O que seria do mundo sem professores?

O que seria do mundo sem professores?

Homenagem aos mestres que nos educam

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      No dia das crianças, precisei dizer por obrigação moral comigo mesmo: há meninos e meninas que passam fome no Brasil. Neste dia dos professores, pelas mesmas razões, sou obrigado a escrever: o magistério, especialmente do ensino fundamental e médio, ainda mais nas redes públicas, não recebe a valorização que merece. Cada profissão se acha a mais importante com alguma ou muita razão. Como imaginar um mundo sem médicos? Como viver numa sociedade sem juízes? Como sobreviver numa cidade sem coletores de lixo? Como existir sem agricultores, sem açougueiros, sem padeiros, sem enfermeiros?

      Ainda assim, entendo que o professor está na base de tudo. Não há médico sem mestre. O professor precisa ter muitos atributos e habilidades: conhecer a matéria que leciona; saber comunicar; ter valores morais e éticos sólidos; ser justo; saber reconhecer e valorizar a diversidade e o pluralismo; ensinar a tolerância; manter o equilíbrio; mostrar a importância da racionalidade e da ciência sem menosprezar crenças e religiões; não colocar suas convicções ideológicas acima dos conhecimentos cientificamente comprovados; mostrar os diferentes pontos de vista sobre um assunto; valorizar o diálogo; saber ouvir; ajudar a iluminar o passado, compreender o presente e abrir caminho para o futuro; ensinar civilidade, respeito à dignidade humana, à natureza, como nossa casa, e altruísmo.

      Essa lista pode ser facilmente aumentada. É muita coisa para, em geral, pouco salário e condições precárias de trabalho. Professor acaba atuando, para além das suas atribuições específicas, como pai, mãe, psicólogo, enfermeiro, consultor, conselheiro, terapeuta, etc. A volta às aulas presenciais em tempos de pandemia faz pensar nas dificuldades que serão encontradas: espaços limitados, número de alunos, questões disciplinares, afetivas, comportamentais, insegurança. Vida de professor é difícil. Muito difícil. Dele se espera muito, a ele se entrega pouco. Sei que me repito. Já falei disso tantas vezes. Como ser professor nestes tempos extremos em que o real foi substituído pelas fake news (o falso atrai seis vezes mais do que o verdadeiro) e o presencial cedeu o seu lugar ao virtual?

      Na “sociedade do espetáculo, conforme a expressão cunhada por Guy Débord, o entretenimento vale mais do que a cultura; o divertimento leve, mais do que a educação; a tecnologia, mais do que o humano; o irrelevante feito por poucos, mais do que o fundamental realizado por muitos; a vida, menos do que mercadoria. Como dizia um filósofo, “um par de botas vale um Shakespeare”. Como será o professor do futuro? O que poderá dizer? Será substituído por algoritmos? Viverá como um vestígio de uma época revoluta baseada no iluminismo e na ciência? Será controlado pelo “capitalismo de vigilância” para não se tornar comunista por desencanto ou anarquista por desespero? Gozará de autonomia de cátedra ou apenas entregará ao cliente o produto contratado sob pena de reclamação no setor pedagógico do Procon? Minha homenagem a esses mestres heroicos que atuam nas brumas do dia a dia.


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