Avanços e recuos

Avanços e recuos

Ataque terrorista do Hamas a Israel provocou um estancamento do acordo que estava por ser assinado entre Tel Aviv e Riad.

Jurandir Soares

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Hoje completa um mês dos ataques terroristas do Hamas a Israel e da guerra que se sucedeu. Até agora não se vislumbra uma solução para o conflito. No entanto, o caminho a ser seguido pós-guerra parece claro: a busca da constituição do Estado da Palestina, para conviver com Israel, ambos com fronteiras definidas e seguras. Torna-se evidente que o Hamas não representa os palestinos, pois sua intenção é a eliminação de Israel e constituição de um estado fundamentalista islâmico. O povo palestino tem que buscar a constituição de seu Estado e Israel tem que colaborar com isto. O próprio secretário de Estado norte-americano, Anthony Blinken, deixou claro isto numa entrevista coletiva em Tel Aviv ao destacar que “a única maneira de garantir uma segurança duradoura” para Israel é os palestinos “realizarem as suas aspirações legítimas para o seu próprio Estado”.

“O melhor caminho, talvez o único, é de dois Estados para dois povos.” Esta, sem dúvida, é a questão-chave desse conflito. Agora não pode ser perdida esta oportunidade, quando o tema se torna mais claro do que nunca.

O grande problema é que, se por um lado este fato se torna cada vez mais evidente, por outro, há um enorme fator a travá-lo. E este fator é o ódio que foi retroalimentado pelos acontecimentos de Gaza. É sabido que o Hamas não representa os palestinos de Gaza, os quais ele mantém como reféns. Porém, embora num primeiro momento esses palestinos possam ter condenado as ações do grupo terrorista em Israel, por outro, diante dos constantes bombardeios de Israel que os dizima, acabam entendendo também que eles não têm outro caminho que não seja o de atacar Israel. Imersos em ódio, acabam aderindo à utopia de exterminar com o Estado de Israel.

E o pior é que este movimento cresce não só em Gaza, mas também na Cisjordânia, a área de maioria palestina, pacífica e onde já há um grande número de cidades cujas populações convivem harmonicamente com os israelenses. Pois até nesse meio surgiram fortes movimentos de apoio ao Hamas. Ainda mais que algumas dessas manifestações foram reprimidas por forças israelenses e que resultaram em cerca de dez palestinos mortos. Isto fez crescer o apoio ao Hamas na Cisjordânia. Ghassan Khatib, professor da Universidade Birzeit da Cisjordânia, ex-ministro do Trabalho e do Desenvolvimento do governo palestino, em entrevista a El País da Espanha, explica: “Há um aumento na esfera pública do apoio ao Hamas e, em paralelo, um decréscimo do suporte ao Fatah e da Autoridade Nacional Palestina. Os últimos acontecimentos trouxeram maior radicalização da opinião pública”. E acrescenta que, “ademais, Netanyahu pretende absorver os territórios palestinos, especialmente da Cisjordânia, mediante uma política de expandir os assentamentos judaicos e de dar maior poder aos colonos, que já são cerca de meio milhão”. E o pior quadro traçado pelo professor é de que eleições hoje dariam vitória ao radical islâmico Hamas frente ao laico Fatah.

O enfraquecimento da ANP é atribuído em grande parte ao seu líder Mohamud Abbas, que está no poder desde 2008, eleito em eleições que eram para serem renovadas em cinco anos e que nunca foram. Abbas se perpetuou no poder, não deu espaço para renovação, tampouco conseguiu avançar em negociações com Israel. Foi justamente vendo uma liderança fraca do outro lado que Netanyahu resolveu avançar na tomada de áreas da Cisjordânia. Segundo o jornalista Igor Gielow, o Hamas cresceu “pelo fato de que os últimos anos, sob Benyamin Netanyahu, viram Israel fazer vista grossa aos suprimentos que chegaram a Gaza, particularmente do Catar, país próximo do Irã. Motivo: enfraquecer a Autoridade Nacional Palestina, que governa a Cisjordânia e que é rival do Hamas. Esta, por sua vez, é o território que Netanyahu gostaria de ver coalhado de assentamentos judaicos, enquanto costurava a paz com árabes moderados alienando palestinos”. Então, otimismo é algo que não se enquadra com o clima predominante atualmente. O que deixa claro que o caminho é o de dois estados, mas as condições atuais não favorecem esse encaminhamento.


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