IGP terá novos contratos emergenciais no RS

IGP terá novos contratos emergenciais no RS

Projetos aprovados pela Assembleia Legislativa visam mitigar defasagem de efetivo no interior

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Por
Marcel Horowitz

Um dos principais braços da segurança pública ganhará força e maior alcance no Rio Grande do Sul. Nos próximos meses, novos profissionais devem ser chamados para ampliar as equipes de perícias em diferentes cidades no interior gaúcho. Os futuros peritos vão atuar com o objetivo de potencializar a velocidade do atendimento à população, a produção de provas técnicas e a cooperação entre órgãos de Justiça e forças policiais. Ainda não há datas definidas para a realização dos editais.

O reforço foi aprovado por unanimidade na Assembleia Legislativa, no dia 29 de abril, a partir de dois projetos. As duas propostas decorrem do trabalho em conjunto entre a Federação das Associações de Municípios do RS (Famurs), representantes do parlamento e governo do Estado. A articulação teve início em outubro do ano passado, com foco na contratação de profissionais em caráter emergencial para o Instituto-Geral de Perícias (IGP) e na prorrogação de contratos já existentes.

Instituto Geral de Perícias (IGP) | Foto: Camila Cunha

Serão chamados 38 servidores, sendo 22 médicos legistas e 16 auxiliares de perícia. O vínculo profissional terá prazo de 12 meses, podendo ser prorrogado por igual período em casos de necessidade. Além disso, também foi autorizada a extensão de um ano em 31 contratos já existentes, o que garante a permanência de servidores mais experientes na instituição.

Segundo o Executivo, as contratações não irão interferir no andamento dos concursos públicos já autorizados. Fica mantida a previsão para que as vagas em concursos já anunciados possam ser somadas às das contratações de emergência.

O diretor-geral do IGP, Paulo Barragan, avalia que desde o último concurso, em 2017, cerca de 40% dos aprovados tenham pedido exoneração. Uma das alternativas para contornar o excesso de desistências seria instituir um tempo mínimo de serviço nos editais, mas isso não eliminaria os riscos de a mudança esbarrar em questões jurídicas.

“Pedidos de exoneração são comuns, principalmente quando um servidor é enviado para trabalhar em uma cidade distante do local onde reside. As causas disso podem ser variadas, indo desde a dificuldade de adaptação até a impressão de que os mesmos cargos têm melhor remuneração em outros estados, o que muitas vezes não é verdade. Uma das soluções para superar esses problemas seria a regionalização dos concursos, porém, é quase impossível fazer isso juridicamente. Outra alternativa seria estipular um tempo mínimo nos concursos. Nesse caso, por exemplo, um aprovado teria que passar um período de experiência na função antes de assumir o cargo efetivamente. Nada está definido, ainda estamos estudando se há maneiras de fazer isso e qual delas seria a melhor”, pontua o diretor do IGP.

Paulo Barragan, diretor-geral do Instituto Geral de Perícias (IGP) | Foto: Camila Cunha

CONTRATAÇÃO EMERGENCIAL

A primeira medida que recebeu o aval dos deputados foi o Projeto de Lei (PL) 96/2025. O texto estabelece a contratação de 38 profissionais e determina que eles sejam distribuídos entre a região Norte, Alto Uruguai, Fronteira-Oeste, região da Campanha e sul do Estado.

Uma vez contratados, os servidores emergenciais, antes da iniciação prática nas funções, vão ter que atravessar uma fase de treinamentos. Somente estarão isentos de frequentar os treinos na Capital aqueles concursados que já exerceram, por um período mínimo de dois anos, algum tipo de função na área pericial. Em caso de desistência de um dos aprovados, a vaga será preenchida por um suplente.

Os profissionais terão carga horária de trabalho de 40 horas semanais. Eles ainda poderão ter turnos nos sábados, domingos e feriados, além do período da noite. O descanso previsto é de um dia por semana.

O texto base do PL 96/2025, com assinatura do governador Eduardo Leite, determina que o critério para a distribuição dos profissionais no RS foi elaborado a partir das cidades que enfrentam maior ausência de atendimento do IGP, em especial em locais onde a situação foi agravada por exonerações, aposentadorias ou falta de aprovados nos concursos públicos anteriores. A redação cita exemplos práticos para justificar o argumento, como o caso de peritos que realizam, por várias vezes na semana, deslocamentos de até 500 quilômetros de seus municípios de lotação, tudo para garantir um atendimento parcial aos moradores de outras cidades.

A proposição deixa claro que a maior carência no efetivo do IGP é em relação aos médicos legistas. Esses profissionais exercem serviços basilares para o bom funcionamento da segurança pública, porque são responsáveis por produzir laudos periciais que servem de fonte para embasar os inquéritos da Polícia Civil e as denúncias do Ministério Público, além das decisões judiciais.

O PL 96/2025 autoriza a contratação de 22 médicos legistas, que serão distribuídos em dez municípios: Rio Grande (3), Frederico Westphalen (3), Erechim (2), Santa Rosa (3), Alegrete (1), Uruguaiana (3), Camaquã (2), Santana do Livramento (2), Lagoa Vermelha (1), Três Passos (2).

Além deles, também foi aprovado o chamamento emergencial de auxiliares de perícia, que auxiliam os médicos em exames de verificação de violência, na coleta de sangue e na análise de vestígios que possam esclarecer a causa ou a autoria de crimes. As futuras contratações vão englobar 16 auxiliares de perícia, distribuídos entre os mesmos dez municípios citados anteriormente, mas com o acréscimo de Bagé.

Por questões de segurança, o governo gaúcho não divulga o número total de servidores que se encontram em atuação no IGP. No entanto, conforme informações do próprio órgão, a estimativa é que as contratações emergenciais vão sanar aproximadamente 20% do déficit existente no efetivo.

Laboratório de Genética Forense do Instituto Geral de Perícias (IGP) | Foto: Camila Cunha

Vale destacar que, somado a isso, está em andamento a elaboração de um concurso público com 234 vagas para o IGP, para os cargos de perito criminal, médico legista e técnico em perícias. Os salários variam de R$ 5,1 mil a R$ 16,4 mil. A Fundatec será a banca do edital e já foi divulgado o estudo técnico preliminar da seleção. Além desse, outro certame do IGP teve o edital publicado em março. Foram oferecidas 40 vagas para o cargo de papiloscopista, cujo salário é de R$ 8,9 mil. As provas vão até o dia 15 de junho.

Prorrogação de contratos

A incorporação de mais profissionais ao IGP ainda recebeu o complemento de um segundo projeto, o PL 97/2025, também aprovado de forma unânime na Assembleia Legislativa e igualmente em caráter emergencial. A partir desta proposta, foi autorizada a extensão dos contratos de servidores que já trabalham no órgão.

De acordo com a medida, todos os contratos prorrogados deverão ser substituídos por servidores concursados após a conclusão do curso de formação. O projeto estende os vínculos até 31 de março de 2026 e garante a manutenção dos atendimentos periciais em 16 municípios. No entanto, caso se mantenha a situação de necessidade excepcional, os vínculos emergenciais ainda poderão ser ampliados por mais 12 meses, até março de 2027.

A lei prorroga 31 contratos emergenciais para trabalhadores no IGP, sendo médicos legistas e auxiliares de perícias. A lista completa com os nomes dos servidores contratados, cargos, local de lotação e carga horária deverá ser publicada pelo governo no Diário Oficial nos próximos dias.

Laboratório de Genética Forense do Instituto Geral de Perícias (IGP) | Foto: Camila Cunha

No texto do PL 97/2025, é dito que, mesmo após a nomeação dos aprovados no último do IGP, realizado em 2017, não foi possível preencher todas as vagas existentes, em especial para os cargos de perito, o que justificaria a prorrogação dos contratos. Outra razão exposta na tese, também subscrita pelo Executivo Estadual, é que a medida atende ao interesse público.

De acordo com o projeto de lei, serão prorrogados os contratos de oito médicos legistas nos municípios de Alegrete, Palmeira das Missões, Carazinho, Rio Grande, Santiago, São Borja, São Luiz Gonzaga e Vacaria. Já os auxiliares de perícia terão 11 extensões contratuais nas cidades de Canoas, Santa Maria, São Jerônimo, Camaquã, Ijuí, Palmeira das Missões, Santa Rosa, Santo Ângelo, Três Passos, Vacaria e Porto Alegre.

A lei também prevê que, conforme a necessidade de serviço e se justificada tecnicamente, os profissionais poderão ser realocados para outros municípios.

Prefeituras do RS pedem mais interiorização do Instituto-Geral de Perícias

no IGP é uma demanda frequente de prefeituras no interior do Estado. A carência de recursos humanos pode ser observada de forma ainda mais aguda em municípios onde as equipes são mantidas com apoio direto das prefeituras, dos Conselhos Comunitários Pró-Segurança (Consepros) e das associações regionais.

Erechim, com pouco mais de 105 mil habitantes, é um exemplo dessa situação. Ali, o IGP conta com apenas uma profissional, mas presta serviços a outros 42 municípios da região Norte e do Alto Uruguai. A perita atua como médica legista e, por não ter auxiliares, enfrenta limitações para fazer exames de necropsia.

O prefeito Paulo Polis afirma que reformou a unidade com recursos municipais. “O espaço onde está o IGP em Erechim é pago pela prefeitura, que também paga os salários dos estagiários e até a Internet. Já foram gastos mais de R$ 30 mil em reformas no local, com recursos obtidos através da Associação de Municípios do Alto Uruguai (Amau). Realizamos todo um trabalho de reformulação, mas ainda faltam peritos. Sem dúvidas, vamos ganhar um pouco mais de fôlego a partir da contratação de mais profissionais legistas.”

Outra cidade que sofre com a defasagem de perícias é Frederico Westphalen, onde o posto do IGP está há mais de nove anos de portas fechadas. A população local acaba sendo atendida por profissionais que vêm de Carazinho, Passo Fundo ou Erechim.

Acontece que nenhuma dessas três cidades está localizada a menos de duas horas de distância de Frederico Westphalen, o que provoca atrasos no atendimento. No início deste ano, por exemplo, o corpo de um ciclista vítima de um acidente passou a noite e a madrugada estirado às margens de uma rodovia, ao relento, sendo recolhido apenas no dia seguinte.

A situação também prejudica o trabalho da Polícia Civil na região. Conforme a diretora da 14ª Delegacia de Polícia Regional do Interior, delegada Aline Palma, a distância entre os IGPs gera imprecisão no registro das ocorrências. Como se isso não bastasse, a questão toma contornos ainda mais graves em casos que envolvem crianças ou adolescentes. “A Polícia Civil sofre muito com a ausência de Departamentos Médicos Legais (DMLs) na região. Em Frederico Westphalen, não há onde fazer necropsias nem exames em vítimas de agressões ou de abusos sexuais. Isso porque as vítimas precisam ser encaminhadas para unidades distantes, como Erechim ou Passo Fundo, o que nos impede de determinar a hora exata das ocorrências e acaba prejudicando os registros. Em casos de lesão, por exemplo, os envolvidos não costumam se deslocar para outros municípios e, por isso, temos que trabalhar com laudos indiretos. A situação é ainda mais difícil quando crianças sofrem abusos, porque, nestes casos, há toda uma burocracia. Não é possível simplesmente levar uma vítima menor de idade para fazer exames em outra cidade, é preciso ter autorização de familiares e o acompanhamento do Conselho Tutelar”, aponta a delegada.

O prefeito de Frederico Westphalen, Orlando Girardi, ressalta que a aposentadoria de uma médica legista e a posterior dificuldade de contratar outro profissional são as principais causas do fechamento do IGP na cidade. “Estou otimista com a recente aprovação das contratações emergenciais na Assembleia Legislativa e creio que logo vamos poder chamar novos profissionais.”

Girardi adiciona que a ausência de um Posto Médico-Legal (PML) em Frederico Westphalen também prejudica o andamento de atos fúnebres. Não raro, o processo de translado e a liberação de um corpo entre municípios se alonga por quase um dia. “Os moradores de Frederico Westphalen precisam enfrentar longos períodos de espera no translado de um corpo até Passo Fundo ou Carazinho, onde são realizadas as necropsias. Houve casos em que isso ultrapassou 20 horas. Essa demora não apenas aumenta o sofrimento e a angústia das famílias nesse momento delicado, mas também compromete o planejamento dos atos fúnebres, causando frustração e indignação na comunidade”, diz Orlando Girardi.

O prefeito reconhece que, mesmo após a reativação do IGP em Frederico Westphalen, a unidade ainda precisará passar por reformas antes de voltar a operar. O levantamento dos gastos ainda não foi realizado, mas o esperado é que os recursos sejam oriundos do município.

“Ainda não fizemos um levantamento detalhado sobre os custos envolvidos, mas isso será uma etapa fundamental para garantir que o espaço ofereça um atendimento digno às famílias. Após a retomada do serviço, esperamos que toda a comunidade seja beneficiada, que isso alivie o sofrimento das famílias e fortaleça o compromisso do município com a saúde e o bem-estar de seus cidadãos”, enfatiza o prefeito.

Conforme Adriane Perin de Oliveira, presidente da Famurs e prefeita de Nonoai, a interiorização do IGP não deixará de ser uma das prioridades da gestão, mesmo após o reforço dos serviços ter sido aprovado na Assembleia gaúcha. De acordo com a prefeita, que assumiu o comando da Famurs no dia 7 de maio, a principal motivação é reduzir a dor dos familiares das vítimas. “Oferecer um serviço digno e eficaz à população é especialmente importante em momentos tão doloridos como a perda trágica de um ente querido. Só quem mora no interior do RS sabe como é difícil enfrentar a carência de serviços assim.”

Correio do Povo
DESDE 1º DE OUTUBRO 1895