Reza uma antiga lenda oriental que o príncipe Arjuna, acompanhado de seus três irmãos mais jovens, buscava ser aceito como discípulo do sábio Drona, mestre no manejo do arco e flecha. O guru, cético e sem muita paciência, decidiu aplicar um teste simples para avaliar os candidatos.
Colocou-os em fila e fez apenas uma pergunta:
— O que você vê?
O primeiro respondeu que enxergava montanhas verdes, o céu azul, árvores frondosas e um pássaro no alto de uma delas.
“Você não passou”, disse o mestre.
O segundo afirmou ver o céu, a montanha, uma árvore e o pássaro em um de seus ramos.
“Lamento, mas você também não passou”, decretou o sábio.
O terceiro declarou ouvir a voz do mestre, mas enxergar apenas a árvore, seu tronco e o pássaro.
“Está reprovado”, concluiu o brâmane.
Por fim, chegou a vez de Arjuna.
“E você, o que vê?”, perguntou o mestre.
“Vejo apenas o pássaro”, respondeu o príncipe.
“Concentre-se mais”, orientou o sábio.
“Agora vejo apenas um ponto no centro da cabeça do pássaro.”
“Excelente, você será meu discípulo”, afirmou Drona.
A lição é clara: foco absoluto no que realmente importa.
DO MITO À REALIDADE
O filósofo espanhol Ortega y Gasset dizia: “O homem é o homem e suas circunstâncias”. Somos feitos de nossa herança genética, das vivências infantis e das circunstâncias sociais que nos cercam. Quando atingimos a maioridade legal, passamos a ter direitos, deveres e responsabilidade de responder por nossas ações perante a lei e ordem - pelo menos enquanto essa existia.
Transportando a metáfora de Arjuna para a realidade nacional, vemos um cenário que se repete há mais de três décadas: montanhas, céu e árvores de escândalos de todas as sortes se sucedem numa ciranda sem fim.
As denúncias parecem não ter efeito. A cada dia, surge uma nova revelação, quase sempre bilionária. A paisagem política se mantém a mesma: Congresso volúvel, Executivo viciado e Judiciário escolhido a dedo, instável, sujeito a chuvas e trovoadas.Se deixarmos de lado os elementos que compõem o pano de fundo e focarmos no essencial, fica fácil perceber quem realmente compõe e dá suporte à árvore do pau torto e, principalmente, quem é o pássaro agourento que destruiu toda a nação, perverteu gerações, e alimentou a vagabundagem e a ignorância.
O arco e flecha, para as pessoas de bem, são os movimentos comunitários e, sobretudo, o voto consciente. É nele que reside o poder de mudar o rumo da história.
Concentremo-nos, portanto, no alvo que não muda e tem gerado décadas de atraso, corrupção e estagnação econômica.
Tenhamos coragem de, dentro das regras, acertar o foco e buscar o que realmente interessa – o bem coletivo e o futuro de todos. Até porque, do jeito que está, só resta a vergonha e a desesperança de ser brasileiro. Ou mudamos as circunstâncias ou não seremos mais dignos de ser chamados de homens. Seremos simplesmente ratos.