Pesquisa busca adaptar Angus aos trópicos

Pesquisa busca adaptar Angus aos trópicos

Avaliação dos efeitos das altas temperaturas nos animais de origem britânica quer encontrar características que permitam selecionar exemplares mais resistentes ao calor do Centro-Oeste e do Norte

Por
Nereida Vergara

Há mais de 100 anos adaptada ao Rio Grande do Sul, a raça bovina Aberdeen Angus, de origem britânica, tem uma das carnes mais cobiçadas pelo consumidor, mas uma limitação para a criação de animais puros no Brasil, especialmente nas áreas geográficas de clima quente. Uma pesquisa pioneira, feita em parceria pela Associação Brasileira de Angus e a Universidade Federal de Pelotas (UFPel), pretende identificar e avaliar os efeitos de altas temperaturas em novilhas da raça e assim encontrar características que permitam selecionar exemplares mais resistentes ao calor em estados do Centro-Oeste e ao Norte daquela região.

Hoje, o rebanho Angus registrado no país, conforme o serviço de genealogia da raça, é de 60.760 animais, sendo 14.167 criados no Rio Grande do Sul. Os animais gaúchos são na imensa maioria Puros de Origem, Puros Controlados e Puros por Avaliação, características diferentes das que têm os do restante do Brasil, onde o rebanho é composto massivamente por animais cruzados com zebuínos. 

A amostra de dados foi coletada por estudantes da UFPel entre os dias 3 e 11 de janeiro. Eles recolheram informações de 100 animais da Fazenda da Barragem, em Dom Pedrito, na Região da Campanha, sendo 50 exemplares Angus pretos e 50 Angus vermelhos. Foram medidas as temperaturas interna e externa das novilhas, taxa de ofegação e características de comportamento como ruminação, cio e hábitos alimentares. Os exemplares foram divididos por cor e comprimento do pelo (1 centímetro, 2 centímetros e 3 centímetros). A medição de temperatura, para avaliar os efeitos do estresse térmico, foi feita a cada meia hora por termômetro colocado na área genital e por termografia infravermelha.

Estudantes da UFPel coletaram os dados entre os dias 3 e 11 de janeiro. Foto: Caroline Oliveira Farias / Divulgação / CP

Os resultados do estudo ainda devem demorar alguns meses para serem divulgados. Isto porque os dados coletados em 2022 serão cruzados com medições feitas a partir de agosto do ano passado em outras propriedades do Estado. Coordenador da pesquisa, o professor da UFPel, Rafael Mondadori, que integra o grupo Fisiopatologia e Biotécnicas da Reprodução Aplicada (Fibra), diz que já há pistas de quais animais são mais tolerantes ao calor. Segundo ele, as novilhas vermelhas e com pelo liso foram as que demonstraram suportar melhor o estresse térmico. Mondadori relata que a ideia é encontrar neste estudo parâmetros que permitam testar um número maior de bovinos, mapeando traços para serem usados futuramente na seleção genética. “Queremos selecionar animais economicamente viáveis adaptados ao clima do Brasil Central, com mais sangue Angus, uma vez que cresce o interesse do consumidor por uma carne de qualidade melhor”, informa.

O proprietário da Fazenda da Barragem, Fernando Cardoso, cujo plantel de Angus é de 600 cabeças, está acostumado a participar de experimentos da raça, como os testes de eficiência alimentar e de resistência ao carrapato. Para Cardoso, as características de termotolerância podem integrar no futuro o Programa de Melhoramento de Bovinos de Carne (Promebo), beneficiando todos os criadores. Os traços fenotípicos que o produtor – também técnico e pesquisador da Embrapa – acredita que vão se sobressair na questão da resistência às altas temperaturas são as relacionadas ao pelame do animal, tanto em comprimento quanto em relação à cor. “Vai ser um dado interessante no aprimoramento genético”, comenta.

Mateus Pivato, gerente de Fomento da Angus, garante que a nova pesquisa é mais um passo para ampliar e favorecer a adaptação da raça num país tropical como o Brasil. Pivato afirma que a identificação da termotolerância vai se somar a outras informações que a raça já dispõe, como as oriundas dos testes de eficiência alimentar, para oferecer ao mercado mais animais de qualidade. O teste inédito, acrescenta o gerente, coloca a Angus mais uma vez “na vanguarda tecnológica da pecuária brasileira”. 

Correio do Povo
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