Assassinos em Mianmar

Assassinos em Mianmar

Militares golpistas matam quem os critica

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      A situação em Mianmar, no sudeste asiático, chama a atenção do mundo. Isto é, de parte do mundo. Militares retomaram o poder e matam quem a eles se opõe sem a menor cerimônia. A comunicação do novo governo é transparente: quem ousar sair às ruas para protestar expõe-se a tiros na cabeça ou nas costas. Num só cumprimento da ameaça foram noventa mortos. Há ditaduras que não provocam muita indignação em setores que normalmente atacam certos regimes autoritários. A Arábia Saudita é uma ditadura que não parece preocupar os críticos das ditaduras cubana, venezuelana e norte-coreana. O contrário também é verdadeiro. A ditadura de Mianmar não arranca um pio de certos setores. Militares deveriam indignar-se em todo o mundo em nome de um princípio universal das forças armadas: proteger as democracias.

      Quem vai salvar a população de Mianmar dos seus tiranos? Eles matam as pessoas pela convicção de quem sabem o que é melhor para elas. A ONU vai intervir? O ditador interino jura que vai chamar novas eleições em Mianmar. Só não diz quando. Não tem pressa. Quem o cutucar, morre. Quem quiser se lembrar como um ditador perverso age pode ler ou reler “A festa do bode”, de Vargas Llosa, sobre Trujillo, o déspota que ensanguentou a República Dominicana durante algumas décadas. Um animal peçonhento, corrupto, cruel e apoiado por boa parte dos ricos locais, que se locupletavam em negócios com o Estado. Estamos em 2021 e o mundo ainda não se livrou das ditaduras militares.

      Quem tem armas e tempo livre sente a tentação de usá-los. Mianmar luta contra o coronavírus e contra os seus protetores fardados. Um militante contra o golpe resumiu para uma agência de notícia o modus operandi dos generais novamente no poder: "Hoje é um dia de vergonha para as Forças Armadas. Os generais militares estão comemorando o Dia das Forças Armadas depois de terem matado mais de 300 civis inocentes". Em Mianmar não basta ser honesto. Fundamental é ser obediente. A América Latina tem experiência no ramo. O novo ministro brasileiro das Relações Exteriores poderia estrear emitindo uma nota robusta sobre Mianmar. O ex estava mais preocupado em permanecer no cargo, bombardeado pelas forças vitoriosas do Centrão.

      Mianmar, ex-Birmânia, tem uma longa história de infelicidade, inclusive no período em que esteve sob a dominação dos ingleses, ou sob ocupação japonesa. Agora, a população parece decidida a brigar por democracia. Os militares garantem que acham a ideia boa, desde que possam ditar o que entendem por democracia. Um general teria declarado que lhes cabe zelar pela ordem no país evitando fraudes e aventuras políticas. Segundo a BBC as forças armadas de Mianmar controlam importantes setores comerciais e deram o golpe para proteger os seus negócios. O filho do chefe do golpe, por exemplo, é acionista majoritário do operador nacional de telecomunicações e dono de spa. Quantos ainda terão de morrer ainda para que Mianmar se livre de protetores tão indesejados e não convidados para a cerimônia da liberdade? As forças armadas do mundo inteiro podiam protestar.

 


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