Estado Islâmico na Rússia

Estado Islâmico na Rússia

Putin segue a tradição desde seus tempos de dirigente da KGB, de acusar adversários pelo ato

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O nefasto Estado Islâmico ressurgiu com o atentado a um centro de eventos em Moscou, que provocou um número de mortos que se aproxima de uma centena e meia. Sua ação mostrou ao mundo que o grupo terrorista segue ativo, depois de ter sido desmantelado o seu califado, instalado em terras da Síria e do Iraque. O ataque na Rússia se explica por várias maneiras. A primeira delas é que a Rússia foi o principal responsável pela exterminação do califado estabelecido em terras do Iraque e da Síria, pelo chamado ISIS, acrônimo em inglês para Estado Islâmico do Iraque e da Síria. O objetivo era governar todas as populações muçulmanas. O grupo encontrou um terreno fértil, porque o Iraque fora totalmente destruído pela desastrosa ação do governo de George W. Bush, em nome de armas de destruição em massa que nunca existiram e a Síria estava igualmente destruída pela guerra civil, resultante da ditadura de Bashar Al-Assad. A área ia de Alepo, na Síria, até Diala, no Iraque. O objetivo era formar um estado islâmico que se estendesse do Mediterrâneo ao Golfo Pérsico.

A Rússia, com o apoio da Síria, e os Estados Unidos, com o apoio da Arábia Saudita, decidiram unir forças para acabar com o califado e exterminar o Estados Islâmico, o que foi conseguido, por volta de 2019. A ação mais decisiva, no entanto, foi executada pela aviação russa, bombardeando as bases do grupo e matando o líder Abu Bakhar. Ao mesmo tempo, internamente, Moscou desenvolveu uma intensa ação militar na província da Chechênia, de predominância muçulmana, que estava lutando por sua separação. Grupos independentistas foram responsáveis por inúmeros atos terroristas na Rússia, que tiveram início em 1999, com atentados em Moscou, Volgodonsk, no sul do país, e na república do Daguestão. Estes atos deixaram mais de 300 mortos e 1.700 feridos. Depois veio o ataque ao Teatro Dubrovka, em Moscou, em 2002. Cerca de 900 pessoas estavam no teatro e a desastrada operação de resgate da polícia resultou nas mortes de 130 reféns e 40 sequestradores. Em 1° de setembro de 2004, terroristas armados ocuparam uma escola em Beslan, na república da Ossétia do Norte, fazendo 1.100 reféns, sendo 777 crianças. O comandante dos rebeldes chechenos, Shamil Basayev, exigia a saída das tropas russas da Chechênia e o reconhecimento da independência da região. Mais uma operação desastrosa de resgate deixou 334 mortos, sendo 183 crianças, além de 31 sequestradores.

Poderia arrolar ainda muitos outros episódios, porém estes já comprovam a aversão dos islâmicos do Sul da Rússia pelos eslavos dominantes no país. E foi nestes movimentos de revoltas islâmicas que o ISIS encontrou terreno fértil para buscar sua reestruturação. Assim é que não surpreende sua participação em mais um atentado na Rússia. Um fato que vem mostrar ao presidente Vladimir Putin que, antes de tentar expandir os domínios russos, buscando dominar países da vizinhança, é preciso resolver os problemas internos das províncias rebeldes. Até porque o movimento que começou com os chechenos ganhou a adesão de uma das mais temíveis organizações terroristas do mundo. E o seu objetivo, depois do fracasso do califado na Síria e Iraque, é estabelecer o mesmo em áreas que envolvam não só a Chechênia, mas também o Afeganistão, Tajiquistão, Quirguistão, Paquistão e outros países da região. Ou seja, a vizinhança Sul da Rússia. E estão aproveitando justo um momento em que a Rússia está tendo um grande desgaste militar com a guerra na Ucrânia.

Putin, que não consegue proteger sua população contra esses atentados e que age de forma truculenta quando ocorrem, matando reféns, segue a tradição desde seus tempos de dirigente da KGB, a polícia secreta russa. Ou seja, acusar adversários pelo ato. E, neste caso, nada mais natural para ele do que acusar a Ucrânia. Porém, chegando ao ponto de dizer que há um conluio entre o Estado Islâmico, o governo ucraniano, os Estados Unidos e a OTAN. Só a dominada população russa, subjugada a um controle de informação, para acreditar nisto.


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