Diálogos como base de atuação

Diálogos como base de atuação

Por Paulo Tavares

Paulo Tavares

publicidade

A presidente do Tribunal de Justiça do RS, desembargadora Iris Helena Medeiros Nogueira, assume o cargo máximo do Judiciário gaúcho planejando diversas ações. Defensora do diálogo, a magistrada afirma que a sua gestão será voltada a reativar programas do Tribunal de Justiça que ficaram parados devido à Covid-19 e facilitar ao cidadão o acesso digital a determinados serviços do TJ, seja por meio do celular ou do computador, fazendo com que a instituição fique 100% virtual. Na continuação da entrevista no site do Correio do Povo, ela fala da colaboração para a recuperação fiscal do Rio Grande do Sul.

Não é a primeira vez que a senhora é presidente de uma entidade, mas no Tribunal de Justiça é a primeira mulher a comandar a instituição. Qual é a sensação?

Fui corregedora geral da Justiça no biênio 2016/2018 e sempre tive participação ativa na administração do Tribunal, além, evidentemente, de todas as atividades ligadas que dizem respeito à prestação do serviço jurisdicional. Eu registro a minha satisfação, felicidade, um coroamento de uma carreira ao assumir a presidência do Tribunal. Uma instituição como a nossa, de grande porte, muita movimentação processual, muitos magistrados, servidores, colaboradores, enfim, muitas demandas assolam nosso dia a dia, o que nos faz crescer em experiência e cada vez mais termos a preocupação da qualificação e, muito mais do que isso, ter presente a necessidade de prestarmos uma jurisdição célere e eficaz, atendendo aos anseios da nossa comunidade.

A senhora considera sua eleição um indicativo de que o judiciário gaúcho está acabando com o preconceito de gênero ou pelo menos o minimizando?

Esse preconceito de gênero que é atribuído ao Tribunal de Justiça talvez se refira a uma certa resistência que se fez presente antes de ingressar a primeira mulher no nosso Tribunal. A parti daí, ela abriu portas para as demais mulheres. Sinceramente, estou no Judiciário há cerca de 36 anos e desconheço situações que evidenciem qualquer discriminação de gênero. Tenho que nós, mulheres, assim como os homens, galgaremos a seu tempo, por competência, preparo, dedicação, pelo reconhecimento dos demais colegas e pelo trabalho prestado, aos patamares que ambicionarmos. Então, gosto muito de dizer que aqui cheguei, evidentemente, não por ser mulher, mas por ser uma profissional que tem experiência, que se qualificou, que recebeu a aprovação, o voto de confiança de seus pares.

A atual chefe de Polícia, delegada Nadine Anflor, conta que quando começou, muitos homens que iam na Delegacia de Polícia estranhavam a presença de uma delegada. A senhora chegou a perceber alguma demonstração machista em algum momento de sua carreira?

Sinceramente, não. Em todas as comarcas em que cheguei, eu já tinha sido antecedida por alguma outra magistrada. Creio que isso colaborou, porque a comunidade já estava habituada em ter alguém do sexo feminino jurisdicionado, à frente do Poder Judiciário daquela comarca. Razão pela qual em nenhum momento me senti discriminada.

Como foi o início de sua carreira? Onde começou?

Minha carreira começou quando ingressei como pretora na comarca de Santa Cruz do Sul, em 1985. No ano seguinte, fui aprovada no concurso público de provas e títulos para ingresso na magistratura. Fui juíza substituta em Santa Rosa, fiz a primeira entrância em Campina das Missões, a segunda em Espumoso e, depois, já aglutinadas as entrâncias, fiz a entrância intermediária na Comarca de São Jerônimo. Em seguida fui promovida à Comarca de Porto Alegre, onde atuei como juíza substituta em algumas unidades, cíveis e criminais, depois fui convidada a integrar o quadro de juízes corregedores, na Corregedoria-Geral da Justiça, onde fiquei de 1994 a 1998. Retornando à jurisdição na comarca de Porto Alegre, jurisdicionei por seis anos a Vara do Júri, a 2ª Vara do Júri (2º Juizado) e depois, em 2004, fui promovida para o TJ, onde estou até hoje, afastada da jurisdição para exercer a presidência do Tribunal. É essa, resumidamente, a minha carreira, minha peregrinação pelo interior do Estado, renovando o que sempre me trouxe muita felicidade, satisfação, realização, profissional e pessoal.

A senhora afirmou que o a sua administração estará votada ao diálogo. Como implantar esta ideia?

Bem, o diálogo é básico, fundamental para as relações humanas de qualquer natureza, a começar pela família, vizinhos, conhecidos e desconhecidos. E, eu tenho que uma boa conversa substituí cerca de mil ofícios. A conversa aproxima, facilita o entendimento dos interlocutores, razão pela qual uma conversa respeitosa é sempre por demais produtiva. Nós buscaremos intensificar todas as ações que já temos implementadas para a aproximação do cidadão. Nós, durante a pandemia, como o restante do mundo, tivemos evidentemente períodos de recolhimento, de home office, de não poder sair às ruas, e uma série de ações que tínhamos programada não pode ser levada a efeito. Temos, por exemplo, o Justiça na Praça, que é um projeto que fizemos em 2017 na Corregedoria-Geral de Justiça, envolvendo todas as demais justiças, Trabalho, Eleitoral, Federal, a Justiça Militar também esteve conosco, no qual atuamos em um local externo, com a iniciativa previamente agendada e divulgada. Nós tivemos o lançamento, naquela época, de uma série de projetos, incentivando a adoção, em especial de crianças com mais de 7 anos, de grupos de irmãos, de crianças com necessidades especiais. Quanto à violência contra a mulher nós fizemos uma série de ações nesse sentido. Assim, aguardamos o período pós-pandêmico para incentivarmos e termos essa ação de efetiva e real com a nossa população.

A senhora tem o projeto de implantação digital 100%. Não lhe causa temor o fato de hackers já terem invadido o sistema do TJ?

Não, temor não causa, embora nós saibamos que isso pode acontecer e, infelizmente, tem acontecido. No período de pandemia, assustadoramente, o percentual dessas invasões hackers aumentou. Mas, nada dos nossos dados foi perdido, nenhum cidadão restou prejudicado. Foi um ataque grave, covarde, que atingiu a rede de computadores de todos os sistemas de informática das nossas 165 comarcas, mas, ressalto, nenhum dado foi perdido, nenhum documento foi perdido. Foi mantido um plantão em tempo integral nas equipes da nossa direção de informática até o restabelecimento total. O que aconteceu em curto prazo, pode-se dizer, pois em um período de 17 dias já se tinha uma recuperação parcial do sistema e a possibilidade de acioná-lo, de trabalhar com ele. A recuperação total veio em 45 dias, com preservação integral de dados e mais, o nosso sistema Eproc não foi atingido pelo ataque, o que nos dá muita segurança, porque é o sistema que está recebendo os nossos processos eletrônicos e é aquele que ficará conosco para o futuro, possibilitando o judiciário gaúcho 100% digital. Nesse trabalho de recuperação do ataque, nós também tivemos, e a nossa equipe de informática atuou com muita segurança, firmeza e celeridade, a reformatação de cerca de 18 mil computadores, máquinas que servem aos trabalhos do Judiciário do Interior e Capital. Mesmo com os sistemas mais modernos de defesa cibernética, investimento grande se fez, se faz e continuaremos fazendo em segurança da informática, em informática. Podemos dizer ainda, que está em tramitação na Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática da Polícia Civil o inquérito que busca esclarecer detalhadamente esta ocorrência, este grave ataque. O inquérito tramita em segredo de Justiça, o que não poderia ser diferente, mas aguardemos a conclusão.

Como o TJ pode contribuir para implantar a recuperação fiscal?

Bem, nós como já afirmamos muitas vezes, aqui reafirmamos que o Poder Judiciário é parceiro dos demais poderes e instituições na árdua missão de implementar o sistema de recuperação fiscal. Nós enxergamos a medida como necessária, indispensável, inafastável para a efetiva retomada do crescimento. Nos últimos anos enaltecemos essa parceria, sobretudo, com a formação do Conselho de Estado, iniciativa elogiável do nosso governador Eduardo Leite. Nós contribuímos, viemos contribuindo e continuaremos imensamente. Esta é a nossa postura. Uma postura de união, de compreensão de todos nós, gestores públicos, em favor da causa pública, do sucesso, das melhores condições de vida para todos nós, de forma especial ao nosso povo, aos nossos jurisdicionados, buscando, evidentemente, o bem do Estado, da cidadania. É indispensável que tenhamos um Judiciário forte, independente, autônomo, atuante frente a todas as inquietudes sociais, só assim teremos um Estado realmente forte. Nós estamos já há algum tempo fazendo esta contribuição. Nós, o judiciário, contribuímos com cerca de R$ 300 milhões para o enfrentamento da pandemia. Eu destaco que cerca de R$ 17 milhões em recursos foram diretamente destinados pelo Poder Judiciário ao combate à pandemia. O contingenciamento orçamentário em 2020/2021 deve chegar a casa dos R$ 242,6 milhões. No ano passado foram R$ 4,5 milhões adicionais economizados pelo Poder Judiciário. Em março de 2021, em uma ação conjunta entre os poderes e instituições autônomas do nosso Estado foram alocados recursos emergenciais para hospitais, sendo que a contribuição do Tribunal de Justiça chegou a R$ 36,5 milhões de um total de R$ 70 milhões. O Judiciário já havia realizado doações para Santas Casas, hospitais, instituições de saúde, visando sempre a qualificação da estrutura, abertura de leitos, aquisição de EPIs, e nessa ação foram destinados mais de R$ 16,8 milhões. Também ressalto a doação de equipamentos de tecnologia e mobiliário para a Uergs, escolas públicas, prefeituras, entidades da Segurança Pública, colaborando sempre para a continuidade e boa prestação do serviço público. Reafirmo a nossa postura de cooperação, nos limites de nossa capacidade, e observando as necessidades para que se possa realmente levar ao crescimento no nosso Estado.

Algum outro projeto, como os do Juizado Especial Cível Online, dos CEJUSCs Empresarial e do Cidadão Online, está na pauta do TJ?

Além de todos estes projetos que nós manteremos e reforçamos, implementamos novas formas de agilidade no atendimento ao cidadão, explorando a forma positiva de todo o nosso parque de informática, para que possamos, e o meio virtual se acelera como meio de comunicação, embora seja imprescindível o presencial. Mas, toda a forma que puder fazer com que cidadão se conecte com o Poder Judiciário sem sair de casa, através do celular ou computador, acessando muitas das nossas informações, de andamento processual, de orientação, informação sobre como buscar ingresso de ações, de pleitos, orientações de buscas conciliatórias, enfim, para onde o cidadão se encaminha para buscar uma certidão negativa, uma autorização de viagem para menor desacompanhado dos pais, implementamos. Pretendemos deixar o Poder Judiciário acessível, com informação pronta, completa e eficaz para o cidadão.

Qual a mensagem que a senhora gostaria de passar para a população?

Uma mensagem de que realmente estamos juntos. Que contem com o Poder Judiciário gaúcho, que busquem conhecer as nossas atividades, as atividades dos nossos magistrados, servidores e demais colaboradores. Que saibam que a nossa missão constitucional é por nós atendida diuturnamente, nos mais diversos despachos, decisões e sentenças. Nas mais diversas iniciativas, não só jurisdicionais, mas administrativas, buscando alcançar a todos aquela prestação jurisdicional eficaz, suficiente, que realmente atenda aos anseios daqueles que batem à porta do Judiciário, célere e para tanto estamos investindo muito nos nossos sistemas de informática, no sistema Eproc, no processo eletrônico, digitalização de processos. Poder Judiciário gaúcho 100% virtual em 2022 é a nossa meta. Enfim, todas aquelas metas que nós entendemos como ações prioritárias, que visem nos conectar, deixando o Poder Judiciário gaúcho mais transparente e que o cidadão possa buscar a resposta jurisdicional e que esta se dê de forma rápida, o que todos querem, e de forma suficiente.


Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895