Devassa na economia criativa

Devassa na economia criativa

Estudo do Itaú Cultural mostra o estrago no setor provocado pela pandemia desenfreada

AE

Diretor do Itaú Cultural Eduardo Saron fala sobre a queda nos números da indústria criativa

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O universo da economia criativa perdeu 691,1 mil postos de trabalho no primeiro semestre de 2020, comparado com o mesmo período do ano anterior. Os trabalhadores da chamada economia criativa são aqueles que atuam em negócios baseados no capital intelectual e cultural e que gera valor econômico a partir da criatividade. Ou seja, onde economia e cultura se encontram. Ou onde a cultura deixa de ser entretenimento e se torna saída social. Um mapeamento da indústria criativa no Brasil, publicado em 2016 pela Firjan, uma organização privada com mais de 7.500 empresas associadas, mostrou que a área gerou uma riqueza no valor de R$ 155,6 bilhões para a economia brasileira em 2015.

 

Agora, um estudo do Itaú Cultural mostra o estrago no setor provocado pela pandemia desenfreada. Segundo estudo divulgado ontem, o meio da economia criativa sofreu um golpe de 9,94%, fazendo com que as 6.958.484 pessoas que ganhavam a vida no setor em junho de 2019 se tornassem 6.266.560 um ano depois. O Painel de Dados do Observatório Itaú Cultural, que monitora a evolução econômica da indústria criativa no Brasil mostra que o impacto maior foi entre os trabalhadores mais ligados a atividades culturais. Neste caso, a queda foi de 49%, caindo de 659,9 mil trabalhadores em junho de 2019 para 333,7 mil. Por ramos, os números ficam assim: atividades artesanais caíram 49,66% (132,8 mil postos de trabalho a menos). No cinema, música, fotografia, rádio e TV, são 43.845 menos postos de trabalho. O setor editorial caiu 76,85%, com 7.994 menos vagas, e as artes cênicas e artes visuais diminuíram em 43% (com menos 97.823 postos de trabalho). O diretor do Itaú Cultural, Eduardo Saron, falou para a Agência Estado sobre a devassa que a pandemia provocou nas artes.

 

AE - Qual leitura faz dessa queda dos números na economia criativa durante a quarentena?

Eduardo Saron - O impacto da pandemia foi bastante relevante para a economia criativa. Como os números mostraram, se olharmos junho do ano passado e junho deste ano, perdemos 691 mil empregos neste intervalo. Se fizermos o comparativo com dezembro de 2019, a queda foi ainda maior, uma vez que, no segundo semestre do ano passado, a economia tinha se aquecido um pouco e gerado mais postos no setor. Frente a dezembro a perda chegou à marca de 871 mil postos de trabalho. A economia criativa foi uma das primeiras a parar e será uma das últimas cadeias de produção a voltar completamente, dada a necessidade de suspensão social durante a pandemia. Cinemas, teatros, casas de espetáculos, centros culturais, tudo fechou no primeiro semestre. Toda uma longa cadeia de profissionais se viu sem trabalho de uma hora para outra. Todo o pessoal de back stage e de produção foi afetado. O desemprego atingiu toda a economia e a economia criativa não ficou imune.

 

AE - Como essa recuperação pode se dar? 

Eduardo Saron - A recuperação virá na esteira de uma série de questões. Precisamos superar a pandemia, por meio da ciência e da medicina. A economia precisa voltar à sua plenitude e o país precisa voltar a crescer. Com emprego e renda, a economia criativa voltará a crescer, na esteira da demanda. E, em outro campo, governos, empresas e sociedade precisam compreender que o ecossistema da economia criativa é fundamental para o desenvolvimento do país e precisa ser bem cuidado. O setor gera emprego, renda e bem estar social. Precisamos utilizar cada vez mais dados e informações para evidenciar este papel estruturante da cultura. Só assim conseguiremos colocar o setor no campo estratégico da economia brasileira. Além disso, depois deste triste e duro momento, os produtores de cultura terão que se reinventar. Muitos hábitos consolidados na pandemia ficarão incorporados. As atividades virtuais terão um espaço no novo cenário pós pandemia, por exemplo. A indústria cultural, que é uma parte relevante da economia criativa, terá que se adequar para garantir aderência aos novos tempos.

 

AE - Falando sobre músicos, as lives e outras atividades online puderam ser monetizadas? 

Eduardo Saron - Já há plataformas que estão monetizando apresentações online. Mas tudo isso ainda é muito embrionário. A receita deste mundo virtual na cultura ainda é pequena. O virtual não será relevante se ficarmos apenas tentando substituir a experiência presencial. Ele precisa ser compreendido sob a ótica da cultura computacional para se tornar um produto de fato, com inovação, qualidade e experiências e entregas próprias. Quando isso acontecer, a monetização começará a ganhar relevância. Abriu-se uma janela de oportunidade. Precisamos superar a pandemia e aprender com a nova realidade. Um dos maiores efeitos colaterais da pandemia serão as doenças relacionadas à saúde mental, por exemplo. Certamente a arte e a cultura terão muito a fazer e dizer sobre esse desafio.


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