Artigos

Recuperação judicial no campo: como a lei pode ser a salvação em tempos de crise

Por Laura Giuliani Schmitt e Augusto Batista Zimmermann, Advogada/Acadêmico de direito

No campo, decisões apressadas custam caro: renegociar dívidas sem estratégia pode resultar em transtornos capazes de inviabilizar as próximas safras. Em um cenário de crises recorrentes, custos altos e condições cada vez mais duras impostas por credores, qualquer passo em falso compromete não apenas o presente, mas também toda a capacidade de reação estratégica do produtor no futuro.

Se empreender no Brasil já é um desafio complexo, a atividade rural enfrenta o chamado “duplo risco”: além dos desafios econômicos, há fatores imprevisíveis como clima e pragas. No Rio Grande do Sul, entre 2020 e 2024, perdas superiores a 40 milhões de toneladas de grãos geraram prejuízos acima de R$ 100 bilhões. Somam-se a isso tensões internacionais, como o recente anúncio dos Estados Unidos de aumento de tarifas para produtos brasileiros, como carne bovina, frutas frescas e café, que afetam diretamente os exportadores.

Diante dessa instabilidade, a recuperação judicial se apresenta como uma das principais ferramentas legais para preservar as atividades. Porém, nem todas as dívidas entram no processo — como operações com Cédula de Produto Rural (CPR) física ou créditos concedidos por cooperativas, que continuam cobrando normalmente, mesmo com o produtor em recuperação.

A limitação passou a ser ainda mais expressiva, considerando-se a decisão do Superior Tribunal de Justiça em que se definiu que a concessão de crédito por cooperativas de crédito é ato cooperativo, não operação bancária. Esse fato justifica a não sujeição da dívida ao processo de recuperação judicial.

O ponto crucial é que muitas dessas cooperativas são as principais financiadoras da atividade rural, fazendo com que sua exclusão comprometa gravemente a viabilidade de reestruturação. O produtor acaba forçado a quitar obrigações substanciais fora do plano aprovado, sobrecarregando seu fluxo de caixa e afetando a capacidade de adimplemento.

Por isso, antes de recorrer à lei, é essencial avaliar o tipo de endividamento, a composição do passivo e as garantias dadas. A recuperação judicial é um instrumento técnico, com limitações, mas que pode ser altamente eficaz se usada com planejamento, informação e assessoria qualificada. Conhecer e aplicar a estratégia certa pode ser a diferença entre perder a produção ou garantir a próxima colheita.

Mais Lidas