Os cavalos são felizes porque comem a paisagem

Os cavalos são felizes porque comem a paisagem

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Os cavalos são felizes porque comem a paisagem, disse num de seus versos magistrais dom Atahualpa Yupanqui, que era poeta e criador de Crioulos. Trata-se de uma metáfora esplêndida porque quem se alimenta do que vê bebe o veneno de sua Pátria, fica impregnado dela e por ela se empanturra de saudade. Eu também fui feliz naquele tempo em que comia a paisagem esverdeada do Pampa, deitado debaixo das pitangueiras lá na minha Vila Rica. Olhava as nuvens desenharem no céu bois, matagais, leões e quase sempre bichos que não conhecia porque era apenas um guri. Mastiguei dias de infância, desejos e sonhos e que hoje são apenas uma fotografia na parede deste apartamento longe das caturritas, longe dos quero-queros, longe dos sabiás e das sangas e dos lajeados. Longe. Tudo está muito longe. Longe da cavalhada...

Como editor de Geral do Correio do Povo já me deparei com reportagens de todo tipo, algumas tristes, outras curiosas, muitas interessantes. Mas confesso que a matéria sobre a ONG "Chicote Nunca Mais" que publicamos dias atrás me emocionou, embora seja um jornalista com muitos anos na profissão. A colega Karina Reif visitou a entidade que acolhe cavalos vítimas de maus tratos, ouviu os administradores e mostrou a dificuldade que a ONG atravessa com a falta de recursos, com a crescente queda das doações em função da crise econômica. Localizada na região Metropolitana de Porto Alegre, a ONG é administrada por Fair Soares, Fernando Pereira e pelo veterinário Francisco Gusso.

Eu que me criei no lombo do cavalo lembrei imediatamente do meu Tostado, companheiro inseparável da infância. Recordei da maneira como o potrinho foi parar lá em casa. O pai o comprou para livrá-lo dos castigos que recebia do seu dono. A égua mãe do Tostado era carroceira e a cria tinha que acompanhá-la sempre no serviço, ao lado da carroça. Então terminamos de criá-lo com todo amor. Depois, ele retribuiu com seu trabalho e suor. Foi com o Tostado que aprendi a reconhecer o valor da amizade entre um cavalo e um homem. Por isso fiquei tão revoltado ao constatar as maldades que as pessoas conseguem impingir a um companheiro com este. Usam, os fazem sofrer por anos a fio e depois os abandonam para que morram ao relento.

Recordo de todos os cavalos que montei. Em cima de seus lombos me senti um Bento, um general Osório e até um Capitão Rodrigo. Nós, que nascemos neste Meridiano, pouco somos sem um cavalo. Está na história, está nos livros e está no DNA e no sangue. Então peço que todos ajudem essas instituições que cuidam da cavalhada do Rio Grande. Os cavalos são animais sensíveis e não podem ser maltratados. Com suas patas, ajudaram a desenhar o mapa do Rio Grande.

Vamos nos engajar, porque como disse don Atahualpa Yupanqui, "no tengo cuentas com Dios, mis cuentas son con los hombres..."

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