A cidadania da mulher brasileira, uma genealogia

A cidadania da mulher brasileira, uma genealogia

Livro de Ana Maria Colling faz uma critica aos sistemas ideológicos que normatizaram a desigualdade vivida pelas mulheres

Correio do Povo

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Quase um século depois de conquistar o direito ao voto (1932), as mulheres ainda vivem marcadas pela subordinação que está presente nos códigos e é embasada por discursos de poder. No livro A cidadania da mulher brasileira - uma genealogia (Oikos Editora, São Leopoldo, 2021), a historiadora Ana Maria Colling faz uma cronologia dos sistemas ideológicos de Platão à Freud, passando pelas escrituras sagradas até os dias atuais, para mostrar a força da desigualdade que acompanha o universo feminino. Com o objetivo de desconstruir essas linguagens, a autora faz uma reflexão sobre códigos, leis, normatizações, regras e costumes que dificultam, impedem e confundem o pensar e o existir feminino. “Os discursos que definem o que é ser homem, o que é ser mulher e o lugar social que corresponde a cada sexo ainda são atravessados pela desqualificação do feminino”, afirma. 

A construção da cidadania feminina no Brasil do início do século XIX até meados do século XX é o percurso histórico analisado na obra para explicar a desigualdade de gênero nas diversas esferas de poder, os obstáculos impostos sobre as medidas para reduzir as diferenças e os meios através dos quais se forjou a inclusão das mulheres no corpo político do país. O livro revisita as Ordenações Filipinas, o Código Civil de 1917, as constituições de 1824, 1891 e 1934, o Código Eleitoral de 1932, o Estatuto da Mulher Casada, passando pelos discursos políticos e debates na imprensa. “Catecismos e manuais de etiqueta que definiam modelos de comportamento para os sexos foram importantes nesta desqualificação. As mulheres eram vistas como incapazes de autonomia. Segundo Aristóteles, tinham cérebro menor do que o dos homens”.

Fruto de sua tese de doutorado defendida na PUCRS em 2000, a escritora cruzou dados que orientaram um estudo profundo com o foco na história das mulheres e nas questões de gênero no Brasil. O resultado é um olhar crítico para os sistemas ideológicos que sustentam as desigualdades de gênero, como os discursos que impossibilitam as mulheres de existir enquanto cidadãs e determinam o lugar que o feminino deve ocupar nas constituições e nos códigos civis. É uma escrita inovadora sobre uma densa trajetória em busca de cidadania, articulando a dimensão nacional com a global. “O primeiro desvio é o nascimento de uma fêmea” (Aristóteles, página 167).

Mestre em História do Brasil pela UFRGS e Doutora pela PUCRS, com estágio em Coimbra/Portugal, Ana especializou-se em História das Mulheres e das Relações de Gênero. Já assinou inúmeros artigos e livros sobre estas questões e recebeu o Prêmio ABEU 2016 (Associação Brasileira de Editoras Universitárias) na categoria Ciências Humanas. Suas publicações e seu trabalho desarrumam a linguagem historicista e patriarcal, subvertendo “o que na história não fala sobre mulheres”. Mãe e avó, Ana dedica o livro aos filhos Tito Alencar e Camilo, pontuando “que a construção de um mundo melhor começa pela igualdade e respeito nas relações de gênero dentro de casa” e que a “a libertação das mulheres é fundamental para a libertação dos homens”.

O livro está nas livrarias Bamboletras, Ladeira Livros e Cirkula. Valor: R$ 50,00.


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