Aberta a quinta edição do Festival Literário Rastros do Verão

Aberta a quinta edição do Festival Literário Rastros do Verão

A primeira mesa do evento literário que segue até 23 de março foi sobre a obra de João Gilberto Noll com Daniel Galera e Regina Zilberman, mediados por Luciano Alabarse

Luiz Gonzaga Lopes

Nanni Rios, Fernando Ramos, Luciano Alabarse, Daniel Galera e Regina Zilberman na abertura oficial do Rastros do Verão diante de uma livraria Baleia lotada

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Na tarde deste sábado, 24 de fevereiro, cerca de 70 pessoas presenciaram a abertura oficial da quinta edição do Festival Literário Rastros do Verão, que segue até dia 23 de março em sete livrarias e na Casa de Cultura Mario Quintana. A abertura foi realizada na livraria Baleia, localizada na rua dos Andradas, 351, no Centro Histórico de Porto Alegre. Evento idealizado para homenagear a memória e o legado literário de João Gilberto Noll e difundir a produção literária local mais recente, o festival terá a presença de cerca de 70 autores e autoras. A primeira mesa reuniu o escritor Daniel Galera, a professora, ensaísta e pesquisadora Regina Zilberman e o diretor de teatro Luciano Alabarse, comentando a convivência e aspectos da obra de Noll. Logo depois, os 50 anos de existência da L&PM foram celebrados com a presença dos editores Ivan Pinheiro Machado e Paulo de Almeida Lima, falando da trajetória da editora com as escritoras Cláudia Tajes e Paula Taitelbaum e o tradutor Sérgio Karam.

A primeira mesa foi bastante afetiva e descrevendo a dualidade da pessoa e da obra de Noll, com a presença do irmão do autor falecido em março de 2017, Luiz Noll. Luciano Alabarse abriu os trabalhos falando do primeiro encontro com Noll que foi no lançamento de “A Fúria do Corpo”, em Porto Alegre, no Bar do Instituto dos Arquitetos do Brasil, na Praça Dom Feliciano. “Eu fui um dos primeiros a chegar, participei dos autógrafos, o João falando e fiquei hipnotizado, as pessoas foram saindo e a gente continuou conversando, quando fomos nos dar conta do horário já era seis da manhã”, lembra Luciano.

Regina Zilberman também contou como conheceu João Gilberto Noll que foi no vestibular para Letras na Ufrgs em 1966. “Fizemos o vestibular no mesmo ano e tínhamos amigos em comum. Eu e minhas colegas vínhamos de colégios israelitas e ele já era um intelectual que sabia sobre todos os assuntos, os grandes filmes do cinema, as peças de teatro, além dos livros lidos”, contou Regina, que logo depois fez um análise técnica das obras de Noll. “Ele tem duas características que acho muito importantes. Uma é a explosão da libido, as personagens não tem nenhum tipo de superego. Em segundo lugar, são personagem que estão sempre em trânsito, a ideia do andarilho, que é vista em ‘Hotel Atlântico’, por exemplo. Não tem época, não tem cenário nos textos dele, ele vai secando a narrativa. A única coisa que avança é a trajetória da personagem. Isto dá uma vitalidade muito grande, não tem compromisso com uma pauta, uma questão ou militância. A característica dos personagens são errantes, de um termo que está muito na moda, a desterritorialização. Outra característica é o enxugar da narrativa, que vai embora, e a gente tem que correr atrás. É interessante outra característica é que ele narra como se as coisas estivessem acontecendo, no cinema ou no teatro isto é possível, mas na literatura é difícil, o predomínio geral é a narrativa já passada e contada”, ressaltou Regina.

Daniel Galera fez uso da palavra para dizer que o primeiro contato com ‘A Fúria do Corpo’ e ‘Rastros do Verão’. Em Rastros, Galera aponta que há um florescer enquanto é narrada a história. “Não há um desígnio na história, as coisas tendo razão de ser na história, como a gente aprende nas oficinas literárias e livros de teoria. Não existe causalidade em ‘Rastros do Verão’. As coisas não acontecem, tudo está ausente, isto é muito radical e difícil de fazer. Agora eu entendo melhor do que na primeira leitura naquela época, nos anos 1980”, lembra o autor de “Barba Ensopada de Sangue”, que lembrou da generosidade de Noll, que foi a um lançamento de duas obras de contos dele e de Daniel Pellizari, pela Livros do Mal, em outubro de 2001. “A gente havia enviado os livros pelo Correio para algumas pessoas e ele estava lá na fila, eu cochichei para o Pellizari, cara, é ele na fila, nós bem nervosos. Ele foi lá, pegou os autógrafos e aquilo deu mais confiança para aqueles dois autores. Eu tinha 21 anos e depois nos encontramos outras vezes, aí em diversas situações, a mais comum era em sessões de cinemas em horários alternativos, com pouca gente, no meio da tarde. Isto dava uma sensação de semelhança, que existem pessoas que gostam de ver filmes em horários e sessões com pouca gente”, relatou Daniel sobre alguns outros encontros com ele, inclusive sobre o não encontro em uma padaria do Bom Fim, alguns dias antes da morte de Noll, em 2017, quando Galera passeava com o cachorro e não foi ao encontro do escritor no interior do estabelecimento.

Luciano Alabarse fez ainda algumas provocações e indagações que tiveram a concordância de Regina e Galera sobre a lapidação dos textos de Noll. “Minha sensação era de que em cada livro dele havia o essencial, indo na contramão de outros autores maravilhosos. Era a palavra mínima, deixava pouco ar entre as palavras, uma radicalidade que fazia a gente não desgrudar do livro”, pontuou Luciano. O organizador do festival, Fernando Ramos, falou depois de concluída a primeira mesa, bem como uma das proprietárias da Baleia, Nanni Rios. “Esta abertura está bem no clima do Rastros do Verão, escrito sobre uma terça-feira de Carnaval muito quente nas ruas do Centro de Porto Alegre. E o fato de estar lotado aqui é sintomático que o público reverencia e quer se aprofundar mais na obra do Noll”, disse Fernando, finalizando sobre a importância da longevidade de projetos e carreiras, com os 50 anos da livraria e editora L&PM, os 50 anos de carreira de Luciano Alabarse, os 10 anos da Baleia e tantos outros projetos que resistem à dureza de se fazer cultura na capital gaúcha.

Em dois outros momentos o festival irá oferecer atividades dedicadas à literatura de João Gilberto Noll, incluindo uma oficina de escrita com o escritor Marcelino Freire nos dias 21 e 22 de março na Casa de Cultura Mario Quintana. Marcelino participará também de um bate-papo com Valéria Martins, agente literária de Noll, no dia 23 de março. Outra atividade formativa que também ocorrerá na Casa de Cultura, nos dias 26 e 27 de março, é a oficina “Traçando biografias: jornalismo, literatura e ficção”, com o jornalista, editor e escritor Flávio Ilha . As oficinas são gratuitas e a inscrição será feita em março pelo instagram @ccmarioquintana.



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