Um país à parte

Um país à parte

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"Vivi no meu país, um território menor que o Vaticano, bem menos canalha também. Um país de 55 metros quadrados de área construída, cujas paredes eram opacas e do tempo dos tijolos duplos. Um país honesto onde só eu, o monarca em terreno de napa, sofria prejuízo. Pois deixei aquele país onde fui governo e onde fui povo, onde fui história e geografia, e onde fui o único escritor, e onde fiz voltas e voltas entre o piso do banheiro e a porta do quarto pensando que era situação e logo logo oposição e que onde quer que eu estivesse sempre teria o apoio dos Estados Unidos. Pois deixei aquele país todo renúncia e retornei à terra chamada Brasil como asilado."

Trecho de Terra Avulsa, de Altair Martins

Por Luiz Gonzaga Lopes

Com o romance de um homem que renuncia ao mundo após o trauma de um assalto e cria um país à parte, em seuapartamento, Altair Martins volta a reinventar a sua escrita e a transitar pelo terreno movediço e lisérgico do romanesco. Neste romance, Terra Avulsa (Grupo Editorial Record), o autor alia prosa, poesia e fotografia para engendrar a história de um homem, Pedro Vicente, que funda um país dentro de seu apartamento. Em choque com a brutalidade do mundo, ele vive em casa, criando estados em cada peça da morada, traduzindo (ou inventando) poemas de um poeta nicaraguense, Javier Lucerna, poemas sobre objetos cotidianos, que são casados como fotos trazidas por sua editora Eudora. A sua editora e estes objetos, como um mancebo de madeira, um bambu ou uma simples escova de dentes são os elos que ligam este exilado urbano ao pulsar de uma vida à parte e à poesia, confessamente o seu segredo de concha.

O livro será lançado nesta sexta-feira, 4 de abril, às 19h, na Palavraria Livros & Café (Vasco da Gama, 165), em Porto Alegre.

Altair Martins recebeu o Prêmio Moacyr Scliar de Literatura pelo livro Enquanto água e o Prêmio São Paulo de primeiro romance por A parede no escuro. Ganhou ainda o Prêmio Guimarães Rosa da Rádio France Internationale, o Prêmio Luiz Vilela, o Concurso Nacional de Contos Josué Guimarães e o Prêmio Açorianos na categoria conto, além de ter sido finalista na categoria crônicas de 2003 do Prêmio Jabuti. Segundo Luiz Rufatto: “Altair Martins vem construindo uma sólida carreira literária, desde que estreou, em 1999, com a coletânea de contos Como se moesse ferro. Ali, já estavam presentes os eixos básicos de suas preocupações como escritor: um apuro formal incomum entre os de sua geração e uma temática centrada na reflexão sobre os impasses do ser humano.Estas inquietações, que perpassam ainda todos os outros três livros de contos e o excelente romance A parede no escuro, ressurgem radicalizadas neste Terra Avulsa. A linguagem, marca que diferencia e singulariza Altair Martins, aqui assume-se em perfeito equilíbrio entre prosa e poesia, não só como expediente de construção estética, mas também como questionamento do próprio gênero narrativo".

Altair Martins nasceu em Porto Alegre, em 1975. É doutor em Letras pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Ministrou a disciplina de Conto no Curso Superior de Formação de Escritores da Unisinos. Foi vencedor do Prêmio Guimarães Rosa, da Radio France Internationale, por duas vezes (1994 e 1999). Ganhou também o Açorianos (2000, 2009 e 2012), o Josué Guimarães (2001), o Luiz Vilela (2000), entre outros. Em 2009 ganhou o Prêmio São Paulo de Literatura com o romance A parede no escuro e, em 2013, o Moacyr Scliar com Enquanto água. Tem textos publicados em Portugal, Itália, França, Argentina e Espanha.

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