Via de regra, quando o time está mal, boa parte da torcida exige que a imprensa cobre mais do clube em crise. Boa parte deste recorte de público, curiosamente, é o mesmo que se incomoda quando a imprensa cobra o seu clube quando ele não está mal. Não compreende o exercício ininterrupto e intrínseco de quem tem por obrigação fazê-lo, independentemente do resultado de campo.
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O fato é que as cobranças hoje em dia não são feitas somente pelos profissionais de imprensa. Há uma mistura de bons, maus e não profissionais na cobertura e isso atrapalha a relação construída por décadas. A exposição cada vez maior dos personagens da bola, ao mesmo tempo em que aumentou a fragilidade da vidraça, aumentou também o tamanho da redoma. A proteção sob qualquer custo paga o seu preço.
“Penso que saímos de um comportamento extremo – de se manifestar sobre muita coisa, inclusive que nem diziam respeito às pessoas públicas que são os atletas – para outro de um excesso de cautela. Nos dois comportamentos, o que falta é um profissionalismo com a comunicação. Falar demais e ser julgado e condenado, ou cancelado pelo tribunal da internet é um risco grande para a carreira. Da mesma forma, estar ausente do diálogo público, pode ser entendido como falta de consideração com os fãs e torcedores”, opina Rosângela Florczak. A especialista em gerenciamento de crise ainda completa:
“Relacionamento permanente com o público conquistado e diálogo constante não é opcional, é premissa para quem depende de fãs, torcedores e do público em geral. Os ritos de comunicação devem ser mantidos, mesmo que o cenário pareça difícil e controverso.”
Enxergar o outro lado do balcão nem sempre é possível. Tentar observar de fora é um exercício, no mínimo de empatia, pois há responsabilidades nas duas trincheiras, e tentar compreendê-las ajuda no processo, de quem vive de informar e de quem vive de jogar futebol. No entanto, existe uma multidão interessada no andamento das coisas.
“Eu penso que houve um equilíbrio entre a demanda real e o tamanho e qualidade de exposição dos jogadores. O futebol tem muita exposição e às vezes o tamanho da exposição supera o tamanho da demanda pela exposição”, observa Vinicius Lordello, mestre em Gestão de Reputação e professor da CBF Academy, com passagem recente no Cruzeiro antes do clube virar SAF.
O vestiário dos clubes percebeu a exposição e se preocupou com ela. Pelo menos no momento atual, a preocupação parece não se estender a eventuais consequências do que pode se tornar um vazio relacional. E a partir dele uma mudança de comportamento de quem deixa de ter o trabalho avaliado pessoalmente.
Para Carlos Guimarães, jornalista e mestre em comunicação pela UFRGS, o cenário atual não está vinculado à pandemia e encontra, além da eliminação do intermediário – a mídia – um outro fator preponderante para o desgaste:
“Agora, além dos tradicionais, existem influenciadores, canais identificados, independentes, diversos sites e perfis individuais. Para o atleta, não há esse vazio relacional. Ele entende que se comunica com a torcida. Para o jornalista, é quase uma reinvenção. Os prejuízos são as limitações provocadas por esse fenômeno, em que tudo parece ser via rede social, e quase nada de forma interpessoal”.