Ganhos em todos os lados

Ganhos em todos os lados

Fetag e UFSM desenvolvem softwares que auxiliam na compensação ambiental e na rastreabilidade de hortifruti

Elisandra e Brenda Kehl, mãe e filha, acreditam que a tecnologia tornará tranquila a adaptação à rastreabilidade

Por
Carolina Pastl*

Informar onde foi plantada uma banana que está à venda na feira e adotar técnicas de manejo conservacionista em uma área delimitada para reposição florestal obrigatória se tornaram tarefas mais fáceis para técnicos e associados aos sindicatos filiados à Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (Fetag-RS). Desde o início do mês, duas tecnologias foram lançadas pela entidade em convênio com a Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) para digitalizar o caderno de campo físico. Uma delas é o C7 Ater Fetag-RS Digital, um aplicativo de celular voltado para ações de reposição florestal obrigatória. A outra é o C7 RastreAI, um software para computador que atua na rastreabilidade de hortifrutigranjeiros. Ambos funcionam offline.

A Fetag percebeu a necessidade do aplicativo quando, em 2018, a Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) aprovou o seu Projeto de Recuperação de Biomas. Na época, a federação foi contratada pela Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) para trabalhar na compensação ambiental referente a novos empreendimentos que ocasionaram alguma degradação de áreas nativas. A reposição florestal obrigatória é uma medida de reparação ambiental prevista na Lei Estadual nº 9.519/1992 e na Instrução Normativa (IN) Sema nº 01/2018.

O mecanismo de Recuperação de Biomas da Fetag pode ser contratado quando uma empresa cria um projeto econômico e precisa fazer compensações ambientais. Assim que a Sema aprova a contrapartida do empreendimento, a Fetag aciona os sindicatos de trabalhadores rurais, que fazem a divulgação da iniciativa e cadastram os agricultores e pecuaristas familiares interessados. Estes cedem cinco hectares de área, onde podem ser feitas tanto a plantação de mudas de vegetação nativa como um manejo conservacionista. Em troca, recebem gratuitamente cinco visitas técnicas em dois anos e equipamentos e insumos, de acordo com a necessidade do polígono cedido. “O agricultor não paga nada e ainda se beneficia ao receber informações e ferramentas que podem ser usadas para o resto da sua propriedade”, resume o assessor de Meio Ambiente e Pecuária Familiar da Fetag, Guilherme Velten Júnior, que é um dos coordenadores da iniciativa.

O motivo que levou a Fetag a firmar uma parceria com o Projeto de Ciência Rural Campeiro (CR Campeiro) da UFSM  para desenvolvimento da tecnologia foi a dificuldade que agricultores e técnicos tinham para trabalhar com planilha de Excel. “Isso deixava o processo lento e sem padronização”, recorda o agrônomo da federação, Adrik Richter, que coordena a iniciativa com o software.

O aplicativo, que funciona desde 2020 como projeto-piloto, passou a auxiliar o projeto na etapa de assistência técnica. “O técnico trabalha com a tecnologia como se fosse um caderno de campo digital, preenchendo informações agronômicas e socioeconômicas de cada propriedade, que podem ser acessadas pela Fetag e Sema numa nuvem”, explica o professor titular do Departamento de Engenharia Rural do Centro de Ciências Rurais da UFSM, Enio Giotto, também coordenador do projeto, cujo piloto tem conclusão prevista para junho.

Tela inicial do aplicativo, que funciona em smartphone. | Foto: Reprodução/Fetag-RS

Na ocasião, a federação percebeu também uma oportunidade de obter dados socioeconômicos para pleitear futuramente políticas públicas e de aumentar a assistência técnica para a agricultura familiar, que, conforme o Censo Agropecuário de 2017 do IBGE, é restrita a 49,8% dos estabelecimentos rurais gaúchos.

“Prestar um serviço ambiental em campos nativos por meio do trabalho do produtor foi uma grande sacada”, observa o diretor do Departamento de Biodiversidade (Dbio) da Sema, Diego Pereira. O produtor André Marks, de Santo Antônio das Missões, que cedeu cinco dos seus 80 hectares para a iniciativa, concorda. “Minha família se sustenta da ovinocultura. O projeto foi fundamental para subsidiar nosso conhecimento de manejo do pasto”, relata.

Marks cita que o projeto forneceu adubo e calcário como insumos para manter a biodiversidade do seu campo. | Foto: Arquivo Pessoal André Marks

No momento, além da Corsan, a Fetag está prestando esse serviço à Rio Grande Energia (RGE) e à Frankfurt Airport Services Worldwide (Fraport). Ao todo, a iniciativa envolve mais de 250 agricultores familiares e 1,2 mil hectares. Com isso, o projeto já conseguiu cumprir 45% da meta inicial de plantar 1 milhão de mudas. A previsão de encerramento é 2022, com o atendimento a mais empresas. O valor que a Fetag cobra pelo serviço, conforme orienta a Sema, é de 0,5 Unidade de Padrão Fiscal por muda a ser plantada.

Hortifrutigranjeiros

Já o software, que funciona desde março em modelo de teste, entrou para solucionar um gargalo enfrentado pelos produtores de hortifrutigranjeiros: a trabalhosa identificação manual da produção. Isso porque, em 2018, o Ministério da Agricultura publicou a IN nº 2, que tornou obrigatória a rastreabilidade de produtos vegetais no país. Até o final deste ano, a vigência será efetiva para todo o setor.

Graças ao software, que será distribuído gratuitamente aos associados, a partir de abril essa identificação passará a ser digital. “O produtor preencherá um caderno de campo virtual, informando tudo o que fez durante a safra, e, ao final, poderá imprimir selos e colar nos alimentos para identificar a produção”, resume Giotto. “Para saber de onde veio o produto, o cliente só precisará fotografar o QR Code e terá acesso à nuvem”, finaliza.

Tela inicial do software, que funciona pelo Windows. | Foto: Reprodução/Fetag-RS

Até o momento, o teste está sendo feito com 30 famílias de produtores de uva, banana e hortifrutigranjeiros da Serra Gaúcha, Litoral Norte e Vale do Caí. Uma delas é a de Elisandra e Brenda Ketlyn Kehl, de Montenegro, que produzbergamotas em seis hectares. “No início, a minha família se assustou com essa nova demanda (de rastreabilidade), mas, com auxílio da tecnologia da Fetag e da UFSM, a adaptação está sendo mais tranquila”, avalia Brenda.

Bergamota montenegrina é uma das fontes de renda da família Kehl. | Foto: Arquivo Pessoal de Brenda Kehl

* Sob supervisão de Elder Ogliari

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895