Mudar nomes muda tudo

Mudar nomes muda tudo

Revolução pelas palavras

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      Tenho citado bastante Machado de Assis. Ainda direi Machado. Talvez alguns me achem menos odioso do que citando franceses. Machado de Assis dizia: “A velhice é uma invenção recente”. A minha é. Começou no dia em que o Inter contratou o MAR (Miguel Angél Ramirez). Entrei a fazer ressalvas ao seu modelo de jogo. Quanto mais argumentava, mais era chamado de velho. Carlos Guimarães, sempre tão inteligente e preciso, detectou um conflito de gerações em torno do MAR. Passei a prestar atenção. Todos os que o atacam têm mais de 50 anos. Nada se pode fazer contra a novidade. Ser chamado de velho é definitivo. Todo contra-argumento revela ainda mais a idade sem volta. Machado de Assis ensinou (preciso de tempo para tirar o Assis) que “os nomes velhos ou gastos tornam caducas as instituições”. É o que acontece com ataque no futebol. Não tem, segundo me informou um jovem, a precisão de último terço. Assim é a vida: um dia ficamos velhos.

      No meu caso, sei até a hora. Gosto de uma história sobre um discurso escrito pela assessoria para Tancredo Neves. Dizia: “Esforçar-nos-emos para realizar uma política mais inclusiva”. Tancredo leu: “Trabalharemos para que ninguém fique de fora”. Não era Jânio Quadros nem Michel Temer. Desprezava as virtudes da mesóclise. Perdeu para o inclusivo. Machado de Assis – o Assis cairá se a velhice não tiver pressa – brincava com a “vida nova” trazida pela mudança de “Colégio de Meninos” para “Externato de Instrução Primária” numa “tabuleta”, que viraria placa, palavra que hoje certamente só é usada por pessoas que ainda dizem centromédio. A última defesa do velho é o humor, a ironia, o riso. Não cola mais. Quando eu debatia futebol, achava que era engraçado com essas observações. Só era velho. Irritava os jovens, que toleravam as minhas mesóclises metafóricas.

      Machado – tento evitar a repetição – garantia que a mudança de nome é “meio caminho andado para a solução” de um problema. O Conselho Municipal, nome que havia substituído o desgastado Câmara Municipal, decidira atacar um problema grave trocando o nome dos comissários de higiene para inspetores sanitários. A cidade ficou parecendo mais limpa. Partidos políticos trocam de nome quando o programa envelhece. A ideologia fica a mesma. Normalmente nenhuma. A própria velhice tem trocado de nome, rejuvenescendo como melhoridade e terceira idade. A Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul aprovou a venda da Corsan, do Banrisul e da Procergs sem plebiscito. Antigamente, no tempo da mesóclise, chamava-se privatização de entreguismo. Adotou-se um apelido nos últimos tempos: passar a boiada. Tudo antigualhas. O nome que vende é projeto de futuro.

      Um quase sexagenário pode ter razão em alguma coisa? Com um nome novo talvez. Já consigo falar marcação alta, amplitude e minutagem. Só me falta rodar mais o pensamento. Cada época precisa de uma linguagem própria para melhor exprimir o eterno. Por isso admiro Tite, que chama ponteiros de extremos desequilibrantes. Proponho que se chame política de arte de fazer com que a maioria fique de fora. Opa! Ainda tropeço nas ideias.


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