Paulo Maluf vai julgar Dilma

Paulo Maluf vai julgar Dilma

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Como é possível duas coisas opostas serem verdadeiras ao mesmo tempo?

O governo cometeu irregularidades graves, que justificam um pedido de impeachment, e há, simultaneamente, como um paradoxo gritante, uma tentativa de golpe em marcha.

Poucas pessoas querem complexidade e ponderação neste momento. Há um desejo radical de simplificação. Quem estuda história, vê 1954 e 1964 por toda parte. Os manifestos de entidades empresariais pedindo a renúncia de Dilma repetem melancolicamente um passado nefasto.

Lula, Dilma e o PT caíram numa armadilha que ajudaram a montar. Mentiram na campanha. Prometeram um paraíso que não poderia ser entregue. Mas isso todo mundo faz. Arranjaram financiamentos de campanha ilegais. É uma prática que não deixa quase ninguém de fora. Mas o fato de que os outros cometem o mesmo crime não absolve quem está sendo investigado. A diferença é que agora mídia, PF, MP e justiça decidiram usar todos os meios para produzir condenações.

As escutas telefônicas de Sérgio Moro pisotearam o Estado de Direito. O grampo feito depois do próprio Moro ter mandado parar a arapongagem, e a sua divulgação, envolvendo a presidente da República, sem autorização do STF, é um caso de escola de atropelo das regras vigentes. Moro virou militante político.

O jurista Sérgio Salomão Schecaira, que no ano passado convidou Moro para um evento em São Paulo, onde Moro levou uma surra intelectual do gaúcho Lênio Streck, sustenta que o juiz, depois do episódio do grampo, deveria estar preso. Por que não dividindo uma cela com Lula em Curitiba? Editorial da Folha de S. Paulo detona o chefe da Lava Jato que, como juiz, só deveria julgar, mas, nas manifestações do último domingo, declarou-se tocado pelo apoio da população às investigações. Saiu do armário.

Lula tem sido cercado por militantes políticos encastelados na PF, no MP, como Cássio Conserino, no judiciário, como o juiz Catta Pretta, no STF, como o tucano Gilmar Mendes, e na mídia. Os chamados petistas do STF, como Tóffoli, têm votado contra o governo. Facchin, por exemplo, no seu relatório do rito do impeachment, posicionou-se inicialmente em favor das pretensões de Eduardo Cunha.

Gilmar Mendes ainda irá ao STF com um cartaz: Fora Dilma!

Lula foi encurralado com denúncias sem provas. Acuado, explodiu. Disparou telefonemas pedindo proteção e detonando todo mundo. Com medo da prisão, aceitou ser nomeado ministro. Dilma e ele acabaram, sob pressão, produzindo a prova que seus opositores tanto buscavam na falta de outra melhor: obstrução de justiça. O crime de responsabilidade agora parece mais robusto.

A justiça, que pouco fez até hoje para pegar Paulo Maluf, julgado e condenado na França, está mais rápida agora. Maluf, símbolo da corrupção no Brasil, "julgará" Dilma. Integra a comissão do impeachment na Câmara. Assim como 25% de deputados investigados pelo STF. Inclusive gaúchos citados na Lava Jato. Cadê as ações pedindo o afastamento desses parlamentares comprometidos?

Gilmar Mendes vai julgar ações contra Lula? Ele não deveria se declarar impedido? Ou levar tudo para o plenário do STF? As instituições brasileiras estão mergulhadas na luta ideológica sem quartel.

Dilma errou ao tentar esconder Lula num ministério. Lula errou ao aceitar mimos de empreiteiras. Sérgio Moro errou ao divulgar gravações feitas de maneira irregular, depois de canceladas por ele mesmo. A justiça erra ao virar partidária. O impeachment vira golpe quando se aceitam todos os meios para atingir os fins considerando firula o respeito às regras do Estado de Direito. Claro que falar disso produz automaticamente a simplificação do momento: defendendo essa corja, hein!?

Pedir impeachment no momento é justo e legítimo. Nenhum deputado investigado poderia participar de qualquer comissão do processo. Juízes com posições políticas assumidas publicamente devem ser declarado impedidos de julgar ações referentes ao caso. Paulo Maluf como juiz torna tudo uma farsa.

Dito isso, o impeachment é quase tão certo como mais uma vitória do Barcelona contra o Getafe.

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