Muito indício, pouca prova?

Muito indício, pouca prova?

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Começo de ano

 

      É a primeira vez que eu vejo um ano começar em janeiro. O primeiro turno da eleição presidencial será dia 24, em Porto Alegre, com o julgamento do ex-presidente Lula pelo TRF-4.

A propaganda ferve nas redes sociais.

Os partidários do petista multiplicam as estratégias de defesa.

Tem petista que absolveria mesmo com provas (pressupondo-se que existam).

Tem antipetista que condena mesmo sem provas (até agora duvidosas).

É conforme a ideologia do freguês.

A lei permite condenar por indícios? Significa admitir que não há provas.

Uns querem tirar do caminho o adversário mais competitivo nas eleições.

Outros querem apenas extravasar o velho anticomunismo.

A racionalidade é zero.

Já tem gente sustentando que condenador por convicção sincera é justo.

O argumento mais ardiloso é o de que certos crimes não deixam digitais e documentos.

Os adversários de Lula contam com cabos eleitorais de peso.

Ivanice Grosskopf, diretora de secretaria da 13a. Vara Federal de Curitiba, braço direito de Moro, milita nas redes sociais contra Lula. Uma assessora do gabinete do presidente do TRF-4 faz o mesmo. A auxiliar de Moro votou em Aécio e retuitou com alegria: “Ah, eu tô feliz, eu vim para a rua mudar o meu País. Aécio! Aécio! Aécio!”

A bandeira da assessora do TRF-4 é: “Lula, o Brasil inteiro exige sua prisão”. As pesquisas que dão Lula em primeiro lugar na corrida eleitoral desmentem até agora a retórica da militante antipetista. Há quem veja nisso falta de isenção. Otimistas garantem que é simplesmente liberdade de opinião e de expressão. O ano começou em janeiro. O horário eleitoral gratuito na televisão foi antecipado. Emissoras trabalham exaustivamente para promover o governo de Michel Temer à condição de antessala do paraíso. É um governo coerente. Depois de desmontar a CLT, nomeou para comandar o ministério do Trabalho uma senhora que jamais respeitou a legislação trabalhista.

Até uma agência internacional, que já pagou indenização por manipulação de dados, resolveu dar uma mão para Temer baixando a nota do Brasil para forçar a reforma da Previdência.

Jogadinha ensaiada com Henrique Meirelles.

Esse negócio de prova virou ficção.

Uma parte quer Lula absolvido por ideologia. A outra parte quer Lula condenado pela mesma razão. Houve tempo em que o ano começava em março e se falava em coerência. A pessoa que pedia a prisão de um suposto corrupto exigia também a do seu adversário pelas mesmas razões. Ainda não foram localizados posts dos que reclamam a prisão de Lula requerendo a prisão de Aécio. E vice-versa. Por que mesmo? Quem lê a sentença de Sérgio Moro condenando Lula fica com uma estranha sensação: tem muito indício. Isso é grave para a acusado. E pouco prova. Isso é terrível para a acusação. Qual é o papel da acusação: provar ou condenar? E do juiz?

É muito difícil separar Sérgio Moro de Deltan Dallagnol. Só que o primeiro é juiz e o segundo membro do Ministério Público. Isso é outra conversa. O ano começou em janeiro. No final do mês a Assembleia Legislativa gaúcha vai votar a adesão ao tal Plano de Recuperação Fiscal. O Estado poderá ser tutelado pelo Ministério da Fazenda. Henrique Meirelles, se não puder ser presidente do Brasil, será interventor no Rio Grande do Sul. Depois de tantas emoções em janeiro, primeiro mês de um ano atípico, seria preciso descansar em fevereiro. Mas Michel Temer quer votar a reforma da Previdência logo depois da quarta-feira de cinzas. Deve ser uma questão de simbolismo evidente.

Ao jornal francês “Le Monde”, Lula declarou: “A Polícia Federal mente, o procurador mente, e o juiz Moro transforma essas mentiras em processos judiciais. Faz três anos que a polícia investiga. E até agora não há nenhuma prova da minha culpa”. Segundo Lula, Moro virou refém da mídia e foi condenado a condená-lo. E o TRF-4 tem condições de deslindar tudo isso?

Mais de cem juristas sustentam que não há provas contra Lula no caso Triplex.

Serão todos ignorantes ou somente lulistas?

Juridicamente a questão é só controvérsia.

Política e ideologicamente é que ela tem clareza.

A isenção, no caso, seria um atributo da acusação e da direita?

Que janeiro! Nunca um ano começou tão cedo.

 

 

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