Minhas críticas a Lula e ao PT

Minhas críticas a Lula e ao PT

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O tempo

 

Fiz aniversário na terça-feira: 57 anos de idade. O primeiro “presente” foi a mensagem de um leitor comunicando que cancelaria a assinatura do jornal apostando que eu sou comunista. Nesse tipo de coisa sempre fica subentendido que os democratas aceitam continuar se o “comunista” for demitido. Jornal pluralista, claro, não se dobra. Em seguida, chegou mensagem, por exemplo, do Beto Moesch, ambientalista que já foi vereador pelo PP. Dizia, a respeito de meu texto sobre Brumadinho, isto: “Simplesmente sensacional teu artigo de hoje no Correio. Muito obrigado”.

Eis a beleza do jogo.

O prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan Júnior, liberal de profundas convicções, convidado assíduo do nosso Esfera Pública, na Rádio Guaíba, desde quando era deputado, me mandou um whats: “Parabéns! Feliz aniversário! Saúde e alegrias”. Admiro Nelson. Gosto da sua combatividade. Evidentemente que não temos as mesmas ideias sobre a maior partes das coisas. Nos últimos dias, fui criticado por dar espaço no rádio para Kim Kataguiri, Marcel van Hatten, Bibo Nunes e Rui Irigaray falarem. Sou um “comunista” liberal. Nas redes sociais, fui criticado por nunca ter falado dos desmandos dos filhos do Lula e por defender o “presidiário”. Fui o primeiro a escrever “Lulla”. Posso publicar um livro de 500 ou mais páginas com críticas que fiz aqui à corrupção nos governos petistas.  Não se mede jornalista de opinião por imparcialidade, mas por independência. Com 34 anos de jornalismo e cabelos grisalhos, sei disso.

Na faculdade, os marxistas me odiavam. Eu era anarquista. Ainda no começo da carreira jornalística, pós-queda do muro de Berlim, ataquei o stalinismo, que sempre detestei. A direita achou que podia me cooptar. Frustrou-se. Quando percebi as manobras ideológicas contra políticas sociais razoáveis do lulismo, não temi me posicionar. A esquerda achou que me tinha. Enganou-se. Como dizia Edgar Morin, eu não sou de ninguém. Só o pluralismo me interessa. Na tevê universitária, criei e apresentei um programa durante 13 anos: “Argumento contra Argumento. Argumento, contra-argumento. Ponto e contraponto. Estive no leste europeu depois da queda do socialismo. Visitei Cuba e China. Escrevi, sobre Cuba, um texto que ainda circula: “Inferno no Paraíso”. Fui odiado pela esquerda no episódio que opôs Marcia Tiburi e Kim Kataguiri. Pedi desculpas naquilo que erramos. Fui odiado pela direita no episódio com Bolsonaro, quando saí de um programa por não poder, por imposição dele, fazer-lhe perguntas. Ser jornalista não é mingau.

No domingo, no Brique da Redenção, lancei “Ser feliz é tudo que se quer”. Três horas e meia de autógrafos. Muito carinho dos leitores. Havia fãs de Bolsonaro e de Lula. Passa o tempo, tudo muda, eu mudo, mas não num ponto: continuo não sendo comunista. Nem neoliberal. De coração, permaneço anarquista. Pragmático, sou socialdemocrata.

Meu modelo é sempre a Suécia.

Independente e posicionado caso a caso.

Ontem, critiquei duramente a justiça por não autorizar Lula a ir ao enterro do irmão.

Toffoli, pusilânime, autorizou Lula a fazer uma parte do caminho e o morto a fazer a outra.

Nem a ditadura impediu Lula de prantear seus mortos.

Eu só tenho um credo: minha independência. A direita acha que eu sou petista. Mas eu não voto no PT. Em 2018, no primeiro turno, votei em Ciro Gomes. Em 2014, em Luciana Genro. Em 2010, nulo. Em 2006 e 2002, nulo. Em 1994 e 1998, estava no exterior e não votei. Em 1989, Brizola. Acontece que também não sou antipetista. Sou livre. Eu poderia lançar um livro de 500 páginas com os artigos que publiquei nos últimos anos criticando o PT. Ataquei a corrupção, falei dos filhos de Lula, de tudo. Se fui o primeiro a escrever “Lulla”, quando senti que a extrema-direita queria me usar, alterei a fórmula. Eu sigo o que Jean Baudrillard me ensinou: nunca estar onde me esperam.

Seguem alguns textos para refrescar a memória dos seletivos sobre minha independência.

 *

Lula lá

O cerco está se fechando. Lula será pego? Um deputado petista me sussurrou que não duvida disso. Não que tenha alguma informação específica, mas percebe ou pressente que o ex-presidente está cada vez mais cercado. Além disso, haveria na postura herdada de certo sindicalismo algo “pouco republicano”. Eu não ficarei surpreso se Lula for conviver com José Dirceu em alguma cela. Aliás, o que restou de José Dirceu? Nada. Foram-se os gritos de “guerreiro do povo brasileiro”. Acabaram-se as ilusões. Dirceu não foi mártir da bela causa operária, mas só um larápio comum que se locupletou no poder.

Lula já começa a lembrar o pato pateta, que acabou na panela pelas tantas que fez. A relação de Lula com as empreiteiras amigas é para lá de suspeita. As marcas do toma-lá-dá-cá carimbam empresas que vivem de servir-se do Estado. O PT é um cadáver que anda. Concordo com o senador Cristóvão Buarque: o Brasil precisava zerar todos os seus partidos e refundá-los. Nomes novos, programas novos, vida nova. Salvo exceções como o PSOL. Antes, porém, é preciso que as investigações completem seus trabalhos. O monumento Lula vaza por todos os lados. É um barril cheio de furos. Ou, valha outro bom clichê, um queijo suíço. Um dia é o filho Lulinha. Outro dia é o filho Fábio. Ou é a nora. Depois tem um tríplex. E logo um sítio.

Sabe-se que a família Lula não é dona da Friboi nem de todas as terras de Alegrete. Lula não foi capa da Forbes como um dos homens mais ricos do Brasil. Quando as denúncias tinham esse teor próprio das montagens disseminadas nas redes sociais, Lula ria. As coisas ficaram menores e, paradoxalmente, mais graves, mais verossímeis, mais palpáveis e mais passíveis de demonstração. O boneco de Lula vestido de presidiário poderá evoluir para algo mais impressionante: Lula atrás das grades? Os adversários de Lula sonham com isso por várias razões: isso enterraria o PT; tiraria Lula da corrida eleitoral de 2018; colocaria a corrupção no DNA da esquerda, que, neste caso, seria vista como tal e não teria sua existência negada.

Inimigos ideológicos do petismo e do lulismo sonham em ver o operário semianalfabeto e sem um dedo na cadeia por ter conseguido chegar aonde não lhe deveria ser permitido. Nada disso, porém, invalida o ponto crucial: se Lula cair será pelos seus erros. Pelos seus crimes. Dificilmente se conseguirá inventar um delito para prendê-lo. Lula, o animal político, pode estar a caminho da jaula, onde encontrará velhos parceiros de utopias socialistas. A Operação Lava-Jato também pode ser chamada de Operação caça ao Lula. A Zelotes virou Operação Filho do Lula. O japonês da Federal poderá logo ter a sua foto mais famosa correndo mundo. Lula ou Lulla? Lula lá. Onde?

Precisa repetir? Lula patina, esfalfa-se, sufoca. A lama tenta puxá-lo para baixo. Lula teme virar um canal irrigado pelo Rio Doce depois da ruptura da barragem da Vale. A maior tragédia ecológica do país e a maior catástrofe política da esquerda convertida ao capitalismo de resultados das empreiteiras propineiras. É Lula lá? Ou a Operação Triplex será a Operação Triplo Mico?

Que venham as provas.

*    

O orçamento do Ministério da Educação pulou de R$ 29 bilhões para R$ 67 bilhões no reinado de Luiz Inácio. O Bolsa-família, política de primeiro mundo, existente, com outros nomes, nos países mais desenvolvidos e decentes do planeta, diminuiu desigualdades, distribuiu renda, deu de comer a muita gente, gerou empregos e acionou a economia em milhares de pequenas cidades. Só insensíveis, reacionários destemperados e sócios eternos do clube do ódio à esquerda continuam sem reconhecer os méritos das políticas sociais de Luiz Inácio. A extrema-esquerda tem outras razões. Se tivesse sido o que direita previa, teria imitado Hugo Chávez e falhado. Seria a glória para seus detratores. Ele soube frustrá-los. Exagerou nas alianças indigestas. Fechou os olhos para o caixa dois do mensalão.

(...)

O ponto frágil de Luiz Inácio continua sendo o seu filho Lulinha, que mora num apartamento pago pelo Grupo Gol, recebe cada vez mais investimentos da poderosa Oi na sua deficitária empresinha Gamecorp e não decola.

*

Quadrilha

 

      Era uma vez um país diferente, onde o diferente era igual, mas um igual diferente, uns sendo muito mais iguais que os outros. Nesse país abençoado por Deus e sempre perdoado pelos eleitores, Collor amava Brasília, que só dava para os poderosos. FHC amava as elites, que só o amavam por dinheiro. Lulla amava o proletariado e o PT, que só amava o poder e abusava das esperanças proletárias. Por isso, foram todos para Brasília dividir o mesmo amor. Collor tinha PC. FHC tinha CV. Lulla não tinha PC nem CV, mas era um mito e arrumou logo um Marcos Valério. Collor queria vender tudo. Mas não entregava nada. E cobrava comissão. FHC comprava votos e vendia estatais. Lulla compra deputados e vende ilusões. Estão todos absolvidos.

O primeiro nos chegou como quem chega do nada. Mostrou-nos o seu Cartier. Não parou de contar suas vantagens. Vasculhou nossas poupanças e raspou os nossos bolsos. Encontrou-nos tão desarmados que, assustados, votamos sim. Em pouco tempo, tudo nos tomou. Apavorados, dissemos não e demos-lhe um pé na bunda ainda que tardio. O segundo nos chegou como quem vem da universidade. Trouxe muitas teorias. Só faltava nos chamar de reis e de rainhas. Tinha tanta lábia que, duas vezes, dissemos sim. Mas não nos dava nada e resolvemos esquecer o que ele prometeu, fez e escreveu. O terceiro nos chegou como quem chega do bar, trouxe uma garrafa de aguardente que não deixa ninguém tragar. Instalou-se feito um posseiro no Planalto Central. É amigo do Chico Buarque e dos intelectuais. Se duvidar, ele nos chama de vadios. Mas jura que nos ama como um pai.

Collor e Lulla vão agora se encontrar em Brasília para dividir o quinhão. Em partes igualmente diferentes ou diferentemente iguais. FHC, como sempre, vive no seu pedestal. O primeiro é senador; o segundo, quase imperador; o terceiro acha que é príncipe. Mas não chega nem aos pés de Maquiavel quanto mais de um Borgia. Se bem que esse pessoal gostava de bandalheira... Era uma vez um país diferente, onde o diferente era igual, todos igualados pela enormidade das promessas, pelos recordes de corrupção e pela complacência dos eleitores. Mas diferenciados pelo valor das propinas, pelo preço dos votos e pelo tratamento na mídia. Era uma vez um país diferente, que adorava quadrilhas, festa junina e circo. Quem seriam os palhaços? Juro que não faço a menor ideia. Pago propina para saber.

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