E agora, Flávio?

E agora, Flávio?

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Era o resumo da ópera: o COAF, organismo hoje comandado por Sérgio Moro, flagrou, antes do juiz se tornar ministro, uma movimentação estranha na conta de Fabrício Queiroz. Um milhão e duzentos mil reais. Algo incompatível com os ganhos do assessor de Flávio Bolsonaro, deputado estadual no Rio de Janeiro, senador eleito, filho do agora presidente da República Jair Bolsonaro. Ficou-se sabendo que Queiroz recebia depósitos de seus colegas em dias de pagamento da Assembleia Legislativa. Também veio a público que uma das filhas de Queiroz, assessora do então deputado Jair Bolsonaro em Brasília, atuava de personal trainer no Rio de Janeiro. Nada de muito original neste país tropical.

Um cheque de Queiroz aterrissou na conta da esposa de Bolsonaro. O que se esperava desde o começo? Coisa simples: que Fabrício Queiroz esclarecesse a situação. O que se viu? Primeiro, ele sumiu. Ficou dias desaparecido. Flávio Bolsonaro então contou ter encontrado com o assessor e ouvido dele uma explicação plausível para os fatos. Mas, surpresa, não podia contar para o Brasil o que ficara sabendo. Queiroz faltou ao primeiro chamado do Ministério Público para clarear tudo. Em seguida, deu uma entrevista na qual revelou ter estado doente e hospitalizado, mas não lembrou o nome do hospital onde estivera hospedado. Avisou que teria de sofrer uma cirurgia para extrair um tumor, o que aconteceu em São Paulo, no Einstein, destino incomum para um carioca de classe média endividado. Mas cada cuida de si como pode.

No hospital, Queiroz deixou-se filmar dançando. Disse que foi um segundo de alegria num momento triste. Ao longo de um mês o que o Brasil ficou sabendo? Segundo Jair Bolsonaro, que o cheque na conta da sua mulher era restituição de um empréstimo? Mais detalhes? Nenhum. Conforme Queiroz, que ele negocia carros. Mais detalhes? Nenhum. Queiroz já faltou a dois encontros com o MP por estar doente. A sua esposa e as suas filhas, também enroladas, não foram depor por estarem cuidando do doente. Flávio Bolsonaro não compareceu ao MP por não ser investigado e por querer ver primeiro os autos da investigação. O que pensa qualquer um? Se Queiroz pode dar entrevista e dançar, não poderia ter gasto quinze minutos para fornecer uma explicação com alguns detalhes consistentes? Seria pedir muito que fizesse isso hoje?

Afinal, é ou não é para esclarecer? Flavio Bolsonaro disse que sim, mas foi ao Supremo Tribunal Federal pedir para barrar a investigação. O ministro Luís Fux atendeu à demanda. A busca de esclarecimento está suspensa até o final de janeiro. Qual o motivo alegado por Flávio? Não se pode saber. Segredo de Estado. Quer dizer, de justiça. Em entrevista, Flávio disse que o MP o investigou irregularmente e que quebrou o seu sigilo bancário sem autorização judicial. Faz mais de nove meses que o Brasil espera que as mortes de Marielle e de Anderson sejam esclarecidas. Faz mais de um mês que o país espera o esclarecimento do caso Queiroz. Vai demorar. Que mistério é esse? As más línguas, na falta de esclarecimento, ficam dizendo que era uma “caixinha”, esquema no qual um parlamentar retoma parte do salário dos seus comissionados. Não seria mais fácil e eficaz esclarecer? Ou há algo a esconder? Que urgência havia para Fux suspender a investigação na condição de plantonista do STF? E a tal da transparência? O COAF flagrou também depósitos de mesmo valor em sequência na conta de Flávio Bolsonaro. Algo que no linguajar técnico se rotula de suspeito.

O vulgo, no bar, tomando umas, pergunta: era isso que ele queria que o STF não deixasse revelar?

Nada que não se resolva com uma pronta e clara explicação.

Houve uma vez na América um gigante que beijou a lona em horário nobre.

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