Combate ao caruru exige manejo integrado

Combate ao caruru exige manejo integrado

Planta daninha que, no Rio Grande do Sul, teve sua resistência ao glifosato constatada em 2018, se expandiu nas lavouras de soja da Metade Sul, mas pode ser melhor controlada se produtor adotar a Integração Lavoura-Pecuária

Por
Nereida Vergara

As plantas daninhas são fonte permanente de preocupação para os agricultores pelos danos que causam aos mais diferentes cultivos, mas também por um problema que se tornou recorrente com a ampliação das áreas plantadas no Brasil: a resistência desenvolvida à aplicação sucessiva de herbicidas. A soja, por exemplo, convive nos últimos anos com a presença da buva (conyza), espécie daninha que se expandiu por todas as lavouras do Brasil e que hoje é possível controlar com ações agronômicas adequadas. 

Mas se a buva deixou de ser uma dor de cabeça tão grande, não se pode dizer o mesmo do caruru. A planta, de nome científico amarantus hybridus e cuja resistência ao glifosato foi detectada no Rio Grande do Sul em 2018, se expandiu nos mais de meio milhão de hectares de soja semeados especialmente na Metade Sul do Estado, o que suscitou pesquisa da Embrapa Pecuária Sul, de Bagé, em parceria com o Instituto Federal Sul-rio-grandense (IFSul) e a empresa privada Três Tentos, para tentar conter seus efeitos. Segundo a pesquisadora da unidade, Fabiane Lamego, a praga pode reduzir em até 6,4% a produtividade por hectare da soja, uma vez que é uma planta competidora com a oleaginosa por água, luz e nutrientes, sendo muito difícil de ser eliminada quando atinge altura superior a 10 centímetros.

"A primeira coisa que se faz quando uma planta apresenta resistência aos herbicidas é trocar o princípio ativo. No entanto, a simples troca do princípio ativo não resolve e é preciso adotar medidas complementares para combater o problema", diz ela. Por essa razão, afirma Fabiane, o experimento da Embrapa, realizado entre 2021 e 2022, com resultados divulgados no início deste mês, comparou três sistemas para controle do caruru e concluiu que o manejo com a implantação do azevém na área de soja desocupada no inverno (possivelmente em integração com a pecuária) pode reduzir em até 90% a infestação da praga até 12 dias após a semeadura da soja. "A palhada resultante da dessecação da forrageira cria uma barreira física ao crescimento do caruru, auxiliando na eficácia do herbicida", explica a pesquisadora. 

Os sistemas testados foram a implantação de azevém no inverno e simulação de pastejo, com manutenção da pastagem em altura de 25 centímetros e posterior dessecação para formação de palhada; a implantação de azevém no inverno e simulação de pastejo mais intenso, com manutenção da pastagem em altura de 10 centímetros e posterior dessecação para formação de palhada; e o preparo convencional da área com aração e gradagem, sem implantação de pastagem de inverno. Todos os modelos foram sucedidos pelo plantio de soja no verão e avaliação da incidência da planta daninha caruru. O melhor resultado, sendo Fabiane, foi observado na parcela onde o azevém foi manejado a 25 centímetros de altura e produziu 4,4 toneladas de matéria seca por hectare, onde houve redução de 90% da infestação do caruru.

Para introdução do gado neste tipo de manejo, é preciso que o produtor considere o cuidado de manter a lotação adequada de animais em pasto e altura da forrageira no momento da dessecação. “Apenas trocar o herbicida é uma prática que chamamos de ‘apagar incêndio’. O manejo do caruru dá mais resultado se feito integrado”, ressalta ela. Com características de desenvolvimento diferentes da buva (que, se prevenida antes do plantio, ainda na estação fria, com a aplicação de herbicida, é bem controlada), o caruru tem fluxos de crescimento influenciados pelo calor. “Então, a combinação do herbicida com o plantio sobre forrageira permite um controle mais eficiente, já que a palhada fecha trechos do solo onde a planta pode voltar a brotar num ciclo de altas temperaturas”, esclarece Fabiane.

O estudo indicou que  pode causar perdas de até 6,4% nas lavouras de soja infestadas com o caruru, o qual exige acompanhamento ao longo do desenvolvimento das lavouras da oleaginosa, uma vez que tem ciclos de crescimento proporcionados pelo calor | Foto: Alina Souza / CP.

Ainda não há uma informação 100% segura de como a praça se instalou no Rio Grande do Sul, mas, segundo a pesquisadora da Embrapa, o problema surgiu em Pelotas e especula-se que sementes do caruru tenham vindo junto a sementes contrabandeadas dos países vizinhos para plantio da soja. Já a disseminação da praga tem outros agentes, dos animais às máquinas. Dependendo da espécie, uma única planta de caruru pode produzir 600 mil sementes. “Por isso, é preciso prevenir que o gado coma o caruru (que será excretado depois em outro lugar) e se tenha cuidado com a limpeza de máquinas de corte no campo, que mal lavadas podem levar sementes a áreas não infestadas”, complementa.

Carlos Schaedler, professor do IFSul, ressalta ainda que o manejo de plantas daninhas resistentes ao glifosato, no sistema integrado com pastagem no inverno e lavoura no verão, favorece o controle na fase mais crítica da lavoura e reduz a pressão de seleção de novos biótipos resistentes. Schaedler salienta que, desta forma, o produtor tira o foco exclusivo do controle químico e passa a usufruir das estratégias conjuntas da integração.

Marlon Bastiani, pesquisador da Três Tentos, pontua que a integração com a pecuária dá sustentação aos métodos de controle com herbicidas, tendendo a conter, de maneira eficiente, as plantas daninhas e a atrasar a evolução de novos casos de resistência.

Rotação de culturas diminui a incidência

A pesquisadora da Embrapa Pecuária Sul, Fabiane Lamego, diz que a propagação do caruru na Metade Sul do Rio Grande do Sul se deve em parte a um problema de consciência do produtor. Como o cultivo da soja na região vem se intensificando nos últimos, como alternativa ao arroz e para melhorar a rentabilidade das propriedades, há uma insistência em repetir o plantio da oleaginosa numa mesma área, o que favorece a multiplicação da praga. “Não é o mesmo que acontece aqui (referindo-se à região Noroeste, no início de março, no município de Não-Me-Toque, onde ocorreu a Expodireto Cotrijal). A pecuária é menos presente, faz mais frio e é comum a rotação com os cereais de inverno”, destaca.

Fabiane chama atenção, porém, para o fato que o caruru detectado em terras gaúchas ainda tem condições de controle, se houver a decisão do produtor. Ela aponta uma variedade da planta, amaranthus palmeri, identificada e isolada na região Centro-Oeste do Brasil, com potencial muito mais agressivo. Encontrada no Mato Grosso na safra 2014/2015, a variedade, originária do México e das regiões áridas dos Estados Unidos, pode atingir até dois metros de altura, crescendo, em média, de dois a três centímetros por dia, infestando não apenas a soja, mas outros cultivos, como o do algodão. Uma única planta pode produzir entre 200 mil e 1 milhão de sementes. Minúsculas, as elas são facilmente transportadas por pneus de veículos e máquinas agrícolas. Segundo a Agência Estadual de Vigilância Sanitária Animal e Vegetal do Mato Grosso do Sul, a ocorrência da praga, que impossibilita a colheita mecanizada, pode causar até 90% de danos à produção. 

No final de fevereiro, a Secretaria da Agricultura, Pecuária, Produção Sustentável e Irrigação (Seapi) emitiu um alerta sanitário sobre este tipo de amaranthus. A chefe de divisão da Defesa Sanitária Vegetal da Seapi, Rita Antochevis, garantiu, na ocasião, que a Seapi faz o monitoramento permanente da planta, orientando os produtores principalmente na limpeza criteriosa de máquinas agrícolas, como colheitadeiras, que tenham sido usadas em tarefas fora do Estado.

Resultados da pesquisa da Embrapa para o controle do caruru no RS

  • Palhada resultante da dessecação das forrageiras usadas na pecuária no inverno funciona como barreira física para o crescimento de plantas daninhas como o caruru;

  • Manejo integrado de plantas daninhas é estratégico para minimizar problemas na produção de soja;

  • Área que recebeu o manejo teve redução de quase metade (48%) na incidência de caruru;

  • O caruru (Amaranthus hybridus) é uma planta competidora com a soja e reduz a produtividade da oleaginosa pela concorrência por água, luz e nutrientes;

  • Desde a confirmação da resistência do caruru ao glifosato, tem havido aumento gradativo da ocorrência da planta nas lavouras;

  • O tipo de caruru estudado pela Embrapa de Bagé chega a reduzir a produtividade da soja em 6,4%.

Fonte: Embrapa Pecuária Sul.

Sobre o Caruru Palmeri

  • É de difícil controle, sendo resistente aos herbicidas;

  • Ocorre cruzamento entre o palmeri e outros carurus, aumentando a ocorrência de resistência;

  • Impõe resistência mecânica à colheita das culturas;

  • Suas pequenas sementes são facilmente transportadas em pneus e maquinários agrícolas;

  • Causa aumento no custo de produção estimado em 30 dólares por hectare.

Fonte: Vigilância Sanitária Animal e Vegetal do Mato Grosso do Sul.

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895