AI-5, o mais infame dos Atos

AI-5, o mais infame dos Atos

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O deputado Márcio Moreira Alves, do MDB, fez um discurso de cinco minutos em setembro para um plenário da Câmara dos Deputados quase vazio. Propôs que as moças não dançassem com seus pares fardados durante os festejos da Semana da Pátria. Não era nem mesmo uma greve de sexo. Esse episódio quase patético ou ingênuo serviria para que a ditadura baixasse, em 13 de dezembro de 1968, sexta-feira, há 50 anos, o famigerado Ato Institucional nº 5. Implantava-se a ditadura dentro da ditadura. Caíam todas as máscaras. O Brasil conseguia ir além do fundo do poço. Um feito.

Revisionistas bizarros afirmam que não houve ditadura. O AI-5 no seu artigo 1º dizia: “São mantidas a Constituição de 24 de janeiro de 1967 e as Constituições estaduais, com as modificações constantes deste Ato Institucional”. No artigo 2º, cravava: “O Presidente da República poderá decretar o recesso do Congresso Nacional, das Assembleias Legislativas e das Câmaras de Vereadores, por Ato Complementar, em estado de sítio ou fora dele, só voltando os mesmos a funcionar quando convocados pelo Presidente da República”. Sem dúvida, ato típico de uma democracia. Se a Constituição era mantida, podia ser ignorada: “Art. 3º - O Presidente da República, no interesse nacional, poderá decretar a intervenção nos Estados e Municípios, sem as limitações previstas na Constituição”.

O artigo 6º enterrava o que o Ocidente levara mais de um milênio para construir: “Ficam suspensas as garantias constitucionais ou legais de: vitaliciedade, inamovibilidade e estabilidade, bem como a de exercício em funções por prazo certo”. Cada item conseguia ser pior: “Art. 10 - Fica suspensa a garantia de habeas corpus, nos casos de crimes políticos, contra a segurança nacional, a ordem econômica e social e a economia popular”. É claro que ficavam proibidas “atividades ou manifestação sobre assunto de natureza política”. Mas não era ditadura. Era revolução. Uau!

O ato infame foi decretado “com vistas a encontrar os meios indispensáveis para a obra de reconstrução econômica, financeira e moral do país". Antes do final de 1968 a guilhotina já havia ceifado onze deputados, entre os quais Márcio Moreira Alves. A democracia fardada não podia mais tolerar “comunistas” infiltrados nas instituições. Alberto Dines, jornalista que apoiou fervorosamente o golpe midiático-civil-militar de 1964, publicou então no Jornal do Brasil uma previsão do tempo anônima que fez dele um herói da resistência ao regime: “Tempo negro.
Temperatura sufocante. O ar está irrespirável. O país está sendo varrido por fortes ventos”. Quem planta ventos golpistas colhe ditaduras.

Tudo por causa de um discurso que dizia: "Seria preciso fazer hoje no Brasil com que as mulheres de 1968 repetissem as paulistas da Guerra dos Emboabas e recusassem a entrada, à porta de sua casa, àqueles que vilipendiam a nação". As Lisístratas brasileiras que namoravam cadetes e oficiais eram recatadas e do lar. Não pretendiam ser mulheres de Atenas. Márcio Moreira Alves pagou caro por ler tragédias gregas. O Brasil passou dez anos nas mais profundas trevas. Era a “democracia” do AI-5. Claro.

 

 

 

 

 

 

 

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