Psicóloga escreve sobre formas de agir se você não tivesse medo

Psicóloga escreve sobre formas de agir se você não tivesse medo

Estamos todos em busca de um futuro novo, com novas respostas. Mas antes não seria preciso realizar novas perguntas?!

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Natalia Schopf Frizzo*

Os dias tem sido convidativos a nos fazer pensar. Os questionamentos internos perpassam devaneios e realidades que se mesclam, ampliando nossa falta de certezas sobre o futuro. Mas, se essencialmente o que nos pertence é o presente, do que precisamos abrir mão e o que é necessário para seguir em frente? Há um chamado coletivo para experiência de lutos.

Sim, falo daquele sentimento deperda, de falta, de angústia e tristeza quando algo morre. Somos finitos, e reconhecer isso é perceber o quanto o tempo é precioso, e nos desafiar a identificar o que na vida realmente importa. Mas a morte, diferente do que alguns podem pensar, nunca foi somente do corpo físico.

Há muitas formas de morrer e de enlutar-se ao longo da vida. E muitas delas estamos vivendo agora. Porém, nossos lutos de hoje, em muitos casos, não são reconhecidos.

 

Pensem comigo:
Morrem os empregos, o sentimento de segurança, o convívio social, os planos, as certezas que achávamos que tínhamos. Sofremos estas perdas e temos de nos haver com elas. E, assim, a presença do medo pode se tornar companheira. Michel de Montaigne certa vez escreveu que quem tivesse de ensinar os homens amorrer lhes ensinaria ao mesmo tempo a viver. Assim nos parece esta Pandemia. Ao revelar a fragilidade humana, oportuniza também uma verdadeira aula de compaixão, comunhão,ressignificação.

 

Estamos todos em busca de um futuro novo, com novas respostas. Mas antes não seria preciso realizar novas perguntas?! Qual cara tem seu medo? Que tamanho ele carrega?Que espaço ele ocupa nas 24h do seu dia? O que o prende hoje a sua dor e o que você pode deixar de lado para tentar ser feliz? O maior obstáculo à mudança está dentro de você mesmo. Nada melhora até você mudar. Quando você domina seu medo, você abre espaço para resgatar o que certamente ainda existe de forte e bom em você. E você abre uma fresta para a luz voltar a entrar, essa pequeninaluz indecifrável, que como dizia Vinícius, às vezes os poetas dão o nome de esperança.

 

Seguramente, apesar de todos os pesares, ainda nos resta ternura. Ainda encontramosesperança nos olhos uns dos outros. Experimente olhar mais devagar... Restam-nos ainda sonhos, nos restam memórias, encontros lindos com o que já vivemos, com quem jáconvivemos. Reconecte-se. A forma como administrarmos nossas crises hoje, servirá de base para que, quando a vida retomar traços de liberdade, possamos voltar diferentes, mas minimamente inteiros para nossas tarefas.

 

Vivíamos um normal que já não servia mais. Deixemos o vento passar, e revelar ahumanidade que ainda nos sobra, nos pertence e nos permite transformar – a si e uns aos outros. Mas aja hoje, pois a nova rotina ainda não está pronta, está em construção. Reconheça seus medos, encontre tempo e gentileza para acolher seus lutos. Contudo, como disse Jules Heme aquí, “quando a curva de contágio ceder e os governos anunciarem ‘conseguimos!’ por favor,não retorne à imortalidade, não vista novamente os trajes dos invencíveis dos inquebráveis dos que nunca sofrem. Não se esqueça do que sentiu... Não se esqueça de que você é um ser humano,que você é frágil, finito. E cuide da vida, do planeta e de todos os seres do mundo, até o dia da sua morte, como se tivesse aprendido algo”.

 

*Natalia Schopf Frizzo
Psicóloga - CRP 07/21597
Mestra em Psicologia e Saúde - UFCSPA
Residência em Gestão e Atenção Hospitalar - Área de concentração: Oncologia-
Hematologia - UFSM/HUSM
Especialista em Cuidados Paliativos - Hospital Israelita Albert Einstein
Especialista em Psicologia Hospitalar - CFP
nataliafzz@hotmail.com


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