Confesso que torci

Confesso que torci

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Fiquei muito triste com a eliminação do Brasil da Copa do Mundo. Eu sempre torço. É uma relação infantil com a Seleção. A cada quatro anos em me vejo menino em Palomas torcendo apaixonadamente. Quando o time entra em campo só o futebol me interessa. Não quero saber se os jogadores são ricos, arrogantes ou se votaram neste ou naquele candidato. Fiquei com a convicção de que o Brasil tinha a melhor equipe desta Copa. Futebol para mim é uma mistura de lógica e acaso. Em geral, os mais fortes ganham, mas os detalhes imprevistos decidem muito. “Se” não ganha jogo, mas relativiza as “superexplicações”, facilita a análise dos fatos concretos e humaniza.

“Se” o último chute de Neymar tivesse saído um centímetro mais para o lado, o Brasil teria ido à prorrogação e possivelmente vencido. O atacante não seria chamado de imaturo. Nada disso tem a ver com a corrupção escancarada da CBF nem com planejamento. Os neotáticos creem que tudo pode ser planejado e que o treinador tem superpoderes. Sugerem também que tudo se explica por decisões externas ao jogo. Mais uma ilusão cientificista em tempos de algoritmos que tudo sabem. Quantos previram França, Bélgica, Croácia e Inglaterra nas semifinais? Quantos colocaram Croácia ou Inglaterra na final? Quase ninguém. Uma delas chegará.

Futebol é uma deliciosa mistura de estratégia e de improvisação. Depois dos 7 a 1 da Alemanha no Brasil os neotáticos garantiram que era uma vitória da pátria do planejamento. A eliminação da Alemanha na primeira fase desta Copa deixou o pessoal sem palavras. O planejamento agora é belga. A esculhambada Argentina não ganhou da planejada Alemanha em 2014 por detalhe. Nesta Copa, o brasileiro Mário Fernandes fez um gol improvável para a Rússia ao final da prorrogação contra a Croácia e perdeu bisonhamente um pênalti. Foi de herói a vilão. Nada disso tem a ver com o autoritarismo de Putin nem com planificação. Apenas com o acaso.

O Brasil não perdeu por ter planejado mal, investido demais em publicidade ou mimado demais seus jogadores. Perdeu por ter feito um gol contra e errado cinco gols feitos. A explicação para um resultado quase sempre está no próprio jogo e não fora dele. Os resultados, porém, são constantemente manipulados para confirmar ou negar teses. Cria-se uma expectativa em relação ao Brasil quase sempre acima das reais possibilidades dentro de campo como se a Seleção tivesse a obrigação de ganhar. Em campo, o Brasil é um bom time contra alguns outros bons times sujeitos às improvisações e acasos de uma partida. O imprevisto é o grande estrategista.

O paradigma da vitória obrigatória, que subestima adversários e inflaciona nossa autoestima, sem influir magicamente, sempre busca uma explicação externa para a derrota. Se perdeu é por ter planejado mal. O futebol é tão deliciosamente imprevisível no detalhe, embora bastante previsível no atacado, que o brasileiro Renato Augusto, apodado pelos neotáticos como “aquele que nem devera ter ido para a Copa”, saiu do banco de reservas, para horror de todos, marcou um gol e por detalhe não fez o segundo, que tiraria o Brasil das cinzas. Torci, torci muito, sofri, lamentei e odiei os que torceram contra. Já passou. Mas ficam as cinzas da dor.

A Bélgica já foi. Era apenas uma equipe média com alguns excelentes jogadores.

Será que voltará a impressionar? Ou foi apenas um sonho de verão na Rússia?

E se ganhar a Inglaterra com seu velho futebol de bola alta na área?

Tudo é possível. A regra máxima do futebol é: todos os estilos são válidos.

Basta ganhar. O melhor desempenho ainda é o resultado.

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