Novos e velhos tenentes

Novos e velhos tenentes

O messianismo dos procuradores da Lava Jato

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 O ministro Gilmar Mendes (STF) disse que se a Lava Jato estivesse no poder fecharia o Congresso Nacional. Os procuradores do Ministério Público são os novos tenentes? Nos anos 1920, o tenentismo tentou mudar o Brasil na marra. Jovens oficiais, os tenentes destacaram-se em 1922, em 1924, na Coluna Prestes e em 1930. Eles não aceitavam mais a corrupção e o coronelismo. Conhecedores do Brasil profundo, queriam modernizá-lo. Não sendo possível pelas vias legais, optaram pelas armas. A revolução de 1930 foi um golpe de Estado.

      Getúlio Vargas apropriou-se de uma parte do ideário tenentista. Se, nos anos 1920, os tenentes eram progressistas, nos 1960, quando alguns já eram generais, tornaram-se conservadores. A primeira leva de tenentes teve Eduardo Gomes, Juarez Távora, Siqueira Campos, o capitão Luís Carlos Prestes, o comandante Miguel Costa e o general Isidoro Dias Lopes. O tenentismo foi além das patentes e das ideologias. Em 1932, muitos tenentes já estavam contra Vargas na Revolução Constitucionalista de São Paulo. Como se costuma dizer, 32 + 32 = 64. Em 1945, os tenentes derrubaram Getúlio. A safra de tenentes deu os seus frutos. Castelo Branco, Ernesto Geisel e Emílio Médici foram tenentes. Seriam os procuradores de hoje os tenentes de ontem?

      O tenentismo queria acabar com a fraude eleitoral e arrancar o Brasil do subdesenvolvimento. O sistema vigente parecia-lhes o grande obstáculo para o país alcançar o seu futuro radioso. O tenentismo de esquerda não via possibilidade de avançar sem resolver o terrível problema da desigualdade social. O tenentismo de direita passou a sustentar que o progresso só viria com ordem, uma nova ordem militar, positivista e desenvolvimentista: modernização conservadora. Os episódios históricos colocaram tenentes contra tenentes. Na primeira vitória, com Vargas, o tenentismo culminou na ditadura do Estado Novo. Na segunda, criou a própria ditadura, aquela um quarto de século.

      Entre o tenentismo e o lava-jatismo há um ponto em comum: a insatisfação com a lentidão dos mecanismos democráticos. Sem contar a representação messiânica, a ideia de cada um de estar imbuído de missão civilizatória e salvadora do país capaz de justificar liberdades em relação aos procedimentos formais do funcionamento do Estado. As armas do lava-jatismo são modernas: ferramentas jurídicas. O batismo de sangue do tenentismo foi o episódio dos 18 do Forte de Copacabana, em 1922. De lá para cá muita luta passou pelas areias das praias brasileiras, mas o fundamental não foi resolvido: o descompasso entre os interesses das elites e as necessidades da grande massa.

      A classe média adotou o tenentismo ao longo do tempo, especialmente quando ele se graduou. A partir de 1945, com o ressurgimento dos partidos políticos, um ex-tenente, o brigadeiro Eduardo Gomes tornou-se o ícone da União Democrática Nacional (UDN). Analogias históricas são como uma lente de aumento. Podem ajudar a ver melhor ou a distorcer o objeto. Um ponto cola na lente: a constante vontade de setores da sociedade de ir mais rápido do que a democracia.

 

 


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