Democracia militar

Democracia militar

Brasil entra em nova era?

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Edgar Morin, 98 anos de idade, insiste: a história não é linear. Se avança, também pode recuar. Se progride, também regride. Jair Bolsonaro quer militarizar o ensino fundamental brasileiro. No mundo desenvolvido, as disciplinas tombam e morrem. É tempo de transdisciplinaridade, interdisciplinaridade, multidisciplinaridade e de pensar fora da caixa. O sentido agora é não ficar na mesma posição, muito menos em ordem unida. O ditador Getúlio Vargas prendia cartunistas, mas colecionava suas charges. A presidente da Câmara de Vereadores de Porto Alegre, Mônica Leal, não podendo enjaular os chargistas, mandou recolher suas caricaturas do “mito” do saguão da casa legislativa que dirige, onde faziam crítica política.

      O novo Procurador-Geral da República, Augusto Aras, entende que o Brasil pode viver um novo ciclo, o de uma democracia militar. O prefeito do Rio de Janeiro, talvez gostando da ideia e tratando de radicalizá-la, quis tirar da Bienal do Livro obra com beijo gay de adolescentes. Vou lançar na Feira do Livro de Porto Alegre um romance, “Acordei negro”. Bem que uma autoridade local podia mandar recolher todos os exemplares na hora da sessão de autógrafos. Será que o prefeito Nelson Marchezan Júnior faria isso por mim? Não consigo imaginar outro lance de marketing mais eficaz. O saudoso Jean Baudrillard, pensador do hiper-real, dizia que a melhor forma de vencer o talibã era bombardear o Afeganistão com uma chuva de calcinhas.

      Há palavras que nunca usamos. Oximoro é uma delas. Democracia militar seria um oximoro? O que é um oximoro? Uma “figura em que se combinam palavras de sentido oposto que parecem excluir-se mutuamente, mas que, no contexto, reforçam a expressão”. Democracia militar reforça qual expressão? A expressão de pavor. O ministro Paulo Guedes, velho, feio e insosso, resolveu bajular o chefe Jair Bolsonaro, com o qual compartilha esses três atributos, e enfatizou que a primeira-dama francesa é “feia mesmo”. Da grosseria não é preciso falar. Ela é suficientemente expressiva em si mesma. A declaração, contudo, poderá usada em oficinas de combate ao machismo. Paulo Guedes é oximoro: genialmente incompetente, expressivo como um chuchu, aridamente sedutor, etc. Numa democracia militar, o voto veta.

      O tempo da conquista do poder pelos tanques parece revoluto. Agora, a centro-direita prefere os golpes midiáticos-jurídico-parlamentares. A extrema-direita, mais inovadora, escolhe o voto direto, impulsionada por fakenews e disseminação de ódio nas redes sociais. A democracia militar é populista, neoliberal, tecnologicamente vanguardista e conservadora em costumes. Os seus grandes temores são meninas de azul, meninos de rosa e gibis com beijo gay. Na democracia tradicional, o mundo girava. Na democracia militar, a Terra é plana e as músicas dos Beatles foram compostas pelo pensador alemão Theodor Adorno, que odiava a indústria cultural, termo que propagou como militante do “marxismo simbólico”. Pensando bem, a história é que é um oximoro: uma progressão regressista.

      A expressão mais perfeita desse avanço para a barbárie é a foto de Eduardo Bolsonaro, ao lado da cama do pai, no hospital, de arma na cintura. Cena grotesca, típica de um romance latino-americano de Mario Vargas Llosa. Quadro que se completa com uma posta de Carlos Bolsonaro, o lado mais escuro da família: “Por vias democráticas a transformação que o Brasil quer não acontecerá na velocidade que almejamos... e se isso acontecer. Só vejo todo dia a roda girando em torno do próprio eixo e os que sempre nos dominaram continuam nos dominando de jeitos diferentes!” A democracia militar surge como como um tanque pronto a restabelecer a ordem. Uau!

 

 


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