Pelé, o gênio intemporal

Pelé, o gênio intemporal

Rei do futebol faz 80 anos e mundo o reverencia

publicidade

 

      O cara fez tanto, tanto: 1281 gols, etc. E agora faz 80 anos. Hoje. Parece que foi ontem que eu ouvia a narração dos seus gols na Copa do México, em 1970. Eu tinha oito anos de idade. Quase não se esquece o vivido tão cedo. Difícil é lembrar o que se fez ontem. Pelé faz parte da história do Brasil. Pelé o Brasil. Que time: Aleijadinho, Machado de Assis e Pelé. Para vencer na vida é preciso, às vezes, atravessar os “llanos” (planícies) no inverno ou vencer “páramos” (altitudes desertas) gelados. Aprendi isso vendo a série “Bolívar”, da Netflix. Pelé superou todos os desafios. Fez bem mais do que todos.

      Meu professor de português na adolescência dizia que tudo é relativo, até mesmo essa afirmação categórica sobre o ponderado relativismo. Penso nele quando leio textos com a grafia do século XIX, aos quais ele recorria para provar a sua tese. Machado de Assis escrevia “comquanto” e “comtudo”. Na época, “m” não era só antes de “p” e “b”. Sagrada regra dos mistérios da gramática. Tinha lógica nessa fusão de “com” e “tudo”.  Tudo, portanto, é relativo, até “m” antes de “p” e “b”. Tudo, não. Pelé não é relativo. Pelé é absoluto. Falar de Pelé exige pegada. Para se comparar a ele o jogador precisa chutar bem com os dois pés, ser bom cabeceador, saber driblar e lançar, ter visão de jogo e habilidade em espaço curto, ser ótimo no passe e na conclusão, acumular títulos importantes e deixar marcas históricas.

      “Llano” no inverno e “páramo”. Os fortes não hesitam. “Comtudo”, que a gramática é relativa, alguns insistem em destronar o rei em nome da modernidade, essa antiga fantasia já meio desbotada. Maradona foi o que chegou mais perto. E ficou longe. O futebol de Maradona tem o tamanho da Argentina. O de Pelé, o do Brasil. Messi não preenche todos os requisitos. A cabeça só usa para pensar. Claro, é muito. Somente Pelé fazia a bola se aninhar aos seus pés em pose de agradecimento pelos bons tratos recebidos. Ele não “batia” na bola. Nem a tratava a “pontapés”. Era outra coisa que só a bola poderia explicar. Melhor, confessar. Pelé é o verdadeiro mito. A mitologia cobre o real com uma camada de hiper-realidade indestrutível. Se eu chegar ao 80, já terei feito algo como Pelé. Tem muito “llano” e “páramo” pela frente até lá.

      Pelé merece chegar aos 100. Seria, em anos, como os mil em gols. Tenho a impressão de que a bola se apaixonou por Pelé e nunca o traiu. Amor à primeira vista. Paixão para a vida toda. Acho que ela considerou a possibilidade de se entregar a outros, como Maradona e Cruyff, mas, na marca do pênalti, permaneceu fiel ao seu grande amor. Essa relação entre Pelé e a bola é comovente. Pelé foi tri. Mas duvido que ele e a bolsa tenham feito algum “trisal”. Era monogamia romântica mesmo. Se tivesse de acontecer, presumo, seria com Garrincha. Aí balançou. Se um pudesse fazer uma biografia, seria de Lupicínio. Uma ode: está aqui. Canto Pelé e a suas glórias, suas armas e suas histórias, seus gols e até os que ele perdeu. Até quando errava, ele podia fazer obra de arte.

 


Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895