Caminho sem volta?

Caminho sem volta?

Desafios de Eduardo Leite para ser o candidato da terceira via

Guilherme Baumhardt, de Austin

Eduardo Leite durante agenda nos Estados Unidos

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Quando o assunto surge, ou uma pergunta é feita, o desfecho é quase sempre o mesmo: um sorriso se abre no rosto e o tema passa a ser discorrido com naturalidade. Se a candidatura de Eduardo Leite dependesse única e exclusivamente dele, a decisão já teria sido tomada. Ele seria candidato de qualquer maneira. Mas, no Brasil, para começar, é preciso estar filiado a um partido político. E o PSDB escolheu o governador de São Paulo, João Doria Júnior, para a disputa.

Para entrar em uma eleição com alguma chance, dentro da “política tradicional”, é preciso criar uma coalizão, ter suporte nos estados, angariar apoio em outras siglas. Qualquer coisa fora disso é um ponto fora da curva, como foi com Jair Bolsonaro, em 2018. Sem estrutura partidária, sem tempo de TV, sem dinheiro e... vitória.

Eduardo Leite consolidou a ideia de que será, sim, candidato ao Palácio do Planalto. Ele até hoje parece não ter assimilado por completo a preferência dos tucanos por Doria. Leite sabe, também, que entrar na disputa e, eventualmente perder, não significa o fim da sua carreira política. Lula perdeu três vezes até sair vencedor. Ciro Gomes está partindo para a quarta eleição presidencial e teve chances reais de chegar ao segundo turno, em 2002, mas foi atropelado pela própria língua e pelo temperamento sem freio.

Leite tem chances? Sim, mas não será caminho fácil. Muitos balões de ensaio foram lançados ao longo dos últimos anos. Nenhum emplacou. Entramos na reta final de uma fase decisiva. Trocas de partido precisam ocorrer nas próximas três semanas. O governador do Rio Grande do Sul precisa, ainda, renunciar ao mandato até o dia 2 de abril se quiser concorrer ao Planalto. Até aqui temos um cenário sem grandes novidades e com nomes que eram previsíveis há bastante tempo: Bolsonaro, Lula, Moro, Doria, Ciro... Dos três últimos, nenhum decolou ainda.

Doria não tem o apoio sequer dos paulistas e sofre pressão dentro do PSDB para desistir e deixar o caminho livre para Leite, que deve ir mesmo para o PSD, de Gilberto Kassab. O eleitorado parece ter cansado de Ciro e seu perfil imprevisível, para não dizer “amalucado”. Moro demonstra algum potencial, mas não tem experiência. E o mais difícil: se o eleitorado petista jamais votaria nele, a estratégia de distanciamento do atual presidente acabou gerando rejeição no segmento mais conservador da população, onde ele precisa buscar votos. A chance de Leite está aí. Ser o que nenhum dos três nomes acima conseguiu ser até agora.

Está certo quem diz que o eleitor brasileiro deixa em segundo plano questões éticas e morais. A reeleição de Lula, em meio ao escândalo do Mensalão é prova disso. O ponto fundamental é dinheiro no bolso. E isso não é exclusividade nossa. Nos EUA, George Bush (o pai) perdeu para Bill Clinton justamente por isso, no início dos anos 1990.

Se é a economia que decide, Leite acaba entrando numa espécie de sinuca de bico. Precisa “torcer” para o Brasil patinar no primeiro semestre do ano. Se a retomada de emprego seguir a trajetória de alta e o brasileiro estiver pagando as contas, aí, sim, entramos na seara ética. E mesmo os mais ferrenhos críticos de Bolsonaro são obrigados a admitir: não houve até hoje nenhum grande escândalo de corrupção no governo. E estamos falando de uma administração que foi acompanhada com lupa por opositores e imprensa. Dar a mesma dimensão ao caso das rachadinhas (reprovável sob todos os aspectos) com escândalos anteriores, como o do Petrolão, é atentar contra a inteligência.

A gestão de Leite não foi alvo de grandes denúncias. Mas há uma diferença significativa: uma coisa é atravessar quatro anos no Palácio Piratini e encerrar o mandato assim. Governadores anteriores já conquistaram isso. Outra coisa é fazer o mesmo em Brasília. E, neste caso, Bolsonaro leva, até aqui, imensa vantagem.


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