Sobre essas teclas e dedos

Sobre essas teclas e dedos

publicidade

 

Tenho a maior dificuldade em lidar com algumas coisas da modernidade. Principalmente os novos teclados. Cada vez menores. Confesso, sofro cada vez que fico em frente a determinados computadores, então sinto uma saudade que nunca pensei possível da velha Olivetti (aliás, meu filho achou a maior graça quando falei “máquina de escrever”, dava barrigadas intermináveis, achando que era alguma piada de português) e vou procurar um terapeuta. Os teclados minúsculos estão bloqueando a minha criatividade. Não consigo mais escrever com o pensamento livre. Preciso ficar conferindo, cada frase, umas vinte vezes. E não é só aquela revisão normal, trabalho de todo sujeito que escreve e, ao natural, relê seu texto para lapidar o estilo, as palavras, as idéias. Não. É por causa dos teclados. Principalmente por eles. São pequenos, cada vez mais, e meus dedos grossos não estão adaptados a estes novos formatos. Sim, eu sofro quando escrevo. Mas não é nada romanticamente shakespereano. Ao contrário, é pura falta de tato. Literalmente.

Tenho uma leitora que compartilha da minha angústia. Dona Aliér, segundo sua filha Fátima, deixa de usar o celular tanto quanto gostaria. Por causa desses teclados minúsculos. São minhas leitoras e me entendem. Sofrem comigo. E com essa teclas minúsculas. Se já previam que o homem do futuro será cabeçudo, de tanto pensar, balofo, de fazer tudo por controle remoto e pedir pizza pela internet, e principalmente narigudo, de tanta poluição, ele certamente terá agulhas em vez de dedos, se o negócio continuar assim. Isto muda muita coisa em nosso comportamento. Aspectos essenciais. O toque, por exemplo. Dar as mãos significará um duelo e o reiki será absorvido definitivamente pela acupuntura. A carícia entre os namorados? Terá que ser feita com a orelha. É o que resta. Imagine andar por aí e ver, nas praças, nos cinemas, no drive-in, casais apaixonados esfregando as orelhas uns nos outros. Nada de dedos aqui ou acolá. Que uma tentativa mais picante de carinho pode virar assassinato. Basta se empolgar. Dedos serão para operar celulares, computadores, calculadoras e derivados. E olhe lá. Sem ficar tocando na mesma tecla, por favor.

Mais Lidas





Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895