Um causo de "alongá" madrugada

Um causo de "alongá" madrugada

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E lá vem mais outro causo

Desses de "alongá" madrugada

Porque essas campereadas

Têm fantasia e floreio

Como um touro no rodeio

Que escarceia o momento

Se imaginação é talento

Um contista tem que lutar

Então passo a apresentar

Este estranho casamento...

 

 

O noivo

No bolicho da Vila Rica os sábados eram especiais. Noite longas, tragos largos e  plateia grande. Paraíso para um bom contador de causo. O Turíbio, numa noite fria de fim de maio, contou este:

"No tempo antigo, quem mandava no Pampa eram os barões e coronéis.  Um deles, o barão Silvério de  San Martin, tinha muita terra e mais gado do que as estrelas do céu. O casarão onde morava parecia um castelo. Contudo, vivia triste,  pois perdera o filho na guerra e agora restara-lhe apenas a bela e jovem filha. A moça era cuidada por uma tia solteirona e o barão, precavido, acertou com um amigo da Fronteira, que tinha um filho da mesma idade, o casório dos jovens. Era um arranjo, porque assim aumentariam suas posses. Além disso, diziam que o moço era garboso  e destemido. Assim foi feito. Num setembro claro e festivo, a casa dos San Martin estava ornada e preparada para receber o noivo. O barão alegre e a noiva ansiosa, pois já havia visto uma fotografia do jovem galante. Porém, as horas passavam e o noivo se atrasava.

Ocorre que na estrada o noivo encontrara um amigo de infância, fazendeiro vizinho. O noivo contou o que vinha fazer e foi muito felicitado. Então, ao cruzarem um passo de rio, foram atacados pelos ladrões que infestavam os campos. Valentes, pelearam por duas horas com os bandidos,  que acabaram fugindo, porém o noivo caiu mortamente ferido. Antes de morrer implorou ao amigo que fosse à fazenda do barão e explicasse tudo. O amigo escondeu o corpo no mato e assim procedeu. Na estância,  já anoitecendo, todos achavam que o noivo tinha desistido, quando ouviram o tropel de um cavalo ao longe. Deram vivas ao jovem garboso que apeou e foi recebido efusivamente pelo barão. Jantaram do bom e do melhor, mas o noivo ao lado da moça estava pálido e triste. Pela meia-noite avisou a todos que precisava partir. Já montado, confidenciou ao barão que não verdade era um fantasma, que seu corpo estava para ser enterrado no outro dia, e partiu à disparada no seu lindo corcel de pelo cor da noite.

A moça, que ficara encantada, começou a enxergá-lo à noite, entre as ramagens.  Um dia, a moça desapareceu. Todos entenderam que o espectro a havia raptado para levá-la para o túmulo, como rezavam as lendas antigas. Dez dias depois, no entanto, o barão que estava de cama e prestes a morrer, ouviu um alarido e olhou pela janela. Viu a filha e o "fantasma".  O rapaz explicou que ao ver moça tão formosa não teve coragem de contar o sucedido. Depois começou, às escondidas, a namorar a moça e, por fim, decidiu levá-la embora e se casarem-se longe do barão.  O pai, vendo a felicidade da filha, abençoou a união e decretou festa por três dias. Dizem que o espírito do antigo noivo não ficou zangado, ao contrário, seguiu protegendo o casal para sempre..."

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