Na pele de Lázaro Ramos
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Lázaro Ramos sabe que é exceção.
Negro, vindo de família pobre, conseguiu se tornar um ator bem-sucedido. O percurso do combatente, porém, não foi curto. Ele examina os infinitos percursos do preconceito. Passa por elementos conhecidos, mas que persistem. Um exemplo: “O índice de negros na publicidade é muito pequeno. Se nós fôssemos refletir a realidade, como a população negra representa aproximadamente 54% da população total, na publicidade deveríamos ter então pelo menos 50% de negros. Eles não chegam a 15%”. Lázaro e sua mulher Taís Araújo fazem propaganda em horário nobre. O que isso significa? Que falar em preconceito é mimimi? Que quem luta vence?
Não. A maioria luta muito e não vence. A exclusão é estrutural. Entre as tentas histórias e referência citadas no livro uma, baseada numa declaração da escritora Conceição Evaristo, é marcante: “Devemos fazer uma leitura de que somos exceção. Quando nos prendemos muito a esse elogia da história pessoal (‘ela veio da favela e conseguiu’). Corremos o risco de dizer que o outro não conseguiu porque não quis, e isso não é verdade. A exceção simplesmente confirma a regra”. A prova disso é que nas novelas de televisão negros continuam fazendo majoritariamente papéis subalternos. O cinismo diz que é por realismo.
A introjeção do preconceito é perversa. Crianças negras submetidas a um teste para dizer qual boneca é mais bonita indicam a boneca branca, e qual é má, apontam a boneca negra. Quando perguntadas com qual boneca se parecem, fixam a negra. Nada é por acaso. O preconceito é uma construção histórica multissecular. Outro ponto do livro que me pegou é uma citação sobre os oito personagens típicos de negro na televisão: mãe preta, empregada doméstica espevitada, fiel amigo do jagunço, escravo, negra fogosa, malandro, negro perfeito (para branco admirar) e negro escada (para branco subir). Clássicos.
O relato de Lázaro Ramos tem leveza e tristeza. O vencedor faz o balanço das suas lutas. Conta das tantas vezes em que foi vítima de discriminação. Confessa que já ficou sem resposta diante da complexidade da questão abordada. Segui o ritmo da narração. Senti emoção. Colhi verdades. A luta continua. O Brasil vive um momento extremo de combate ao racismo, ao machismo e à homofobia. Vai longe. Basta pensar no caso William Waack, o jornalismo ídolo da direita pego em flagrante de racismo disparando um "isso é coisa de preto". A diferença é que a conta começa a chegar.