Preços da carne bovina mostram trégua

Preços da carne bovina mostram trégua

Maior oferta, diminuição sazonal de consumo e endividamento das famílias se refletem em recuo do IPCA; picanha foi o corte que mais caiu

Patrícia Feiten

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Na contramão da inflação geral medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que acelerou 0,84% em fevereiro, os preços das carnes vermelhas caíram 1,22% em fevereiro no Brasil. Foi a maior queda registrada nesses produtos desde novembro de 2021, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Na avaliação de economistas, o recuo pode ser explicado pelo aumento da oferta no mercado interno, por questões sazonais e pelo alto grau de endividamento das famílias.

Entre os cortes bovinos que ficaram mais baratos em fevereiro, a picanha foi o que teve a maior redução de preço, de 2,63%, seguida por fígado (-2,5%), alcatra (-2,5%), capa de filé (-2,37%) e costela (-2,28%). No caso do filé-mignon, a redução foi de 1,77%. “Basicamente, estamos convivendo com um ano de maior disponibilidade de proteína animal para o consumidor brasileiro”, resume o economista Fernando Iglesias, da consultoria Safras & Mercado. Ele explica que os abates de bovinos aumentaram em torno de 10% no país em janeiro, na comparação com o mesmo mês de 2022. No período, houve um maior alojamento de pintos de corte, o que ampliou a oferta de carne de frango e ajudou a derrubar o preço de outras carnes. “Por enquanto, o viés que temos em 2023 são preços mais acessíveis. Tem muita fêmea sendo abatida na Região Norte, e o alojamento de pintos de corte continua elevado”, diz Iglesias.

O economista-chefe da Federação da Agricultura do Estado (Farsul), Antônio da Luz, observa que os preços das carnes bovinas já estavam em desaceleração, após a forte alta verificada na pandemia. “Em 2021, enquanto o preço do boi caía, o preço para o consumidor subia. O que acontece (agora) é que o consumidor está apertado, e pessoas acossadas por inflação e endividamento diminuem seu ritmo de consumo de tudo”, diz Da Luz. De acordo com a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), 77,9% das famílias brasileiras declararam ter dívidas em 2022, um recorde na pesquisa.

Segundo Da Luz, a queda dos preços da proteína bovina também reflete a diminuição sazonal de consumo que ocorre nos primeiros meses do ano, após o pico associado às festas de Natal e Ano-Novo. A retração do consumidor, explica o economista, coincide com o pagamento de despesas típicas de início de ano, como IPTU e IPVA. Outro fator que pesou no recuo da carne foi a trégua nos custos de produção, puxada pela queda dos preços de fertilizantes e agroquímicos.

Motivada pela confirmação de um caso de mal da vaca louca no Pará, a suspensão das exportações de carne bovina para a China não teve efeito nos preços na ponta final de consumo até o momento, segundo ambos os economistas. Os embarques para o país asiático estão paralisados desde 23 de fevereiro, e a expectativa é que sejam retomados até o final deste mês, afirma Iglesias. “Os frigoríficos exportadores estão aumentando a ociosidade e mantendo o estoque alto, ainda não ofertaram esse excesso de produção no mercado doméstico. Se a China prolongar o embargo, aí teremos consequências mais graves”, avalia.


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