Entre a democracia e a bagunça

Entre a democracia e a bagunça

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Todo pleito coletivo é legítimo. Desde que seja um pleito coletivo. Parece óbvio, mas a recente mobilização que parou parte do país no últimos dias mostrou que não há obviedades. O que era pra ser lógico, perde o sentido com uma facilidade surpreendente. Quando caminhoneiros param pela indignação justa em relação ao aumento abusivo e inexplicável do óleo diesel, ou por outros pontos da política do transporte em território nacional, o povo entende o recado e adere a causa. Em seguida a paralisação se torna um brado contra as más condutas políticas que já cansamos de assistir ao nosso redor, contra a corrupção e a riqueza desviada inescrupulosamente. Pontos que nos tornam um país rico cheio de miseráveis, na mais clássica e brutal desigualdade. Tudo tem limite e um dia o povo cansa de pagar a conta e se revolta. Pois justo neste segundo momento, que poderia ser histórico e bonito, o próprio brasileiro mostrou a sua pior faceta.

Começou com o preço abusivo e sem qualquer justificativa dos combustíveis e alimentos que acabavam. Mercadorias que já haviam sido transportadas e entregues, portanto com custo já calculado no preço. Puro aproveitamento imoral da situação. Como aves de rapina, esses aproveitaram a paralisação geral para extorquir, de forma covarde, seus iguais. Empresários ameaçaram empregados movidos por interesses próprios, não de um coletivo. Todos tão desonestos quanto os que eram acusados nas manifestações. Povo contra povo, de novo. No paralelo, discursos políticos apropriados para este ano eleitoral, clamando por situações sem ao menos se dar ao trabalho de saber o que estavam falando. Uma pena. Más conduções e oportunismo jogam no lixo chances ótimas para a nossa gente iniciar um novo olhar sobre si mesma, com mais dignidade e força, deixando de lado o complexo de vira-latas e a idolatria à ignorância e ao coitadismo como piada, moda e orgulho. Mas pedir uma revolta cultural e educacional é demais.

O pior veio quando a violência virou febre, ignorando preceitos legais básicos. “Patrulhas” de manifestantes abordando carros, retirando famílias inteiras de veículos à força, ameaçando cidadãos, constrangendo, apedrejando, espancando colegas que desejavam prosseguir ou retomar sua rotina de trabalho, matando. Sim, um caminhoneiro legítimo, trabalhador e cidadão brasileiro, pai de três filhos, foi assassinado a pedradas por “colegas” em manifesto. Não há o que justifique isso. Porém, lá estavam as forças de segurança, mais uma vez, agindo para garantir abastecimentos básicos e o direito de ir e vir do povo, sem medo, na defesa da democracia. Nosso maior patrimônio. Lamentável que a falta de conhecimento ou competência para lidar com ela transforme pleitos legítimos em bagunça. E com uma facilidade apavorante.

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