Terraplanismo sanitário

Terraplanismo sanitário

Como entender quem rejeita máscara?

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      Há muitas coisas que não entendo. Faz parte da vida. Nunca entendi a linguagem de alguns escritores consagrados. Não direi quais para evitar que amigos se choquem. Não entendo a paixão dos neotáticos pelos novos conceitos do futebol. Dizem que há muita informação para os jogadores assimilarem: ficar mais aproximados, trocar passes curtos, evitar dribles ousados, sair com a bola no chão desde o goleiro. Dá um sono. Até que um jogador se cansa, entorta alguém, ignora o adestramento e resolve o jogo. Por que me estendo sobre isso? Nunca se deve contrariar o que é chamado de moderno. Provoca inimizades, rancores e ganha-se a pecha de anacrônico e conservador.

      Não consigo entender três coisas sérias: não querer usar máscara para se proteger do coronavírus, achar que a Terra é plana e pregar contra vacinas. Normalmente vem tudo no mesmo pacote. Só falta ser contra antibióticos. Nos romances do século XIX os personagens têm uma febre e morrem. Qualquer infecção era praticamente uma condenação à morte. Se os antibióticos já existissem muito ficcionista teria sido obrigado a buscar soluções mais consistentes para as suas tramas. Em muitos contos, até de Machado de Assis, o cara que está atrapalhando um amor incontrolável tem uma febre repentina, cai de cama e não volta. Caso resolvido. Vírus e bactérias são nossos inimigos mortais.

      Sem vacinas e sem antibióticos, babaus! Eu faria reverência a uma caixa de antibióticos. Tive uma prostatite recentemente. O meu PSA, que deve andar por 3.5, foi a 60. Sem antibióticos eu talvez não tivesse visto o belo gol do Edenilson contra o Caxias. Nem os testes do simpático e quase ingênuo treinador Miguel Angel Ramirez. Tomara que os seus conceitos rendam títulos ao Inter. Fomos educados no prazer de ganhar. O Brasil vai ter vacinas nacionais. A Butanvac vem aí. O governador João Dória não precisava ter mentido ou sugerido que a descoberta era inteiramente brasileira. O simples fato de a patente ter sido cedida ao Butantã por um instituto norte-americano faz toda a diferença. Teremos autonomia de ponta a ponta. Fabricaremos o tal IFA.

      Nada como a concorrência para animar o pessoal. Foi Dória falar da Butanvac para que o governo federal anunciasse outras três vacinas brasileiras. Enquanto isso Joe Dorminhoco, como o esquecido já foi tarde e tomara que não volte Donald Trump chamava Biden, que prometeu fazer o país vacinar cem milhões de pessoas em cem dias de governo, não cumpriu a promessa. Atingiu a meta na metade do tempo. Em consequência, vacinará mais cem milhões no tempo especificado. Não dá para suportar político que promete algo improvável e entrega o dobro.

      Aí a pessoa não quer tomar vacina, não quer usar máscara e quer tudo aberto. O que explica um ser assim? O fato de achar que a Terra é plana. O que mais poderia ser? Por que ninguém cai da Terra se andar sempre em frente até o final do terrenão? Porque tem uma cerca. Parece que é uma cerca elétrica especial que afasta quem se aproxima. Toma-se um choque a distância e recua-se 1800 casas num banco imobiliário. Os vírus e as bactérias tiram sarro. É de gente assim que precisam.


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