A mais linda de Palma Real

A mais linda de Palma Real

Crônica da vida cotidiana

publicidade

 

      Sabe-se que são incontáveis os belos lugares no mundo e que a indústria do turismo não nos permite originalidade. Por isso, meu encantamento com Juanillo, na República Dominicana, não deve ser considerado como uma descoberta. Mesmo assim, vale o registro. Trata-se de um passeio formatado com suas várias etapas: catamaran, parada em piscinas naturais no mar azul caribenho e caminhada nas areias deslumbrantes de Juanillo, onde se pode experimentar isolamento a poucos metros de uma pista asfaltada, que parece surgir como uma miragem sob o sol quando os olhos estão repletos de mar. No barco, a magia que parece fabricada demais para funcionar, funciona. Ao som de “te gusta el mueve mueve” todos se mexem, o médico alemão, a advogada americana, o engenheiro francês, o físico dinamarquês e quem mais se possa imaginar.

      Há neste canto do mundo um traço que continua a mexer com imaginários suscitando reações paradoxais de entusiasmo e medo. É o motorista do ônibus que, no portão de um grande hotel, sorri para a bela controladora de entrada de lábios vermelhos e suavemente lhe diz:

– La más linda de Palma Real.

      Ela se derrete. A turista americana teria exclamado:

– Oh, my God!

      Cláudia e eu rimos. O galanteador conta que é a terceira vez que vê a moça. A vida segue entre expectativas e certa malemolência. Machismo latino-americano típico? Sedução tropical na justa medida? Expressão sensual de uma cultura quente e docemente lasciva? Resquício de uma tradição condenada ao justo desaparecimento? Resistência do corpo em tempos de politicamente correto abusivo? Direito ao prazer numa dura rotina do trabalho mal pago? Que mais? Não será um pouco desse vitalismo que todos procuram nestes paraísos onde não existiria o pecado?

      Memorizei o exato instante em que a “más linda de Palma Real” sorriu, entre feliz e tímida, ao ouvir o elogio do Don Juan ao volante do seu “autobus” de turistas. Não tenho imagem melhor. Que me desculpem os inimigos dos clichês e os fiscais de metáforas: uma flor se abriu enchendo o mundo de uma beleza simples e incomparável. Não existissem todas as inúmeras belezas caribenhas, a viagem já teria valido por esse sorriso alvo e carmim de satisfação na manhã. O galanteador era um jovem “guapo” com o perfil aparentemente dominante entre os dominicanos.

      Destas férias, guardarei fotos, lembranças, imagens gravadas no mais fundo da alma, que é onde permanece o essencial de uma viagem, e esta frase pronunciada com cada sílaba escandida musicalmente:

– La más linda de Palma Real.

      Não é de duvidar que dentro de muitos anos ao ver um sorriso de mulher se iluminar ao sabor de palavras sussurradas graciosamente eu me lembre da bela negra dominicana que ofuscou o azul do mar do Caribe:

– La más linda de Palma Real.


Mais Lidas

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895