Uma certeza (e uma dúvida)

Uma certeza (e uma dúvida)

Há sinal verde para a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) autorizando o futuro governo a estourar o chamado teto de gastos

Guilherme Baumhardt

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Há sinal verde para a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) autorizando o futuro governo a estourar o chamado teto de gastos – um dos bons legados da gestão Michel Temer. O valor extra pode chegar a R$ 200 bilhões. É grana que não acaba mais. Como mágica só existe no circo e ainda não inventaram árvore que dá dinheiro, já temos uma certeza: a bomba fiscal será armada. A dúvida: vai explodir quando?

Dentro da guerra de narrativas, alguns já tentam empurrar a “necessidade” de se estourar o limite em função do governo atual. Uma piada sem graça. Para atender promessas de campanha lulistas (olha o populismo barato aí, gente!), a turma que está chegando percebeu que o único caminho para cumprir o que foi dito durante a disputa é adotar o caminho da irresponsabilidade.

O cálculo político é bastante previsível. Dentro de dois anos teremos eleições municipais e, obviamente, o PT quer eleger o maior número de prefeitos Brasil afora. Nada melhor do que inventar um novo “Brasil Maravilha” e oferecer isso para o eleitor. Se a bomba não explodir até outubro de 2024, exigindo aumento de impostos e produzindo inflação descontrolada, a primeira fase terá sido cumprida. O desafio é manter a galinha dos ovos de ouro viva até 2026, para que Lula ou aquele que ele indicar entre na disputa como favorito.

No primeiro mandato petista, em 2002, a receita deu certo. E um Lula atolado na lama (todos lembram do Mensalão aí, certo?) conquistou a reeleição sobre o tucano Geraldo Alckmin. É, ele mesmo. Hoje Geraldo é vice de Lula. O maior desafio agora é que não há cenário externo favorável. A Europa ainda não conseguiu acertar o passo – países do bloco enfrentam inflação de dois dígitos. Há uma crise energética e a guerra entre Rússia e Ucrânia ainda não terminou, o que coloca uma interrogação gigantesca no horizonte do Velho Continente. Na Ásia, a China é outra incógnita. Certo é que o padrão de compras externas hoje está longe daquele visto no início do milênio. E os Estados Unidos? Estão entrando em recessão. Ou seja, precisam arrumar a casa antes de qualquer expansão de consumo no mercado externo.

Qualquer tentativa de antever o futuro carrega riscos – economistas brincam dizendo que a única função das taxas de câmbio é desmoralizá-los diante de previsões que não se confirmam. Qual o meu ponto? O próximo ano tem tudo para ser de bonança, produzida sem lastro e de maneira irresponsável. Teremos explosão de consumo, muitos mercados devem aquecer acima da média. E depois? Depois prepare-se para pagar a conta, porque o modelo do futuro governo não para em pé. Só que no lugar de a bomba levar uma década para explodir, ela deve ser detonada antes, bem antes.

E quem serão os culpados? A resposta é: o novo governo federal e seus erros, cometidos antes mesmo de a nova patota assumir. E eles dirão o quê? Culparão tudo e todos. Só não olharão para o espelho ou o próprio umbigo – como sempre fazem.

Mais uma vez eu repito: não foi por falta de aviso.

Socialismo pode?
Há um vídeo circulando nas redes, em que um grupelho, em plena Avenida Paulista, grita a plenos pulmões: “Alerta! Alerta! Alerta antifascista! América Latina vai ser toda socialista!”. Não há no mundo país livre ou democrático que seja socialista, apenas ditaduras. Já externei minha opinião sobre uma intervenção militar no Brasil. Alexandre de Moraes disse que serão tratados como criminosos aqueles que questionarem o resultado da eleição. Mas pergunto: dizer que a América Latina será socialista pode, Alexandre?

Amazônia
Pipocam aqui e ali notícias de que fundos internacionais destinados à preservação da Amazônia começaram a ser liberados, após a vitória petista. Antes de soltar foguetes e acreditar que nossa floresta está a salvo, eu lembro: este dinheiro vem geralmente carimbado, para ações que muitas vezes não interessam ao país. Exemplo: para combater queimadas seria necessário comprar aviões-tanque, com capacidade de levar água com rapidez e em grande quantidade para áreas remotas. O governo brasileiro poderia usar esses recursos para isso? Não, porque quem define onde e como o dinheiro será gasto são os países que detêm os fundos. Ou seja, o papo de preservação é conversa para boi dormir, mas muita gente acredita.

Agradecimento
A Coluna recebe um volume considerável de mensagens, geralmente por e-mail. Faço hoje um agradecimento especial para a senhora C. Alberton, do bairro Menino Deus, pela carta encaminhada – sim, carta –, pela gentileza nas linhas escritas por ela (o mais importante) e pela letra, carregada de capricho, digna de propaganda de caderno de caligrafia. É daquelas coisas que a gente não vê mais – culpa da pressa e da tecnologia, que nos ajuda em muitas coisas, mas nos priva de outras tantas. E uma delas é a escrita feita à mão. Obrigado.

 


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