Willy Seewald, o gaúcho que disputou os Jogos Olímpicos de Paris há um século
Atleta participou da prova do lançamento do dardo na edição de 1924
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Há exato um século, um atleta gaúcho de nome germânico e visível talento representou o Rio Grande do Sul nos Jogos Olímpicos de Paris-1924. As circunstâncias da participação de um jovem nascido em Taquara em 1900, e pouco lembrado pela História, têm muitos paralelos com a realidade deste ano. Willy Richard Franz Seewald - campeão e recordista nacional - atuou no lançamento de dardo na segunda vez que a competição foi realizada na capital francesa - a primeira havia sido em 1900.
Mas se a glória atlética do Admirável Lançador, alcunha dada a ele pela imprensa na época, não foi efêmera, sua própria vida sim. Como milhares de outros germânicos em fins do século XIX, o marceneiro Carlos Roberto Seewald veio da Europa em 1896. “Disseram para ele que aqui seria um lugar muito bom para trabalhar, e que haveria muita madeira”, conta a neta de Carlos e sobrinha do atleta, a professora Simone Seewald, que hoje mora em São Leopoldo.
Por aqui, o imigrante casou, montou uma fábrica de móveis e esculturas e teve seis filhos, entre eles Willy. O início de sua trajetória não foi fácil, já que ele e os irmãos trabalharam na indústria do pai. “Como todo alemão, meu avô incentivava muito o esporte, principalmente o atletismo”, relata Simone. Willy Seewald passou a praticar várias modalidades, porém se identificava mesmo com o dardo, que fabricava por conta própria na indústria da família, além de comercializar para outros atletas.
Mudou-se então para Porto Alegre, elevando aos poucos suas marcas no esporte e a atenção recebida. Logo em 1921, no campeonato brasileiro de atletismo, bateu o recorde nacional, lançando para 44,50 metros e garantindo participação no I Campeonato Latino-Americano, em 1922, no Rio de Janeiro. Nesta competição, tornou-se o recordista continental, com a marca de 54,51 metros, mais de quatro metros além da maior marca anterior, obtida por um atleta chileno.
Assim, se habilitou aos Jogos Olímpicos de 1924 e foi convocado pela então Confederação Brasileira de Desportos (CBD) para integrar a delegação de 12 homens. Mas problemas de organização da entidade fizeram com que o governo brasileiro não encaminhasse nenhum tipo de apoio financeiro aos atletas. Willy somente pôde ir à Paris pelo patrocínio de um dentista alemão admirador do lançamento de dardo. “Minha família foi muito grata a ele”, disse Simone.
Apesar de estar em seu auge, a viagem de navio não fez bem ao atleta, que chegou à França debilitado e com diagnóstico de pneumonia. Apesar disso, participou dos Jogos, obtendo a sexta colocação no dardo, com a distância de 49,39 metros. “Ele não atingiu o índice que poderia”, comentou a sobrinha. De volta ao Brasil, ele “provavelmente estaria entre os atletas convocados para participar dos Jogos Olímpicos de 1928”, segundo relataram os pesquisadores Janice Zarpellon Mazo e Tiago Oviedo Frosi, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em artigo publicado em 2012 na Revista Brasileira de Ciências do Esporte.
No entanto, o estudo destaca que o país não enviou delegação para as competições em Amsterdã, na Holanda, devido à crise econômica pela qual o país passava na época. No final de 1928, Willy adoeceu. Casado há dois anos e morando em Canoas, ele um dia “sentiu fortes dores no abdômen e foi levado com urgência para o Hospital da Beneficência Portuguesa, em Porto Alegre”, afirma o artigo. Faleceu de apendicite em 2 de fevereiro de 1929.
Curiosamente, o atleta gaúcho somente recebeu a medalha de ouro no Latino-Americano de Atletismo após seu falecimento, devido a reclamações de outros competidores na época de que os dardos não estavam precisos. Seis anos depois, confirmada a vitória de Willy, o Exército foi entregar a láurea, mas o atleta já estava morto. Desta forma, ela foi recebida pelo pai Carlos Roberto.
Às vésperas de outra importante efeméride, o bicentenário da imigração alemã no estado, celebrado neste mês, Simone mantém viva a história do tio com gratidão, e atribui ao pai, Eurico, o incentivo à preservação. “Me deparando, agora, cem anos depois, tenho muito orgulho do meu pai ter conseguido manter esta história viva na nossa família e cidade. As pessoas mais antigas a conhecem, mas os jovens talvez não tenham ideia”, comenta ela, que mantém até hoje emoldurado o diploma de participação de Willy na Olimpíada e fotos da participação do tio nas principais competições.
Um curta-metragem sobre sua trajetória foi lançado em 2012. Após a morte precoce, as homenagens ao admirável lançador após seu falecimento foram inúmeras, com destaque em eventos atléticos. Seu recorde gaúcho foi superado apenas 27 anos depois, em 1949, por Nicanor Missaglia, do Grêmio, que lançou para 58,20 metros. No país, a maior marca seguiu até 1957. “A gente só pode agradecer, porque ele realmente foi uma pessoa que teve uma dedicação ímpar. Essa batalha dele foi algo muito positivo”, descreve Simone.