Os dez maiores erros de Sérgio Moro

Os dez maiores erros de Sérgio Moro

De juiz a ministro, uma ascensão polêmica

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            Seria Sérgio Moro um herói de faroeste? Um Django: atira primeiro, pergunta o nome depois, tudo em nome da ordem no Velho Oeste dominado por quadrilhas dispostas a tudo? Seriam os métodos de Moro os únicos capazes de restabelecer a ordem com um desvio da lei? Seria Moro a encarnação do consequencialismo: os fins justificam os meios? Um consequencialismo do bem para os autointitulados homens de bem? Ou seria Moro um oportunista em busca de poder, um franco-atirador sedento de glória blindado pelo consequencialismo ideológico dos homens de bens e a serviço do mercado, dos banqueiros, dos ricos?

 

            Quantos erros (seriam ilegalidades, crimes?) cometeu Moro:

1)     Conduziu coercitivamente um ex-presidente da República que não havia sido convocado a depor nem se havia recusado a comparecer.

2)     Vazou grampo ilegal de conversa entre dois presidentes da República. Grampear presidente é legal? Autoridade fazer vazamento é legal? Moro admitiu e pediu desculpas ao STF.

3)     O vazamento de Moro foi combinado com o Ministério Público como se vê nas conversas divulgadas pelo site The Intercept:

Dallagnol – 12:44:28. – A decisão de abrir está mantida mesmo com a nomeacao, confirma?
Moro – 12:58:07. – Qual é a posicao do mpf?
Dallagnol – 15:27:33. – Abrir
            Combinada a estratégia, Moro discute o resultado com o parceiro:
Dallagnol – 21:45:29. – A liberação dos grampos foi um ato de defesa. Analisar coisas com hindsight privilege é fácil, mas ainda assim não entendo que tivéssemos outra opção, sob pena de abrir margem para ataques que estavam sendo tentados de todo jeito…

Moro – 22:10:55. – nao me arrependo do levantamento do sigilo. Era melhor decisão. Mas a reação está ruim.

4)     Moro, juiz de primeira instância, interferiu, mesmo em férias, na decisão de um desembargador, segunda instância, para impedir a libertação do ex-presidente Lula por Habeas Corpus. É normal que isso aconteça? É legal? É constitucional? É correto?

5)     Moro vazou para a imprensa conteúdo de uma delação requentada, sem qualquer fato novo, uma semana antes do segundo turno da eleição presidencial. Ajudou a influenciar o resultado. Em seguida, sem transição, aceitou ser ministro da Justiça do presidente eleito. Essa sequência é normal e saudável?

6)     Moro considerava o conteúdo das coisas mais importante do que a forma de obtenção de informações. O Estado obter provas por meios ilícitos é correto? Agora, Moro mudou de opinião. No caso Intercept, só se interessa pelo modo de obtenção das conversas.

7)     Moro indicou testemunha para a acusação em conversa por aplicativo: “Fonte me informou que a pessoa do contato estaria incomodado por ter sido a ela solicitada a lavratura de minutas de escrituras para transferências de propriedade de um dos filhos do ex Presidente. Aparentemente a pessoa estaria disposta a prestar a informação. Estou entao repassando. A fonte é seria”.

O Ministério Público conferiu:

“Liguei e ele arriou. Disse que não tem nada a falar etc… quando dei uma pressionada, desligou na minha cara… Estou pensando em fazer uma intimação oficial até, com base em notícia apócrifa”.

8)     Moro sugeriu estratégias à acusação: inverter ordem de operações; lançar nota contra “showzinho da defesa”; ficar só com 30% dos alvos para não criar inimigos demais; não investigar FHC, embora essa ideia do Ministério Público fosse só para simular imparcialidade, de modo a não “melindrar” apoio necessário.

Moro – 09:07:39 – Tem alguma coisa mesmo seria do FHC? O que vi na TV pareceu muito fraco?
Moro – 09:08:18 – Caixa 2 de 96?
Dallagnol – 10:50:42 – Em pp sim, o que tem é mto fraco
Moro – 11:35:19 – Não estaria mais do que prescrito?
Dallagnol – 13:26:42 – Foi enviado pra SP sem se analisar prescrição
Dallagnol – 13:27:27 – Suponho que de propósito. Talvez para passar recado de imparcialidade
Moro – 13:52:51 – Ah, não sei. Acho questionável pois melindra alguém cujo apoio é importante

9)     Moro queria “limpar o Congresso” junto com a Lava Jato.

10)    Moro via-se com parte da Lava Jato, parceiro do Ministério Público, parte da acusação: “Fiz uma manifestação oficial. Parabéns a todos nós” (...) Ainda desconfio muito de nossa capacidade institucional de limpar o congresso. O melhor seria o congresso se autolimpar mas isso não está no horizonte. E não sei se o STF tem força suficiente para processar e condenar tantos e tão poderosos”.

Se tudo isso é pouco para quem deseja blindar o seu herói abalado, comecemos de novo. Partamos da regra do jogo.

Inciso IV do artigo 254 do Código de Processo Penal: “O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes [...] se tiver aconselhado qualquer das partes”.

 

Código de Ética da Magistratura, artigo 8º: “O magistrado imparcial é aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo ao longo de todo o processo uma distância equivalente das partes, e evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito”.

            Agora, apliquemos a regra do jogo a uma conversa de Moro:

Mensagem de Moro a Dallagnol: “Prezado, a colega Laura Tessler de vcs é excelente profissional, mas para inquirição em audiência, ela não vai muito bem. Desculpe dizer isso, mas com discrição, tente dar uns conselhos a ela, para o próprio bem dela. Um treinamento faria bem. Favor manter reservada essa mensagem”.

 

  Deltan Dallagnol: Não comenta com ninguém e me assegura que teu telegrama não está aberto aí no computador, e que outras pessoas não estão vendo por aí que falo. Você vai entender porque estou pedindo isso

  Carlos Fernando: Ele está só pra mim, depois apagamos o conteúdo

  Deltan Dallagnol: (reproduzindo a mensagem do moro) – Prezado, a colega Laura Tessler de vcs é excelente profissional, mas para inquirição em audiência, ela não vai muito bem. Desculpe dizer isso, mas com discrição, tente dar uns conselhos a ela, para o próprio bem dela. Um treinamento faria bem. Favor manter reservada essa mensagem.

  Carlos Fernando: Vou apagar, ok?

  Deltan Dallagnol: Apaga sim

  Carlos Fernando: Apagado

  Deltan Dallagnol: vamos ver como está a escala e talvez sugerir que vão dois e fazer uma reunião sobre estratégia de inquirição sem mencionar ela

  Carlos Fernando: Por isso tinha sugerido que Júlio ou Robinho fossem também. No do Lula não podemos deixar acontecer

  Carlos Fernando: Apaguei

 

A procuradora foi afastada da inquirição de Lula.

Moro escondeu isso no Senado.

Dez perguntas sobre essa troca de mensagens:

1)     É normal que juiz dê recomendações à acusação?

2)     Essa mensagem de Moro não caracteriza um aconselhamento?

3)     Por que o juiz queria um melhor desempenho da acusação?

4)     O juiz dava aconselhamentos desse quilate à defesa?

5)     Essa preocupação não favorecia uma das partes?

6)     Por que os procuradores, sendo normal esse tipo de sugestão, queriam tanto apagar a conversa o mais rápido possível?

7)     Essa mensagem não é a prova da parcialidade de Moro?

8)     Essa não prova conluio entre juiz e acusação?

9)     Se fosse com a defesa essa intimidade seria considerada normal?

10)    Numa democracia consolidada essa relação seria admitida?

 

Depois de ler este texto, veja o documentário Democracia em vertigem. E tire as próprias conclusões. No Velho Oeste, o pistoleiro solitário, quando era ético, limpava a cidade e partia. Outros tempos.


 

 

 

 

 


 

 

 

 


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