Nossos talibãs

Nossos talibãs

Você não precisa ser um especialista em relações internacionais. Você pode desconhecer a história, meandros e nuances das relações de poder e força entre as nações.

Guilherme Baumhardt

Milhares de afegãos invadiram as pistas do aeroporto de Cabul com a esperança de embarcar em um avião que permita a fuga do novo regime talibã

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A imagem de afegãos correndo ao lado de um avião da Força Aérea dos Estados Unidos, desesperados, tentando a todo custo se agarrar à fuselagem, é uma das marcas tristes deste ano de 2021. Ainda mais impressionante é o fato de que alguns conseguiram e acabaram produzindo uma cena ainda mais forte: a de gente despencando após a decolagem da aeronave. Eram pessoas em busca da liberdade. Conhecíamos o radicalismo que levava terroristas a amarrar bombas ao próprio corpo. De maneira dura e cruel, descobrimos o radical desejo de liberdade externado no desespero daquela gente.

São facilmente previsíveis os desdobramentos da retirada das tropas norte-americanas do Afeganistão – não demorou muito para Joe Biden retomar a tradição democrata de enfiar os pés pelas mãos naquela parte do mundo. Só mesmo alguém dotado de extrema ingenuidade acredita na versão light apresentada pelos líderes do talibã até aqui. É coisa para inglês ver. Só compra a tese quem tem um parafuso a menos ou não vê perigo em abraçar um homem-bomba. É questão de tempo para vermos novamente, no Afeganistão, o cerceamento de liberdades individuais, atrocidades e a população (especialmente mulheres) ser alvo de agressões e julgamentos sumários por motivo torpe.

Na Europa já há sinais de alerta. Existe um legítimo desejo humanitário de socorrer quem teme pela própria vida. Abrir as fronteiras e receber afegãos é um ato de generosidade e grandeza, mas que pode esconder uma armadilha: como saber se entre aqueles que estão fugindo do horror do radicalismo islâmico não há também terroristas? É um desafio e tanto para a inteligência dos países que derem este passo adiante. Não será surpresa, porém, se nos depararmos em um futuro breve com atentados em solo europeu – como os que ocorreram na França, Espanha e Alemanha recentemente.

E por aqui? Os quase 14 mil quilômetros de distância que separam o Brasil do Afeganistão não impedem que algumas figuras saiam da toca. Parcela da imprensa já se apressou em classificar o talibã como um regime de “extrema-direita”. O pessoal só esqueceu de explicar as palavras condescendentes da China e Rússia aos novos/velhos donos do poder em solo afegão. Quem sabe de uma hora para a outra a herança soviética foi esquecida na Rússia? Pelo visto, na China, o Partido Comunista passou a ser Partido Liberal e ninguém nos avisou. Ou ainda: como explicar o apoio do Hamas, grupo político/terrorista que controla a Faixa de Gaza e que, sistematicamente, promove ataques contra a população de Israel?

O Hamas, por sinal, é também um entusiasta da candidatura do ex-condenado (o Brasil consegue produzir esse tipo de coisa) Lula para a Presidência da República. Em maio deste ano, em entrevista a um portal de esquerda, um dos líderes do Hamas disse: “Tenho que dizer que realmente apreciamos o apoio brasileiro durante anos e anos de história ao nosso povo. Começou anos atrás e, em particular, na presidência do Lula, foi um grande e vigoroso apoio à nossa causa. Honestamente ficamos muito felizes quando o presidente Lula foi libertado novamente e obteve uma nova chance para competir à presidência. Esperamos ansiosamente pelos dias quando veremos o Brasil novamente apoiando a Palestina e a luta palestina pela liberdade e dignidade”, completou. 

Você não precisa ser um especialista em relações internacionais. Você pode desconhecer a história, meandros e nuances das relações de poder e força entre as nações. Ainda assim, nunca foi tão fácil identificar os lados dessa disputa.


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