Brasil tem 20% das mortes do mundo na última semana

Brasil tem 20% das mortes do mundo na última semana

A complexidade das restrições

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      Por que o Brasil tem 20% das mortes por Covid no mundo nesta última semana? Por que o Rio Grande do Sul contou 502 mortes num dia? Não dá para ignorar. Tudo que é complexo tende a ser desprezado ou simplificado a golpes de martelo. A lógica das restrições à circulação de pessoas é pura complexidade. Começa que nem todos podem ficar isolados. Os serviços essenciais precisam ser mantidos. Não há como parar a produção e distribuição de alimentos. Nem os serviços de saúde. Todos os que atuam nesses campos são heróis que se sacrificam pelo conjunto. Todo trabalho é essencial para quem dele vive. Neste caso, para que os chamados serviços não essenciais parem sem prejuízo total aos atingidos, empresários e trabalhadores, o Estado, que é a sociedade organizada por meio dos seus eleitos, deve apoiá-los financeiramente. Por quê? Para que a circulação de pessoas diminua e com ela a disseminação do vírus devastador. Cidades e países que fazem isso acabam colhendo os bons resultados possíveis.

      Não se trata de, tendo emprego e rendas garantidos, pedir a outros que se sacrifiquem e fiquem sem trabalho e renda. Nem de ficar protegido e mandar outros para a linha de frente. Apontar dedo dessa forma não ajuda. A estratégia deve ser coletiva: o Estado (sociedade) banca quem puder ficar em casa como programa de contenção do vírus. É esforço de guerra certamente por tempo limitado. Jogar todo mundo na rua tendo como escudo de proteção medicamentos de eficácia, no mínimo, duvidosa é atirar soldados de baioneta contra poderosos canhões invisíveis. Tragédia certa. O paradoxo do momento, para alguns, é que só o Estado atuante por algum tempo poderá devolver, a médio prazo, a pujança da livre iniciativa.

      O medo rói corpos e mentes. Pessoas declaram-se apavoradas com a falta de um horizonte factível. Não há mais aquela ideia inicial de que passaria rapidamente. Até quando vai isso? É a pergunta pungente que mais se ouve. O medo de ter de ir a um hospital por qualquer razão é enorme. Pessoas vão por uma razão qualquer e podem pegar Covid e não sair mais. Nem ver os familiares. A ansiedade faz estragos gigantescos. A saúde mental se deteriora. O mundo deveria ter dado o maior exemplo de cooperação internacional há meses: transferir tecnologia, quebrar patentes, fabricar insumos e engajar todos os laboratórios capazes de estar aptos a produzir vacinas para um esforço concentrado: 16 bilhões de vacinas em seis meses. A palavra de ordem só poderia ser: SOS humanidade.

      Alguns parecem crer que governos querem parar a economia por perversidade ou ideologia. Por que Portugal fechou depois de uma flexibilização desastrada no final do ano? Por que Londres entrou num lockdown quase sem brechas? Não foi por falta de remédios de eficácia duvidosa. Seria maravilhoso que medicamentos já existentes dessem conta do recado. Tomara que surja algum que não seja promessa vã. Por enquanto, isolamento e vacina são as ferramentas mais eficazes disponíveis. Outra alternativa é: saem todos às ruas, morre que não tiver sorte, acontece uma triagem por falta de condições de tratar a todos e quem sobrevive, marcado pela tragédia, contando perdas, grita: vida que segue.


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