Diferenças no combate à Covid-19 nas capitais do Sul do Brasil

Diferenças no combate à Covid-19 nas capitais do Sul do Brasil

Porto Alegre, Florianópolis e Curitiba adotaram estratégias parecidas de combate ao coronavírus. Porém, apesar de os modelos de isolamento social serem parecidos, alguns são mais restritivos que outros

Por
Henrique Massaro

Além da proximidade geográfica, as três capitais do Sul do Brasil - Porto Alegre, Florianópolis e Curitiba -, têm outras semelhanças com relação ao enfrentamento da crise provocada pelo coronavírus. Passando por um momento de crescimento do número de casos e óbitos, as cidades baseiam boa parte de sua tomada de decisão em função da disponibilidades de leitos de UTI. Nas três, também é considerável a preocupação com os meses de inverno, quando historicamente os hospitais têm demanda maior devido às Síndromes Respiratórias Agudas Graves (SRAGs). Apesar disso e dos modelos de isolamento social serem parecidos em diversos aspectos, em outros, elas se diferenciam.

A capital gaúcha, neste momento, por exemplo, é onde vigora a maior parte das medidas mais restritivas. Com exceção do transporte coletivo - suspenso na capital catarinense - e de supermercados - que na paranaense não funciona aos domingos -, Porto Alegre fechou serviços e atividades econômicas que seguem funcionando nas outras. É o caso de shopping centers, comércio em geral e restaurantes, que, em Florianópolis e Curitiba são autorizados, desde que respeitando medidas de segurança e prevenção, semelhantes ao período de flexibilização vivido entre maio e junho em Porto Alegre. Outra diferença é com relação às igrejas e templos religiosos, que, na capital paranaense, seguindo decreto estadual, funcionam inclusive como serviço essencial. Na sexta-feira, o prefeito Nelson Marchezan Júnior (PSDB) anunciou a liberação da Arena do Grêmio e do estádio BeiraRio, do Inter, para os jogos deste domingo do Gauchão, mas destacou que a medida não deve ser vista como liberação geral das restrições. Para entender diferenças e semelhanças, o Correio do Povo ouviu especialistas e representantes do poder público das três cidades. 

Porto Alegre

Em Porto Alegre, após quatro meses em que decretos municipais restringiram, flexibilizaram e voltaram a enrijecer o distanciamento social, a cidade passou as últimas semanas convivendo com a ameaça de um possível lockdown . No entanto, tal medida extrema, de acordo com o prefeito, depende de consenso entre setores econômicos e demais camadas sociais, o que não parece perto de ocorrer. Tendo como principal balizador da situação na cidade a ocupação dos leitos de UTI, hoje em cerca de 86%, a Capital abriu 25 leitos nos últimos dias e deve abrir mais 20.

Apesar da possibilidade de abertura em locais como salas de recuperação e salas de emergência estar prevista no plano de contingência, todas as estruturas abertas até agora pela prefeitura e essas 20 que ainda serão disponibilizadas são em UTIs, explica o secretário adjunto de Saúde, Natan Katz. De acordo com ele, Porto Alegre não fará improvisações ou hospitais de campanha e até agora nenhum paciente ficou sem leitos. O número de pessoas que consta no sistema de monitoramento como aguardando UTI (36, na última sexta-feira, entre casos de Covid-19 e outros), explica, faz parte da logística do sistema, que tem uma média de espera de 12 a 14 horas. O grande gargalo da Capital, ainda segundo o secretário adjunto, é a parte de recursos humanos, devido, principalmente, à limitação de intensivistas. 

Apesar da possibilidade de abertura em locais como salas de recuperação e salas de emergência estar prevista no plano de contingência, todas as estruturas abertas até agora pela prefeitura e essas 20 que ainda serão disponibilizadas são em UTIs, explica o secretário adjunto de Saúde, Natan Katz. De acordo com ele, Porto Alegre não fará improvisações ou hospitais de campanha e até agora nenhum paciente ficou sem leitos. O número de pessoas que consta no sistema de monitoramento como aguardando UTI (36, na última sexta-feira, entre casos de Covid-19 e outros), explica, faz parte da logística do sistema, que tem uma média de espera de 12 a 14 horas. O grande gargalo da Capital, ainda segundo o secretário adjunto, é a parte de recursos humanos, devido, principalmente, à limitação de intensivistas. 

Enfermeiro, sanitarista e professor do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Dário Pasche afirma que, em linhas gerais, as medidas tomadas no Estado e, sobretudo, em Porto Alegre são equivocadas. De acordo com ele, que estuda o planejamento e a gestão de políticas de saúde, os governos estão olhando para o problema de forma parcial, no que diz respeito a leitos de UTI e profissionais, mas estão deixando de lado as ações de base comunitária que, na sua visão, deveriam corresponder à maior parte do enfrentamento à pandemia. 

Membro da Comissão de Política, Planejamento e Gestão da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), Pasche explica que a questão de restringir atividades, flexibilizá-las e voltar atrás, como ocorreu na Capital, não é em si problemática, uma vez que possivelmente isso ocorrerá durante algum tempo em diversos lugares. O equívoco, segundo ele, está em fazer isso quando há uma curva não descendente da transmissão viral. Além disso, cita que o município está avaliando o cenário de forma pouco sistêmica. O especialista explica que o foco das medidas de governo tem sido quase que exclusivamente na fração de 15% das pessoas infectadas e que precisam de atenção médica especializada e leitos de UTI. Os 85% restantes, formados pelos 30% assintomáticos e os 50% que desenvolvem sintomas de gripe leve a moderada, representam a maior parcela de uma epidemia de base comunitária e estão sendo menos assistidos, avalia o professor. Por isso, afirma que, apesar de necessárias, medidas como abertura de leitos e restrição de atividades não são suficientes sem ações de atenção primária. 

Para o doutor em Saúde Coletiva, o fechamento do Instituto Municipal de Estratégia de Saúde da Família (IMESF), por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) acatada pela prefeitura, representou um sucateamento das equipes de estratégia de saúde da família e da rede de atenção básica logo às vésperas do enfrentamento à pandemia. O trabalho desses profissionais, explica, envolvia atuação direta com 2,5 mil a 3 mil famílias, fazendo a educação para saúde e a vigilância sobre os indivíduos mais frágeis. “Com certeza, se tivéssemos o Imesf, com a estrutura e a dinâmica de trabalho que tinha, Porto Alegre teria um outro cenário, muito mais positivo”, avalia.

A própria testagem da população, explica, é menos eficiente se pensada fora dessa realidade e caracteriza um mau uso dos testes. “Fora de uma estratégia de intervenção na atenção básica, é perder tempo. Uma pessoa saber se está contaminada ou não é para tomar cuidado, só que isso tem que estar dentro de uma dinâmica mais pensada para a atenção básica”, afirma. Esse tipo de problema, segundo Pasche, não é realidade apenas de Porto Alegre, mas do Brasil como um todo, que sofre com a falta de autoridade sanitária. 

O secretário adjunto Natan Katz contesta a crítica ao afirmar que a atenção primária foi bastante expandida durante a administração atual. Segundo ele, desde que a prefeitura começou com as contratualizações, a quantidade de atendimentos também aumentou e o número de equipes funcionando passa de 300, o que é um recorde. Ainda de acordo com ele, o trabalho da atenção básica tem ocorrido, apesar da limitação em função da impossibilidade de visitas rotineiras, e os profissionais do Imesf, com exceção dos que quiseram a demissão após a decisão do STF, foram remanejados dentro da estrutura municipal. “Temos mais gente trabalhando, isso permitiu que expandíssemos o horário das unidades”, comenta, referindo-se ao fato de que 20 locais funcionam 12 horas por dia, sem fechamento ao meio-dia.

Florianópolis 

Menor em número de habitantes, Florianópolis, administrada pelo prefeito Gean Loureiro (Democratas), também tem menos casos e óbitos em decorrência do novo coronavírus. Apesar disso, das três capitais do Sul, possui o maior percentual de diagnósticos com relação aos seus pouco mais de 500 mil habitantes: 1,16% contra 0,52% de Porto Alegre e 0,93% de Curitiba, até esta quinta-feira. A média diária está em 120 casos e dois óbitos, o que, no entanto, representa situação de aceleração na curva de crescimento da doença. A capital catarinense não adotou o sistema de bandeiras criado pelo RS, mas um método semelhante, e atualmente está no que chama de situação de altíssimo risco. “Os indicadores apreciados para avaliar o risco são aceleração de notificações, aceleração de novos casos, progressão dos óbitos e ocupação dos leitos de UTI da região”, explica o médico Matheus Pacheco de Andrade, membro do gabinete de gestão de Crise do coronavírus em Florianópolis. “A cidade entrou em altíssimo risco há algumas semanas, pela análise dessas progressões.”

A ocupação de leitos refere-se à Grande Florianópolis, formada pela Capital, São José, Palhoça e Biguaçu, e não somente à cidade porque a estrutura não é municipalizada e importantes hospitais estão nas cidades da região metropolitana. Ao todo, são 190 leitos entre a Capital e municípios do entorno e a expectativa do governo do Estado é de disponibilizar 50 novos espaços nas próximas semanas. De acordo com Andrade, Florianópolis representa menos da metade da região, razão pela qual, assim como em Porto Alegre e Curitiba, existe grande demanda dos outros municípios por leitos de UTI, algo que também acaba ocorrendo com regiões vizinhas à medida que os recursos vão se tornando escassos pela pandemia. 

Apesar do altíssimo risco, a capital catarinense, em alguns aspectos, tem menos restrições do que a gaúcha. A situação não implica, por exemplo, o fechamento de shopping centers, que podem funcionar de segunda a sábado, do meio-dia às 20h, mantendo taxa máxima de ocupação de 40%. Ainda precisam obedecer a outras regras, como renovar a ventilação do ar a cada 20 minutos, manter as portas abertas, proibir a prova de roupas e indicar um coordenador para acompanhar e fiscalizar medidas. Da mesma forma, empresas e o comércio em geral podem abrir nesses dias, das 6h às 20h, no Centro é das 10h às 19h. Diversas regras precisam ser obedecidas, como limitar um cliente por atendente e uma pessoa para cada 4 metros quadrados, observar a distância mínima de 1,5 metro entre as pessoas, organizar filas externas de forma adequada e assegurar que todos os clientes entrem nos estabelecimentos somente após higienizarem as mãos com álcool gel. 

“O próprio fato de estarmos em uma região conurbada de mais de 1 milhão de pessoas, e não apenas em uma ilha, já demonstra a complexidade de uma decisão. No mês de junho tentamos uma ação isolada e os números de isolamento provaram que sozinhos não conseguimos um resultado satisfatório, pelo contrário, houve maior migração da população para cidades vizinhas”, avalia o prefeito Gean Loureiro. Segundo ele, a opção foi, então, por uma construção conjunta com as cidades vizinhas e que foi menos rígida do que a que havia sido sugerida inicialmente. “Tem funcionado melhor do que se estivéssemos sozinhos e com regras distintas da região”, completa. 

Além de shoppings e comércio, diversas atividades têm funcionado com restrições, em um modelo semelhante ao da flexibilização ocorrida entre maio e junho em Porto Alegre. Outros pontos que podem funcionar são do ramo de hotelaria e igrejas, templos religiosos e afins. Em todos os espaços é necessário assegurar o uso de máscara, distanciamento mínimo entre as pessoas e, dependendo do tamanho do local, realizar a aferição de temperatura corporal de todos que ingressarem. Porém, há aspectos em que as determinações da Grande Florianópolis são mais restritivas do que as de Porto Alegre. No dia 17 de julho, por exemplo, o transporte coletivo municipal e intermunicipal foi suspenso por 14 dias. 

A decisão de tomar medidas restritivas conjuntas na Grande Florianópolis, na opinião da epidemiologista e professora do Departamento de Saúde Pública da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) Ana Curi Hallal, foi correta não somente pela distribuição de hospitais entre os municípios, mas pela necessidade de unificar medidas, pois chegou a ocorrer de moradores se deslocarem para cidades vizinhas para acessar serviços que estavam restritos na sua. Ela também elogia a decisão, em decreto estadual, de suspender a circulação de transporte coletivo municipal e intermunicipal. “Acho muito importante essa medida porque, além de diminuir o risco de transmissão dentro do local, que é um espaço fechado, dificulta a circulação das pessoas”, avalia a epidemiologista.

Apesar de, em outras atividades, a capital catarinense não estar sendo tão restritiva quanto a gaúcha, ocorreu um movimento semelhante de flexibilização. A professora da UFSC explica que, logo no início da pandemia, quando as decisões ainda estavam concentradas no governo do estado, a quarentena foi bastante severa, com fechamento de todos os serviços que não eram considerados essenciais. Após a transferência das responsabilidades para os municípios, Florianópolis seguiu com uma tendência mais voltada para o isolamento social do que os demais, mas em seguida ocorreu uma flexibilização e, mais recentemente, um novo isolamento. 

Para a epidemiologista, a mudança do padrão de comportamento da doença na capital é clara, tendo sido registrado um crescimento acelerado do número de casos e óbitos por dia. De acordo com dados da Secretaria Municipal de Saúde, no final de maio eram registrados em torno de 50 casos. Menos de dois meses depois, esse número chegou aos 200. A taxa de contágio (Rt) na região metropolitana fica entre 1,22 e 1,42 e a ocupação de leitos também vem crescendo. De acordo com Ana Curi Hallal, o momento de restrições é em função desses dados. “Mas isso precisa ser monitorado para ver se realmente vai surtir o impacto que se deseja e conter a transmissão do vírus”, comenta, acrescentando que, caso contrário, novas medidas serão necessárias. 

Apesar de o frio intenso dos meses de inverno em grande parte da região Sul não ser o mesmo em Florianópolis, a epidemiologista explica que a capital catarinense, assim como a gaúcha e a paranaense, tem este período como crucial para o sistema de saúde em função do aumento da procura de casos de Síndromes Agudas Respiratórias Graves (SRAGs). “De maneira geral, o inverno piora essa situação e sobrecarrega o sistema.”

Curitiba

Na mais populosa das três capitais do sul do Brasil, administrada pelo prefeito Rafael Greca (Democratas), com mais de 1,9 milhão de habitantes, a avaliação é de que a quarentena começou muito cedo. De acordo com a secretária municipal de Saúde, Márcia Huçulak, as atividades comerciais e de ensino escolar e superior pararam antes do momento adequado, a partir de 16 de março, quando havia apenas dois casos em Curitiba, ambos importados. Ela afirma que o movimento partiu da própria sociedade, mas que a percepção da prefeitura era de que o isolamento poderia ter aguardado mais cerca de 15 ou 20 dias, evitando as quebras das restrições, como vem ocorrendo em todo o país. “As pessoas, aleatoriamente, decidiram e aí, quando começamos a crescer em números de casos, estavam muito cansadas”, explica. 

A secretária relata que a percepção do município se dava com base em décadas de acompanhamento de doenças respiratórias e que, apesar de não ter freado o movimento iniciado pela população, não restringiu atividades nos primeiros três meses. O decreto 470, de 26 de março, foi no sentido de determinar os serviços essenciais e que não deveriam fechar. A suspensão de maioria das atividades ficou apenas como recomendação. “Tinha um pensamento mágico de que, se fizesse uma boa quarentena, o vírus ia embora”, comenta a titular da Saúde de Curitiba. 

A capital paranaense adotou um sistema de divisão por bandeiras espelhado no do Rio Grande do Sul. A diferença está na quantidade de cores, fazendo com que a vermelha seja a de risco mais alto, sem a possibilidade de uma bandeira preta. Curitiba, no entanto, desde o início da pandemia não passou da bandeira laranja, utilizada quando o risco é moderado. Apesar disso, nos últimos dias os números vêm aumentando exponencialmente, tendo chegado ao recorde de 720 casos e 22 óbitos no último dia 24. A atenção vem sendo redobrada este mês também devido à chegada do inverno, quando aumenta a procura por leitos em decorrência das SRAGs. 

A secretária de Saúde explica que o sistema de divisão por bandeiras, apesar de não ter ganhado a adesão do estado do Paraná, foi adotado pela prefeitura, por exemplo, pela similaridade da cidade com Porto Alegre no que diz respeito ao clima e a condições socioeconômicas. Além de ter uma bandeira a menos do que o Rio Grande do Sul, o modelo implementado por Curitiba conta com nove indicadores que vêm sendo acompanhados desde o início do combate à Covid-19. De acordo com Márcia, já era esperado que o mês de julho fosse desafiador por conta do inverno mais rigoroso e porque, historicamente, cerca de 65% dos casos de SRAG ocorrem nos estados do Sul, junto com parte de São Paulo e Minas Gerais. Em função disso, o objetivo foi de tentar preparar o sistema de saúde.

Curitiba vinha em bandeira amarela desde 16 de março, quando foi decretado estado de emergência, e só mudou para laranja em meados de junho, quando a primeira mudança brusca na curva de crescimento da doença foi observada. Até o fim de maio, conforme a secretária, a média era de 14 novos casos por dia e no máximo sete óbitos por semana. Mas a partir de 13 de junho os anúncios passaram a ser de 10 a 15 mortes diárias, quando, então, ocorreu o primeiro decreto realmente restringindo atividades. Huçulak explica que outra similaridade com Porto Alegre é que Curitiba tem uma conurbação considerável, fazendo com que todos os municípios da região metropolitana ultrapassem os 3,5 milhões de habitantes. Desta forma, 25% das internações em UTIs da capital paranaense são de fora da cidade. 

Em função desses aumentos, a prefeitura entrou no decreto do governador Carlos Massa Ratinho Júnior, que adotou quarentena restritiva para municípios paranaenses, incluindo os da Região Metropolitana. Foram 14 dias de medidas mais rigorosas e, no dia 15, a capital voltou ao seu modelo de bandeira laranja. A única modificação, desde então, foi no último dia 20, incluindo permissão a academias. O entendimento foi de que a atividade física, com medidas de segurança, é importante para a saúde física e mental. 

As principais medidas tomadas em Curitiba desde o início da pandemia são semelhantes às de outras capitais. Em 17 de abril, por exemplo, o uso de máscara passou a ser obrigatório. Uma das principais diferenças com relação a Porto Alegre está no funcionamento de supermercados, proibido nos domingos. O motivo, de acordo com a secretaria, é que estudos mostram que nesses dias as pessoas tendem a ficar mais tempo dentro dos estabelecimentos, que têm por característica a venda de produtos variados, além dos essenciais para a alimentação. A única exceção da quarentena de fim de semana da capital paranaense é para as panificadoras que, contudo, só funcionam no sistema de take away . Ainda segundo ela, assim como ocorre em setores restringidos em outras cidades, o município tem sofrido pressão da associação dos supermercados para que ocorra uma flexibilização.

Apesar de ter batido recorde de casos e óbitos recentemente, a capital do Paraná tem percebido redução nos últimos dias. Na segunda-feira, por exemplo, o boletim registrou 295 casos e 15 mortes em decorrência da Covid-19. No domingo, havia sido 245 casos e cinco óbitos. O painel das nove Unidades Básicas de Saúde (UBSs) também tem registrado menos entradas de pacientes para quadros de internação. Conforme a secretária de Saúde, a postura, no entanto, é de cautela. “O mês de julho é emblemático para ver como a pandemia se comporta na região Sul como um todo”, observa.

Por enquanto, ainda de acordo com ela, não há previsão de mudança nas restrições. A bandeira laranja foi adotada em um momento de aumento, principalmente, das internações. Apesar disso, afirma, a capacidade de atendimento também aumentou e nenhum paciente precisou esperar por leito. Curitiba contava com 324 leitos adultos de UTI SUS, que foram destinados ao atendimento de casos que não envolvessem Síndromes Respiratórias Agudas Graves. Exclusivamente para combater esse tipo de caso, o que envolve a Covid-19, foram abertos até agora 345 leitos. Apesar da ocupação dos adultos estar perto de 90%, há ainda a expectativa de contar com mais 25 leitos de UTI na rede pública. Também foram abertos 425 leitos clínicos e os hospitais privados, conforme a secretária, contam com uma quantidade expressiva. Assim como em Porto Alegre, hospitais de campanha não estão nos planos. “É muito mais eficiente e mais barato operar onde já temos expertise.” 

Coordenador da Comissão de Acompanhamento e Controle de Propagação do Novo Coronavírus da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Emanuel Maltempi comenta que, apesar dos números variarem diariamente, tem observado que nas últimas três semanas a taxa de ocupação de leitos de UTI está perto dos 90%. De acordo com ele, a cidade não tem passado exatamente por flexibilizações, mas ajustes, como no caso das academias. “Minha esperança é que não acarrete em piora drástica da situação e das autoridades”, observa o pesquisador da área de Bioquímica e Biologia Molecular de Microrganismos. Maltempi considera importante, no entanto, medidas como o fechamento de supermercados aos fins de semana. 

“O que é importante notar é o seguinte: até a terceira semana de junho Curitiba correspondia a 30% dos casos no Paraná. Da metade de junho para frente começou a ser mais importante dentro do estado, de forma que nas primeiras semanas de julho chegou a quase 50%”, comenta. De acordo com ele, não há regressão da doença, mas pode ser observada uma estabilização. 

Economia na crise

Em meio às medidas restritivas e de distanciamento social, alguns impactos já estão sendo medidos. Um estudo conduzido pelos professores Cristiano de Oliveira e Rafael Pereira, da Universidade Federal do Rio Grande (Furg), analisou as medidas tomadas por municípios gaúchos entre abril e maio, no período em que o governo do Estado passou a tomada de decisões para as prefeituras até a entrada do modelo de distanciamento por bandeiras e comparou aqueles que resolveram intensificar o isolamento social e os que optaram pela flexibilização, permitindo a abertura do comércio, shopping centers e de parte da atividade econômica. A conclusão foi de que os que aumentaram as suas restrições tiveram danos significativos à economia sem ter, em contraponto, benefícios para a saúde. 

“Nossos resultados mostram que, em princípio, pelo menos no nível de isolamento que foi observado nesses municípios, não teve efeito”, explica Oliveira, que é professor do curso de Pós-Graduação em Economia Aplicada da Furg. De acordo com ele, o estudo, intitulado “Avaliando os custos e benefícios da intensificação do isolamento social no Rio Grande do Sul a partir de um experimento natural”, avaliou os prejuízos econômicos com base nas notas fiscais eletrônicas e os impactos na saúde através do número de casos e óbitos em decorrência da Covid-19. 

Conforme o estudo, os municípios que intensificaram seu isolamento em 15 de abril tiveram perda de R$ 844 mil diários nas vendas, o que representa cerca de 25% do seu potencial. Em contraponto, os benefícios em reduções de casos e mortes não foram estatisticamente significativos. O trabalho ainda sugere que os benefícios de se intensificar o isolamento social poderiam ser alcançados somente em situações específicas, mas com alto custo econômico.

Segundo ele, avaliar os custos e benefícios de iniciativas de redução de riscos já é uma tradição, por exemplo, nos Estados Unidos desde os anos 1980, e foi essa relação que foi considerada na condução do estudo. “Ou seja, o quanto estamos pagando para reduzir novos casos e óbitos de Covid19”, diz, acrescentando ser importante deixar claro que se trata de uma doença séria.

 

 

 

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DESDE 1º DE OUTUBRO 1895