Temer e o final de semana na prisão

Temer e o final de semana na prisão

Ex-presidente permanece preso no Rio de Janeiro

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Michel Temer e Moreira Franco já não são mais virgens. Mesmo que fiquem pouco tempo na cadeia, acusados de corrupção, nunca mais apagarão dos currículos, ou das folhas corridas, essa experiência antropológica. Quando apareceu a mala de dinheiro daquele protegido de Temer e quando o presidente foi gravado por Joesley Batista, eu e a torcida do Flamengo refletimos: se um dia ele vier a ser preso e condenado, vamos todos olhar para trás e pensar estarrecidos: como foi possível manter um suspeito de tantas irregularidades pesadas no comando do país por dois anos? A resposta da base caninamente fiel de Michel Temer era: é melhor para estabilidade do país.

      Cheguei a pintar esta imagem: a pessoa, em viagem, recebe um telefonema avisando que tem um invasor dentro da sua casa. Pode ser um ladrão. Em vez de pedir providências, ela pondera: deixa quieto para a casa não ficar abandonada. Estranho critério. Era melhor manter um presidente suspeito de desonestidade do que trocá-lo para evitar um segundo impeachment. A senadora Kátia Abreu e o ex-senador Roberto Requião, em entrevista à Rádio Guaíba, sugeriram que a decisão de manter Michel Temer nada teve a ver com a estabilidade do país, mas com os interesses do seu grupo de rapina. O juiz Marcelo Bretas, que decretou as prisões, apontou Temer como líder de quadrilha. Ontem, o homem era presidente, com apoio do chamado mercado e das pessoas que se acham sensatas e responsáveis pelos destinos do país Dois políticos gaúchos disseram, no Esfera Pública, que botariam as suas mãos no fogo por Temer. Estarão com a pele chamuscada?

Não ouvi ainda a voz de um deles. Estará com queimaduras graves?

      Aécio Neves contou com a cumplicidade do Senado para escapar ao primeiro assalto da justiça. Depois, astutamente, deu um passo atrás para se esconder na Câmara dos Deputados. Michel Temer e seu ministério ficaram sem proteção. Tornaram-se alvos fáceis no meio do tiroteio entre o STF e a Lava Jato. Nessa guerra, reconhecida até pelo ministro Marco Aurélio Mello, não há bala perdida. Tudo é calculado. Na noite anterior às prisões, Rodrigo Maia, genro de Moreira Franco, disparou contra Sérgio Moro, depois de ter sido alvejado pelo ministro, que revidou em áudio nas redes sociais e assinou com slogan para campanha de 2022. Será que os críticos de Gilmar Mendes, atacado por soltar todo mundo, pedirão a ele que liberte rapidamente o destemido Michel?

      Outra hipótese indica que cumprida uma missão, rotulada livremente de trabalho sujo, todo mundo se torna descartável e passível de prisão. Seria o caso de Temer. Agravante: ele não entregou a reforma da Previdência que se tenta agora impingir ao país para glória dos banqueiros. Temer evoluiu de vice-presidente decorativo a conspirador emotivo, tendo enviado chorosa carta à Dilma Rousseff. Culminou como o presidente mais impopular da história do país. Num momento de vaidade e delírio, pensou em concorrer à reeleição. Desistiu rapidamente. Considerou que o anonimato lhe seria mais útil e seguro. Não contava que isso não o protegeria contra alguma ordem de prisão. Procuradores da Lava Jato foram mais generosos na descrição do personagem Michel Temer: “chefe de quadrilha há 40 anos”. Uma vida dedicada ao crime ao lado do seu capanga, o silencioso coronel Lima. Resta-lhe racionalizar que não está sozinho, que Lula também está preso.

A prisão de Temer por acusações que parecem tão sólidas quanto a base que sustenta o Corcovado alegra quem gosta de honestidade. Isso não impede de dizer, sem querer defender alguém que certamente merecerá uns bons 30 anos de cadeia, que a fundamentação da prisão preventiva feita por Bretas é uma peça de ficção. O juiz inventou um quinto motivo, não previsto na regra do jogo, para enjaular Temer e Moreira Franco. Quem iria lamentar? A massa urra de alegria.

Só nunca bateu panelas pela prisão daquele que então era útil.


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