Golpe na Bolívia e instabilidade na América do Sul

Golpe na Bolívia e instabilidade na América do Sul

Crises abalam países de esquerda e direita

publicidade

 

      A América do Sul não saiu do pesadelo. Continua a ser o que sempre foi: lugar de instabilidade política e social. Países com governos de direita e de esquerda entraram novamente em convulsão: Equador, Peru, Chile, Bolívia, Venezuela. A Argentina tenta salvar-se guinando à esquerda depois do fracasso da gestão neoliberal de Maurício Macri. O Uruguai decidirá seu futuro próximo num segundo turno. O Brasil vive o apogeu da polarização. Evo Morales renunciou. Ou foi golpeado? Ou foi reação a uma fraude eleitoral? O presidente chileno aceitou mudar a Constituição para tentar acalmar as ruas. O STF, no Brasil, resolveu seguir à risca o texto constitucional de 1988, o que, para muitos, é algo inaceitável e triste.

      Por que a América do Sul não consegue manter a estabilidade durante muito tempo?  A resposta talvez seja dupla e paradoxal, ou contraditória: incapacidade de superar a profunda desigualdade que devasta cada país e desprezo pelas normas escritas. Há teóricos atualmente que sofismam à luz do dia. Afirmam que a desigualdade não é problema. Que poderia haver de errado em alguém em ter um bilhão enquanto outro meio bilhão? O filme “Coringa”, que está espantando o mundo com sua crítica social, está aí para explicar que não se trata disso, mas da divisão clássica entre quem tem tudo e quem nada tem. Mensagem do filme: quem semeia humilhação, colhe tragédia. A desigualdade só cresce. O economista francês Thomas Piketty provou isso em seu gigantesco e profundo “O capital do século XXI”.

      Lula saiu da prisão e fez, em São Bernardo, um discurso duríssimo. Para uns, o petista exagerou no ressentimento, no rancor, na provocação e no acerto de contas, estimulando a polarização que colocaria o Brasil na beira do abismo. Para outros, Lula jogou verdades na cara do país, apontando desvios do sistema judicial e erros da política econômica. Outros, ainda, preferem uma clareza cujas consequências são imprevisíveis: a polarização é um dado da realidade. Lula só a explicitou. Não poucos, pelas ruas, sintetizaram: o país está em guerra. Uma guerra ideológica.

      A decisão do STF levou às ruas manifestantes de verde e amarelo que estavam em casa tranquilamente desde a vitória de Bolsonaro contra Fernando Haddad. Foram protestar contra o que consideram porta aberta para a impunidade. A esquerda vê contradição e seletividade nessa postura. Cobra que essas pessoas não desfilaram contra as denúncias de “rachadinha” do agora senador Flávio Bolsonaro quando deputado estadual no Rio de Janeiro, nem contra o sumiço do seu faz-tudo, o tal Queiroz, que admitiu ter recolhido dinheiro de colegas, funcionários do filho do presidente da República, mas nunca apareceu para depor ao gelado Ministério Público.

      O Chile até há pouco era o modelo a ser importado pela direita brasileira. Desandou. A esquerda louvava os avanços da Bolívia. Implodiu. Evo Morales, assim como se fez na Venezuela, alterou a regra do jogo para candidatar-se a mais mandatos do que o previsto constitucionalmente. Caiu. Mas fez os melhores governos da história boliviana, dando crescimento à nação, diminuindo a miséria,  incluindo os mais pobres e deserdados.

A extrema direita populista avança. O tempo do pesadelo será longo.

 


Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895