O papagaio e o pirata

O papagaio e o pirata

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Nunca consegui descobrir porque a ficção, de repente, passou a associar papagaios à figura dos piratas. A ponto da expressão “papagaio de pirata” se tornar o símbolo daquele punhado de cabeças que se digladiam, desesperadas, para aparecer na foto penduradas nos ombros de, principalmente, autoridades com poder de nomeação de cargos e assemelhados. Mas eu sei como começou a pirataria no mundo. E as papagaiadas. Aliás, trapalhadas e guerra inúteis, que compõem a estupidez da nossa estimada racionalidade humana, ocorrem desde que o mundo é mundo. Verdade. Mas verdade também é que nós, brasileiros, estamos nos tornando um referencial planetário e histórico das bizarrices. Há até quem já cogite mudar o nome de Brasil para República Semidemocrática da Bizarréia. Não duvidem. Se é inútil, ou absurdo, pode virar lei cá neste país.

O malfeitor conhecido como Papagaio foi preso outra vez. Quantas, já? Cinco? Seis? Mais ainda? Conheço um ladrãozinho, desses que atormentam a paz da vizinhança furtando até galocha de operário, que já foi preso mais de cinquenta vezes. Mas ele só rouba pra fumar pedra e isso não é nada, diz a lei. Pequeno potencial ofensivo. Azar de quem trabalha e compra as coisas que ele vai roubar. Não podemos é lotar os presídios! Tá, mas e o Senhor Papagaio, com seus ataques cinematográficos? Explosões, caminhões incendiados, reféns pra todo lado, um exército de bandidos com armas de guerra derrubando carros-fortes e muros de presídio? Por quê fica solto? Um roteirista de Hollywood tinha pegar umas dicas com ele, já que lá eles adoram isso de explosões, gente aos pedaços e prédios desabando, chamam até de arte. Nós chamamos de quê? De nada. Se o ladrãozinho não fica preso por ser pequeno, o grande aí não fica por...? Ninguém explica.

O cara é preso. Aí vem fugas, grandes ataques, alto risco à população e um trabalho policial imenso para a sua recaptura. Qual o castigo exemplar que ele receberá? Progressão de regime, claro! Pouco tempo depois, ele já ganhará uma liberdade por qualquer justificativa e, ora bolas, como a coisa anda braba, feia mesmo, voltará a cometer seus crimes. E a perambular entre explosivos e fuzis. Tá, digamos que uma vez o sistema tenha acreditado na sua redenção. Mas já foi provado e reprovado, a vida dele é esta. O que há? Ingenuidade ou outra coisa? Como é que um jovem brasileiro pode se motivar a servir à justiça, quando seu país não consegue largar o péssimo vício de facilitar a vida só de seus maiores criminosos, de fuzil ou gravata? Complicado. A gente quer apostar na educação, mas os exemplos dão caminhos tortos. E essa papagaiada toda é legal. Tá na lei. Agora, se a lei é pirataria pura, bom, sabemos quem as fez assim. Mas quem entrega o leme, banca o navio e dita a navegação ainda somos nós. Ou deveria ser, pelo menos.

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