Covid-19. Ele observa que a maior parte da lã gaúcha exportada ao Uruguai era destinada à China e a países europeus. “A última safra ‘cheia’ que tivemos foi a de 2018-2019. Com a pandemia, o mercado chinês parou de adquirir lãs. Depois, veio a crise energética na Itália e na Alemanha. O mercado está completamente parado”, afirma Ferreira.

Antes da crise sanitária, segundo o ovinocultor, os valores do quilo da lã de Corriedale ficavam entre R$ 7 e R$ 10. Hoje, muitos criadores conseguem no máximo R$ 1 pelo quilo. “Em função da desvalorização, houve municípios onde a lã foi colocada no lixo”, afirma Ferreira. Uma das esperanças do setor é a inauguração da Tecno Lã Sul no município de Sant’Anna do Livramento. Especializada no beneficiamento de lã, a empresa ocupará uma unidade desativada do antigo frigorífico Swift Armour e deve começar a funcionar em 2024, de acordo com a Arco. “Ela vai prestar (o serviço de lavagem) para as barracas w cooperativas, e isso vai permitir que a gente comece a reconquistar o mercado interno”, diz Ferreira.


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