Diário da quarentena (25): comunavírus?

Diário da quarentena (25): comunavírus?

Mais um disparate ministerial

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      O mundo inteiro está apavorado com o coronavírus. O ministro brasileiro das Relações Exteriores, o delirante Ernesto Araújo, acha que o verdadeiro problema é outro: o comunavírus. Depois de ler um livreto do teórico neomarxista Slavoj Zizek, estrela mundial do pop intelectual, Araújo postou texto contra a ameaça comunista que, segundo ele, infectaria a Organização Mundial da Saúde para disseminar o vírus vermelho por meio de organismos globalistas contrários ao Estado-Nação, à liberdade, à livre iniciativa e aos valores e princípios ocidentais.

      Fala sério, cara! Discípulo de Olavo de Carvalho, membro da ala mais ideológica do governo de Jair Bolsonaro, Araújo cravou: "O Coronavírus nos faz despertar novamente para o pesadelo comunista". Onde? Como? Araújo argumenta: "Zizek revela aquilo que os marxistas há trinta anos escondem: o globalismo substitui o socialismo como estágio preparatório ao comunismo. A pandemia do coronavírus representa, para ele, uma imensa oportunidade de construir uma ordem mundial sem nações e sem liberdade". A consequência dessa visão turva tem sido a recusa do Brasil em apoiar decisões da ONU de internacionalização de medidas contra o coronavírus e até de designar representantes para reuniões.

      Araújo é obcecado pela ideia de que multilaterismo significa um disfarce comunista ardiloso. Cooperação internacional é para ele enfraquecimento da soberania nacional. Aí cada um de nós se pergunta: como pode um chanceler reduzir tudo a uma grande conspiração? Palavras dele: “O vírus aparece, de fato, como imensa oportunidade para acelerar o projeto globalista. Este já se vinha executando por meio do climatismo ou alarmismo climático, da ideologia de gênero, do dogmatismo politicamente correto, do imigracionismo, do racialismo ou reorganização da sociedade pelo princípio da raça, do antinacionalismo, do cientificismo. São instrumentos eficientes, mas a pandemia, colocando indivíduos e sociedades diante do pânico da morte iminente, representa a exponencialização de todos eles". Até a ciência!

      Um contraponto a Ernesto Araújo é o artigo do prêmio Nobel da economia Paul Krugman: “Uma coisa que o coronavírus projetou em forte relevo é a centralidade do charlatanismo — pronunciamentos confiantes sobre assuntos técnicos por pessoas que não têm ideia do que estão dizendo — para toda a empreitada do conservadorismo moderno”. Quando a pessoa tem poder de decisão, o achismo transformado em contestação ao conhecimento transforma-se em algo muito perigoso. Jamil Chade, colunista da Folha de S. Paulo, destacou: “O Brasil não fez parte do grupo de países que apoiou uma resolução sobre acesso a remédios e tratamentos, não saiu ao apoio do multilateralismo, ficou de fora de reuniões importantes na OMS, silenciou diante do corte de recursos, comprou brigas com a China e se limitou a repetir o comportamento do governo americano no palco internacional”. Neste momento de aflição o perigo é o comunismo tomando um vírus como pretexto para se disseminar?

No Ministério de Jair Bolsonaro o pior sempre pode se consumar: Abraham Weintrabu, da Educação, ironizou a morte da sogra de um médico:

– Mais uma morte suspeita – escreveu.

Um homem assim não tem respeito pela dignidade humana.

 

 

 


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